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Mais um Xipoko na Matola: PAIROAFRICA

Desde meados do primeiro semestre de 2012 que os moradores do bairro Beluluane no município da Matola vivem ainda mais preocupados com o ar que respiram. Isto acontece devido à fumaça densa e escura resultante da queima de pneus protagonizada por uma empresa discreta, para não dizer desconhecida, e cuja legalidade, segurança e consciência em termos ambientais é, no mínimo, questionável. Essa empresa é a PAIROAFRICA.

A PAIROAFRICA dedicase à queima de pneus para produção de um determinado tipo de óleo, que tanto quanto sabemos, posteriormente fornece a outras empresas que o usam para misturar com alcatrão. Esta empresa, localizada a menos de um quilómetro da Mozal (outra empresa também notória pelas suas actividades poluidoras), tem estado a operar sem qualquer cuidado ou medida de segurança ou controle relativamente aos impactos que a sua actividade possa estar a causar tanto na vida e saúde dos seus pobres trabalhadores, bem como na das comunidades vizinhas. Por esta razão, a população em seu redor tem vindo constantemente a protestar, acusando-a de expô-los a altos níveis de poluição em resultado da sua queima negligente e descurada de resíduos perigosos.

A população tem razão. A queima de pneus gera óleo pirolítico, que contém químicos tóxicos e metais pesados capazes de produzir efeitos adversos à saúde, como perda de memória, deficiência no aprendizado, supressão do sistema imunológico, danos nos rins e fígado, e não só. Esse óleo pode percorrer longas distâncias, contaminando o solo e a água, além de penetrar em lençóis freáticos.

Infelizmente, apesar das várias tentativas de dialogar e dos vários apelos à empresa e ao governo (através de queixas à polícia e de cartas ao posto administrativo de Beluluane) para que a situação fosse corrigida, a população nunca obteve resposta alguma, nem da empresa, muito menos do Governo, o que levou os mesmos a manifestaremse para que a empresa fechasse e alegadamente a uma tentativa de incendiar a propriedade.

Do ponto de vista ambiental e de saúde pública, tanto o óleo como os resíduos derivados das carcaças de pneus contêm metais pesados e altamente tóxicos. É importante perceber que a queima de pneus por si só (esquecendo a agravante de neste caso ser desprovida de qualquer tipo de tratamentos ou filtros) emite fumos altamente tóxicos, que para o ser humano representam riscos de mortalidade prematura, deterioração de funções pulmonares, problemas do coração e depressão do sistema nervoso e central. A céu aberto, a queima de pneus é 13.000 vezes mais mutagénica que a queima de carvão em instalações bem desenhadas e operadas apropriadamente.

A borracha vulcanizada, quando queimada a céu aberto, contamina o meio ambiente com carbono, enxofre e outros poluentes. Para mais, esta actividade também representa uma ameaça de contaminação do solo e dos lençóis freáticos, uma vez que os produtos químicos tóxicos e os metais pesados libertados pela combustão dos pneus, podem durar até 100 anos no meio ambiente, acabando inevitavelmente por se depositar no solo.

A PAIROAFRICA está repleta de violações. Os trabalhadores operam sem qualquer tipo de equipamento de protecção pessoal, simplesmente com a roupa de corpo? a chaminé encontrase instalada no chão da parte traseira da propriedade, e a uma altura abaixo de 2 metros e os despojos do processo da queima dos pneus (o pó de cor preta e os ferros) são acumulados e abandonados no quintal da empresa, expostos aos elementos.

É igualmente importante referir que a PAIROAFRICA opera dentro de um estabelecimento sem as devidas condições para o efeito, e que anteriormente era um simples armazém. Armazém esse que se encontra localizado numa zona habitacional, a menos de 100 metros das casas.

Para além de casas, também nas redondezas e bem próximo da empresa, encontrase um Hospital, um mercado e um posto policial, que também são afectados pela actividade da mesma. Segundo os moradores do bairro, quando os pneus são queimados quase que não se consegue respirar e muitos nem sequer conseguem ficar dentro de suas próprias casas, uma vez que estas também ficam de tal modo cheias de fumo que os seus tectos estão a ficar pretos. Ainda segundo os moradores, as queimadas ocorrem em media 2 vezes por dia, durante 30 a 40 minutos por ronda.

Segundo uma conversa informal que tivemos com o dono da empresa, esta encontrase registada e tem uma licença para fazer gestão de resíduos, em particular material plástico, “como forma de contribuir para a sustentabilidade ambiental”. Mas de que forma é que este tipo de actividade pode contribuir para uma sustentabilidade ambiental? A actividade da PAIROAFRICA é, nada mais, nada menos, que um sério atentado à saúde publica e ao meio ambiente.

Apesar dos níveis de poluição admitidos pela organização mundial da saúde (OMS) serem de 25 ug/cm2 por dia e 10 ug/cm2 por ano, segundo os resultados de uma pesquisa de três semanas realizada e monitorizada na Matola pela ONG Sul Africana GroundWork, os níveis de poluição atmosférica registados nas zonas investigadas está muito acima destes. O ar que é respirado, principalmente nas redondezas das empresas Cimentos de Moçambique e Mozal está gravemente poluído.

Lamentavelmente, a PAIROAFRICA é só mais uma das nossas muitas preocupações a nível nacional em relação ao impacto ambiental das actividades de empresas poluidoras.

Apesar de já terem sido feitas várias denúncias acerca dos níveis de poluição causados por este tipo de empresas, invariavelmente, o Ministério para Coordenação da Acção Ambiental (MICOA) que é a instituição que se diz responsável pelas questões ambientais, não sabe responder cabalmente às questões que lhes são levantadas e não parece interessado nem em ouvir as preocupações das comunidades, nem em investigar, monitorar ou abordar as empresas em questão.

Pelo contrário, o MICOA muitas vezes parece “apadrinhar” as ilegalidades com as quais tais empresas regem o seu funcionamento, e ao não responsabilizar essas empresas e seus projectos pelos altos níveis de poluição que estas causam, ao ignorar as experiências e exemplos já existentes no mundo, compactua e perpetua este tipo de prática, perigando cada vez mais a saúde e vida de muitos moçambicanos.

Como disse e muito bem o académico Carlos Nuno CastelBranco, “é preciso que o Governo perceba que, para além da crise internacional económica e financeira, Moçambique também está a entrar numa crise ambiental, daí a necessidade de Moçambique contribuir para a preservação do meio ambiente, através da introdução de medidas severas contra os agentes mais poluidores”.

No caso específico de Beluluane, apelamos à intervenção urgente de quem de direito, para que esta situação, literalmente sufocante para os moradores daquele bairro, seja resolvida quanto antes. Nem que isso implique fechar a PAIROAFRICA, que neste momento, pelo que testemunhámos nas várias visitas que fizemos ao local, nos parece ser o mais aconselhável e sensato a fazer.

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