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Toma que te Dou: No dia em que fui fustigado por uma criança sincera temporariamente cruel

– Joaquim João, estás na “Terra da Boa Gente” a treinar o Ferroviário local. Qual é a avaliação que fazes do desempenho da tua equipa e do futebol que se pratica em toda a provín

-…strou Nesse dia eu vinha com os copos nos cornos. Feliz da vida, a falar comigo mesmo.

– Olha lá, Bitonga, o que é que andas a fazer na vida?

– Eu também não sei, acho que não estou a fazer absolutamente nada.

– Por que é que não te suicidas?

– Suicidar-me, eu? Estás maluco!

– Não vês que estas a sofrer?

– Obviamente que vejo. E sinto.

– Então!

– Sabes, tu és um gajo pequenino demais para entenderes a minha dimensão. Eu fui construído ao mesmo tempo que o sol raiava e, como sabes, os gajos que são construídos a essa hora são superiores ao sofrimento. Eu tenho uma grande capacidade de sofrimento. Sou quase como Jesus Cristo, que vai suportar o calvário até ao fim.

– Eu no teu lugar mandava à fava essas idiotices todas e comprava uma corda de naylon, e suicidava-me à mesma hora que fui construído!

– Porém tu não estás no meu lugar e nunca estarás. Não tens estrutura para estar na intensidade da vida em que me encontro.

Eu estou no zénite, tudo o que faço é produzido ao nível do zénite. Eu não vivo de cosméticos. Não vivo de fachadas. Quando é para chegar eu chego. Quando é para partir eu parto. Quando é para voltar eu volto, sem qualquer problema. Eu não nasci para morrer, nasci para viver.

Não sou como tu. Tu és um insignificante, não és nada. Nunca foste. Não tens olfacto, muito menos tacto para perceberes que eu não sou daqui, deste chão de merda que pisas todos os dias.

– De onde é que tu és?

– Olha, tu és como Nicodemus, se nem as coisas da terra entendes, como é que vais entender as coisas celestiais?

– Queres-me dizer que tu és celestial?

– Eu sou uma orca. Debaixo do meu ventre tenho uma quilha que controla este manancial que me habita. Sou um contratorpedeiro. Não tenho medo de nada, nem de ti, seu estúpido!

– Estás a violentar-me!

– A violência não faz parte da minha formação. Ira não é violência. As orcas não são violentas. Elas iram-se. Destroem tudo aquilo que vai passar pela frente e só sobram os fortes. Como eu.

– Ai é?

– Já me disse, uma vez, uma criança que não gostava de mim. Uma criança que nem conheço. Que nunca tinha registado antes na minha memória, se bem que a vi em algum lado.

– Disse que não gostava de ti porquê?

– Porque sou vóvó.

– Risos.

– Risos

– Mas por que é que não pintas essa merda de cabelo branco que só te faz parecer uma múmia?

– A minha mulher também me acha uma múmia com este cabelo que tu chamas merda, e eu chamo prata.

– E o que é que disseste à tua mulher?

– Mandei-a passear.

– Risos

– Risos

– És feliz?

– Pois é, tu estás sempre a confirmar a tua incapacidade de perceber os sinais. Tu não entendes nada. Sou feliz sim, senhor. Tenho uma mulher que não me entende mas que me ama. Uma mulher que está permanentemente a querer que eu seja outra pessoa. E pensa que vai conseguir. Mas eu já lhe disse para desistir. E ela não desarma.

– E tu amas a ela?

– Por enquanto.

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