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Novo ‘evangelho’ contra SIDA !

Novo ‘evangelho’ contra SIDA !

Desconhecido por muitos e odiado pela igreja, o preservativo feminino é a nova arma contra HIV/SIDA que está a ser distribuída pela Associação Pfukane, desde Agosto último, em Boane, a 30 quilómetros da capital Maputo.

Mas o que é, como se usa e quais são as (des)vantagens deste anticoncepcional, também eficaz contra outras doenças sexualmente transmissíveis e gravidezes indesejadas? Segunda-feira. 17h30. Fim do expediente. Flora, a universitária de 22 anos, recolhe a papelada da mesa, desliga o computador e sai com a pasta para o banheiro. Lá, do alto do seu 1 metro e 60, ajeita as jeans azul-claro e mira-se no espelho.

De olhos bem abertos, confere um tom mais vivo às bochechas e termina escovando as madeixas acastanhadas que caiem até quase à cintura. Saca o batom da bolsa e desliza apenas no lábio inferior, que por compressão tinge o superior.Na margem esquerda da avenida maputense que aloja a média empresa, o ‘vovô’ Romão, ‘namorado’ extra da Flora, que está esperando por ela dentro de um volvo prateado, vê a hora no relógio do telemóvel top de gama. Nervoso, examina o movimento ao redor, antes de arranjar o penteado no retrovisor. 17h35, tudo pronto.

Ela dá o passo final com uma mensagem enviada ao seu ‘namorado oficial’ pelo celular, enquanto desce os cinco degraus da escadaria: “Oi amor, vou ter uma reunião aqui no serviço, por isso chego tarde em casa. Beijos!” O volvo desliza. Entra noutra avenida. Vira à esquerda, e depois à direita. Meia hora depois, pára num motel, onde, à esguelha, entram directo para um quarto a 500 meticais por hora. Seguem os preliminares: abraços, beijos, carícias e promessas de nunca mais se desligarem.

Deitada na cama e com as pernas dobradas e afasta- das, Flora pega no preservativo feminino, aperta o anel interno com o dedo polegar e médio, insere-o na vagina, empurrando-o até ultrapassar o nível do osso da púbis. Ele introduz o ‘membro’ no interior da bolsa de látex. Depois do acto, ela aperta e torce o anel externo cuidadosamente, para manter o sémen dentro do preservativo que em seguida retira e atira para o balde de lixo colocado num canto, onde há outros preservativos usados.

Do pecado diante de Deus…

Não há novidades no comportamento feminino acima descrito, a não ser mais uma história de infidelidade conjugal que já se tornou na marca registada nacional. Os clássicos da literatura mundial como ‘Anna Karenina’ – do russo Tolstoi – e ‘Madame Bovary’ – do francês Auguste Flaubert – provam que o comportamento é antigo.

Dos coitos interrompidos referidos na Bíblia Sagrada, aos duches de mel ou excrementos de crocodilos registados nos anais do antigo Egipto, perfilam exemplos flagrantes de que, afinal, há milhares de anos que as mulheres usam métodos contraceptivos. As mulheres e os homens têm o direito e responsabilidade mútua de escolher quando e quantos filhos querem ter.

Foi assim que em 1842 se inventou o primeiro preservativo. Mas foi o Vírus da SIDA, descoberto em 1984, que forçou a humanidade a revolucionar as práticas protectoras, sendo o preservativo masculino a mais vulgar contra este mal. Mas por mais campanhas de prevenção e divulgação que se façam, ainda existe uma espécie de tabu quanto à sua utilização.

Muitas pessoas ainda têm vergonha de se dirigir a uma farmácia para o comprar. Outras escondem-no debaixo do resto das compras no supermercado. Pessoas ainda há que não admitem que parceiros/parceiras andem com esse látex no bolso, por pensarem que isso denota indícios de infidelidade. A igreja, essa, fecha os olhos e torce o nariz, quando o assunto em debate é o uso do preservativo para combater a doença do século.

“ Penso que este problema , o SIDA, não pode ser vencido com slogans de propaganda”, disse recentemente o Papa Bento VI, quando confrontado por um jornalista da ‘France 2’. Alertou que “se falta a alma, se os africanos não se entreajudarem, o flagelo não pode ser resolvido com a distribuição do preservativo. Pelo contrário, arriscamos a piorar a situação” . O Santo padre argumenta que ademais trata-se de uma prática inaceitável aos olhos de Deus!

…ao novo evangelho

Está provado que enquanto o Governo, ONG’s e a igreja divergem quanto à melhor forma de luta contra a SIDA, a verdade é que cada vez mais o número de seropositivos aumenta de forma assustadora. Foi por ‘odiar’ esse sinal vermelho em crescendo que a Associação Pfukane, com sede na vila de Boane, ‘acordou’ e decidiu lançar, desde Agosto último, uma campanha pro-preservativo feminino.

A razão é simples: torná-lo novo instrumento da mulher – infiel – para ela se defender dos homens – também infiéis – que impõem cópulas sem protecção, dispostos a pagar qualquer preço. Mas a campanha da Pfukane Pfukane – que ci-shangana, variante linguística do sul, significa ‘acordai’ – não é só isso: Pilatos Bernardo Saveca, o coordenador, refere que o maior mérito deste projecto é mobilizar, oferecendo os preservativos de forma amigável.

O impacto previsto já nessa altura convocava sorriso antecipado dos mentores: permitir que as mulheres – poliandras – tenham o controlo da ‘situação’ nos momentos em que os vários parceiros se recusam a usar a bolsa masculina. Não só, mas também vai contrariar o difícil acesso ao mesmo, devido à sua raridade e preço exorbitante – cerca de 30 meticais (1 dólar americano/unidade) contra apenas cinco meticais (0,04 dólares/pacote de 3 unidades) do polémico e também ignorado preservativo masculino.

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