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Inhambane consome droga em silêncio

Inhambane consome droga em silêncio

Ronald Reagan, ex-Presidente americano, a dado momento do seu mandato, disse que “se querem que a droga não entre nas cadeias, fechem os portões e atirem as chaves para o fundo do mar”. E depois dessas palavras – ao que parece – tudo ficou claro. Como é óbvio que na cidade de Inhambane os jovens se entregam, de forma apaixonada, ao consumo de estupefacientes. Cada vez em maior número, tendo chegado ao ponto de satisfazerem as exigências do vício ou do capricho em lugares abertos. Sem medo da Polícia. E, pelo que se sabe, não há registo de consequências criminais graves resultantes dessa prática. Tudo, ou quase tudo, é executado na tranquilidade. E na paz.

Por considerarmos o uso de drogas como o outro lado da sociedade, e também por termos em mente que nem sempre a droga é usada como rampa para fazer o mal – embora tenhamos a plena consciência de que se pode degenerar para aí – decidimos vaiar o lado criminal e enveredarmos pelo social. E, para isso, o melhor caminho que poderíamos encontrar para entender as teias da “erva”, eram os próprios consumidores.

Eu, pessoalmente, tenho a sorte de ser conhecido por muita gente nesta cidade e, por via disso, também lhes conheço, o que pode ter facilitado a minha marcha ao encontro do objectivo que perseguia. Queria medir a pulsação da “cosa nostra” e os primeiros jovens com quem falei disseram-me abertamente que em Inhambane “fuma- se demais”. Os jovens já estão na linha de “outras coisas”, que eles próprios consideram terríveis. Por exemplo, fala-se na cidade de uma droga chamada “swazi gold”, proveniente, segundo informações, da Swazilância. É um produto de muita perigosidade porque é o resultado da mistura de erva e diesel.

“A paulada daquela cena é caótica. O efeito que causa no teu organismo é o mesmo que se dá numa viatura movida a diesel. É só veres o fumo que liberta”. Alguns jovens com quem falámos, e que já passaram pela experiência da “swazi gold”, não querem voltar mais, nem a sentir o cheiro. Sobre se a ressaca deste entorpecente não obriga a que se tenha de voltar à sua absorção para se evitar a dor que causa, como acontece com o “crack”, eles disseram-nos que não. “A melhor forma de você matar o mal-estar é não voltar a fumar aquele veneno”.

Ninguém sabe como é que foi introduzida esta droga na cidade de Inhambane, “mas anda por aí, embora sem muitos adeptos”. De acordo com Madala – chamemos-lhe assim – jovem que concluiu no ano passado o quarto ano do ensino superior, o que se usa muito por aqui é a “cannabis sativa”. “Eu fumo há quinze anos de forma ininterrupta. Ela faz-me bem. Penso rápido quando estou “pedrado”. Na sala de aulas, sobretudo quando estava nos últimos anos da “Facul”, matrecava os teachers, porque a minha inteligência ultrapassava a deles. No lugar de eu ir atrás deles, eles é que vinham atrás de mim. E nunca perceberam porque é que eu estava sempre à frente”.

Este jovem que está desempregado com o seu “canudo” na mão, nunca colocou a possibilidade de um dia vir a deixar de consumir droga. “Deixar para quê? Não consigo pensar sem a “passa”, meu! Existem useiros de droga, e useiros de droga, meu! Eu fiz a Faculdade como um dos melhores alunos do curso. Estou desempregado mas faço os meus biscates enquanto espero pelo emprego ou por uma bolsa para fazer o mestrado. Quer dizer, estou a construir o país. Como é que vais prender um “gajo” que tem a bagagem que eu tenho, só porque o encontraste com insignificantes quantidades de “sativa”? Eu uso soruma para pensar no bem, não sou criminoso. Não estou metido em drogas pesadas, e nunca vou fazer isso. Mas a minha “passa” não pode faltar”.

Chalambe perdeu hegemonia

Chalambe é um bairro paradigmático da cidade de Inhambane. Se quiser “apanhar uma paulada” vai para lá. Mas Madala diz que este conglomerado já não é nada. Perdeu a hegemonia. “Houve tempos em que tu precisavas de ir a Chalambe para adquirir a coisa, mas hoje não tens essa necessidade. Vende-se em todo o lado, em todos os cantos da cidade, e muita gente fuma, incluindo pessoas graúdas que são, não verdade, grandes senhores. Inteligentes.

Uma “passa” bem consumida nunca vai denegrir a tua reputação. E aqui, repito, é preciso diferenciar entre “erva” e drogas pesadas. Há países que já perceberam a dinâmica da “sativa” e, por estarem avançados, legalizaram-na. Nós estamos muito atrasados. As autoridades devem preocupar-se com as drogas que matam, e não com o capim que nós consumimos”.

Madala diz ainda que a “cannabis” ajuda-lhe a passar o tempo. “É por isso que você vê muitos jovens a fumarem. Fazem isso para matar o ócio. Eu quando estou “paulado” não sinto o tempo a passar. Mais do que isso, apetece-me intensamente desenvolver uma actividade. Se não pego num livro para ler, faço trabalhos domésticos. A “cannabis” incentiva-me ao trabalho, é por isso que mantenho este hábito milenar”.

Pescadores presos

Ainda no município de Inhambane, há uma zona chamada Guiúa, onde abundam homens que vivem da pesca e da extracção do coco e da sura. Recentemente a Polícia prendeu algumas pessoas encontradas com quantidades consideráveis de soruma. Para Madala é injusto que as autoridades tenham feito isso. “Aquele produto é cultivado pelos prórprios pescadores para consumo. Usam aquilo como estimulante para o trabalho. Naturalmente que acabam por vender uns aos outros, pois nem todos cultivam essa droga. Mas aquilo não tem qualidade nenhuma, não é nocivo. É palha. Os pescadores precisam de se incentivar consumindo a “cena” mas, lei é lei, temos que nos sujeitar a ela”.

Praga nas escolas

Independentemente de tudo o que Madala disse, ele reconhece que há um controlo que deve ser feito para se evitar uma hecatombe. “Nas escolas os jovens, a partir da 10ª classe, já fumam droga. O pior é que fumam sem saber porque é que o fazem. O mais grave é que drogam-se e depois vão beber com os professores. Mais ainda, estão nessa classe e mal escrevem o seu próprio nome. Então aí eu fico com medo. Que jovens serão estes amanhã? É daí que ovaciono as palestras e a educação que tem sido dada nas escolas no sentido de dissuadir estes meninos, fazendo-lhes ver os malefícios da droga”. E Madala concorda com essa iniciativa positiva. “Mas as autoridades devem ser suficientemente pragmáticas para não meterem toda a gente no mesmo saco”.

Haxixe

Esta droga abunda em Inhambane, com vários nomes. “Existe cavalinho, escorpião, zebra, e outros nomes. Mas o mais perfurante é o escorpião. Porém, há pouca gente que opta por este tipo de estupefaciente. Muitos preferem a erva. Se existem aqueles que vão por essa via e outras drogas pesadas, maioritariamente não são daqui”. O que deixa mais ou menos aliviado este jovem é que as meninas ainda não entraram para este caminho; se existem, são muito poucas, quase invisíveis. Elas preferem uma cerveja, do que propriamente a droga. E na bebida existe uma chusma assustadora de donzelas, que não passam um dia sem beber”.

Droga é droga

Nem todos pensam da mesma maneira que Madala. Para eles a Polícia deve continuar a desenvolver o seu trabalho. Droga é droga, a pessoa começa aos poucos e chega a um ponto em que já não pode voltar atrás. Para eles não existem drogas leves ou pesadas. “Toda a droga deve ser combatida. Nós estamos do lado da Polícia. Em Inhambane está a consumir-se muita droga. Já temos jovens que estão a degenerar. Outros recorrem ao roubo nas suas próprias casas para sustentar o vício, e quem rouba em casa não está muito longe de roubar em espaço alheio”.

Na verdade existem pequenos casos de roubos de telefones, que podem estar associados ao consumo de estupefacientes. Nas ruas da cidade, já aparecem jovens a pedir dinheiro, como se fossem inválidos. “Contam uma história de medicamento ou de transporte para terem 10 meticais, que serão imediatamente usados na aquisição da droga””.

Os mesmos jovens disseram-nos que se fala, nos últimos tempos, na cidade, de nomes nunca antes ouvidos, como crack, escorpião, cavalinho, e outros. “Isso significa que a nossa urbe está a mudar para o pior. “Achamos que a Polícia está no bom caminho, e o Gabinete de Combate à Droga também, com as palestras de educação e dissuação que tem feito, porque esta paz e tranquilidade que Inhambane ostenta amanhã pode ser posta em causa”.

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