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Invisuais recuperam sonhos de vida em Moçambique

António Fagir viu o sonho de continuar camionista ruir quando, há nove anos, teve um glaucoma. A diminuição da capacidade visual deixou-o desnorteado, perdeu o emprego, a mulher abandonou- o, empobreceu…, mas teve uma nova oportunidade. 

Aos 47 anos, tornou-se num dos primeiros moçambicanos com problemas visuais a beneficiar de uma formação de inclusão digital e um curso de hotelaria para deficientes. Desde Outubro, participa num curso de informática, onde aprende a usar o pacote Dosvox, um sistema que realiza a comunicação com o deficiente visual através de síntese de voz em português e que permite o uso da Internet.

A formação é ministrada pela empresa moçambicana CINFORTÉCNICA. Dentro de quatro meses estará apto para comunicar com o mundo via Internet e, pela primeira vez, vai poder ler os seus direitos e deveres consagrados na Constituição moçambicana em vigor desde 2005.

“Tinha alguns apanhados da Constituição, mas com este programa (Dosvox) há uma abertura para o mundo. Já poderei usar a Internet, via voz, e ler (por via do sistema Jaws, um software que facilita a leitura de documentos aos invisuais), a lei fundamental de Moçambique que, brevemente, será alojada num website para cegos”, diz António Fagir. Sentando à frente de um computador, António Fagir segue à risca as instruções do aparelho que o “comanda” a manusear as teclas e lembra- se do tempo de escola onde fez apenas o oitavo ano.

E depois do curso? “Depois do curso, vou tentar arranjar um emprego” para auto-sustento e custear as despesas das cinco filhas, e também recuperar “os bons momentos” em que viveu com a sua esposa, a quem perdoa por “não ter conseguido suportar” a sua condição de invisual. Roberto dos Santos, 50 anos, também ficou desesperado quando, há sete anos, lhe foi diagnosticado glaucoma e dois anos depois deixou de ver por completo. Mas a possibilidade de participar num curso de inclusão digital fê-lo sentir que a sua visão recuperará “em 50%”. Após a análise médica, “primeiro fiquei um pouco frustrado. Deixei tudo o que estava a fazer convencido que a minha vida acabara, mas a Associação Moçambicana para os Deficientes Visuais amparou-me”, diz Roberto dos Santos.

“A princípio pensei que isso (a formação) fosse mais uma coisa para entreter os cegos para não ficarmos frustrados, mas depois vi que, afinal, é isso que nos faz voltar a vermos a metade”, o que é um “privilégio”, refere. António Fagir e Roberto dos Santos são dois de 11 invisuais moçambicanos que participam no curso de inclusão digital, em Maputo, que abrange igualmente 30 deficientes físicos, seis com dificuldades auditivas e um deficiente mental. “O projecto veio responder à necessidade das pessoas que têm deficiências visual, auditiva e mental”, explica o presidente do conselho de direcção da CINFORTÉCNICA, Sérgio Guivala.

Na primeira fase, assegura, serão formadas 60 pessoas deficientes, a maioria das quais estudantes universitários, apenas na capital moçambicana. Mas, nas 11 províncias de Moçambique, existem mais de 500 invisuais que beneficiam regularmente de diversos materiais adaptados para cegos feitos pela CINFORTÉCNICA. “Temos produzido vários tipos de materiais: a Constituição da República, a Bíblia Sagrada, panfletos sobre HIV/SIDA”, diz Sérgio Guivala.

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