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Jovem é espancado e queimado vivo na Matola

Jovem é espancado e queimado vivo na Matola

Rafael Matsinhe, de 35 anos de idade, foi queimado vivo e escapou da morte por um triz na sequência de uma tentativa de linchamento protagonizada por um grupo de cidadãos, supostamente por ter sido confundido com um larápio, na madrugada do 13 de Junho, no bairro de Intaca, no município da Matola, numa altura em que acabava de sair da casa de um vizinho em direcção ao seu domicílio, sito na mesma zona. O episódio registou-se pouco tempo depois de a vítima ter assistido a um dos jogos do “Mundial” 2014, que decorre no Brasil.

Longe de imaginar que o apito do árbitro japonês Yuichi Nishimura, naquela noite, para o fim de uma das partidas do certame representava o começo de um calvário na sua vida, Rafael Matsinhe despediu-se de Robati Malicopo, proprietário da habitação na qual acompanhava o jogo e chefe do quarteirão 24. Depois de percorrer dezenas de metros, numa zona onde a energia eléctrica ainda é um luxo, o nosso interlocutor ouviu, repentinamente, uma multidão a gritar: “Ladrão… peguem ladrão… socorro… ladrão… ladrão…”

Volvidos alguns minutos, o jovem estava encurralado. Enquanto algumas pessoas sugeriam que ele fosse linchado, outras agrediam-no fisicamente com recurso a instrumentos contundentes. Segundo a vítima, no grupo de ofensores estava um agente da Polícia da República de Moçambique (PRM) a incitar para que o pretenso larápio fosse severamente castigado e linchado.

“Ouvi Manguele, que é polícia, a pedir petróleo para que eu fosse queimado vivo. Nessa altura, temi pela minha vida mas depois de estar salvo passei a acreditar num ditado popular que diz que a pessoa só morre se tiver chegado o seu dia”, narrou o cidadão.

Desde aquele dia, a vida do Rafael Matsinhe jamais voltará a ser a mesma. O homem que saiu de casa para ver um jogo de futebol não regressou com saúde. Agora, ele está a definhar na sua habitação e enfrenta grandes dificuldades para se movimentar devido aos ferimentos que contraiu em quase todo o corpo.

“Não sei como é que vou sobreviver porque o meu trabalho exige muito esforço físico e eu não estou em condições. Rogo a Deus para que me dê saúde novamente com vista a não ser dependente para o resto da vida”.

Em contacto com o @Verdade, o chefe do quarteirão 24, Robati Malicopo, confirmou que no dia em que a vítima foi violentada acabava de sair da sua residência. Segundo o anfitrião, Rafael é uma boa pessoa, nunca se envolveu em problemas; por isso, está indignado com as pessoas que o tentaram linchar, mormente com a atitude do agente da Lei e Ordem.

“Na madrugada do dia 13 recebi uma chamada telefónica de alguém para socorrer Rafael, que além de ter sido injustamente espancado e queimado, foi abandonado na rua supostamente porque já estava morto. Dói-me o facto de ter sido um polícia a promover um acto macabro e desumano contra um cidadão indefeso. Dói-me ainda mais o facto de o mesmo polícia permanecer impune”, desabafou o líder do bairro.

Na mesma noite, Robati Malicopo pediu a ajuda de um vizinho para que juntos levassem Rafael ao Centro de Saúde do Zimpeto, onde chegaram depois de tanto sofrimento por causa da falta de transporte.

Daquela unidade sanitária, o enfermo foi transferido para o Centro de Saúde de Bagamoyo. Deste hospital, o doente foi evacuado para o Hospital Geral José Macamo. Ernesto Matsinhe, de 27 anos de idade, é irmão de Rafael. Ele exige justiça, ou seja, perante a alegada dificuldade de se indicar as pessoas que agrediram o seu parente, o polícia acusado de ser o promotor desta desgraça deve ser responsabilizado”.

Aliás, Ernesto Matsinhe e Jorge Matsinhe, este último de 29 anos de idade, ficaram quatro dias a verem o sol aos quadradinhos na esquadra do bairro T3, no município da Matola, acusados de agredir fisicamente um dos jovens que supostamente participou no linchamento de Rafael. A restituição à liberdade dos dois indivíduos foi possível mercê da intervenção de um grupo de moradores do bairro Intaca, que se amotinou em frente daquela subunidade da corporação. De acordo com Jorge Matsinhe, o membro da corporação envolvido no linchamento do seu irmão foi detido por pouco tempo e já se encontra em liberdade.

“Não há justiça para os indigentes neste país”. A nossa Reportagem apurou que de há uns tempos a esta parte, o bairro de Intaca é assolado pela criminalidade. O medo e a insegurança no período nocturno tomaram conta dos moradores daquela zona que conta apenas com um elemento da PRM – e nenhuma esquadra – para patrulhar 31 quarteirões.

A justiça pelas as próprias mãos tem sido recorrente naquela parcela do município da Matola. Por exemplo, no dia 19 de Junho, no quarteirão 17, um cidadão perdeu a vida em consequência de um linchamento. Robati Malicopo considera que a situação é crítica e as acções das autoridades não se fazem sentir naquele ponto. Algumas pessoas inocentes morrem por causa do mau comportamento dos moradores que detêm supostos ladrões. “Quem, por exemplo, vai indemnizar o jovem Rafael Matsinhe?” questionou o líder do quarteirão 15.

Emídio Mabunda, porta-voz da PRM a nível da Matola, disse à nossa Reportagem que não tem conhecimento de que Rafael Matsinhe tenha escapado dum linchamento e que um agente da Lei e Ordem esteja envolvido no caso. Ele confirma apenas que um indivíduo foi morto no quarteirão 17, a 19 de Junho, nas proximidades da Estrada Circular de Maputo, no bairro de Intaca.

A vítima foi “um jovem vendedor de apenas 23 anos de idade. Duas pessoas foram detidas em conexão com este crime”. O porta-voz apela à sociedade para que tenha consciência de que fazer justiça pelas próprias mãos é crime e gera insegurança nas comunidades.

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