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Há-de chegar

Separe-se a diplomacia da Justiça

 

Nas últimas duas semanas a América tremeu e com ela o Mundo. Já há mesmo quem compare a presente crise económicofinanceira com aquela que se registou num célebre 24 de Outubro do já longínquo ano de 1929. Estava-se no último dia útil da semana e para a história ficou registado como a “sexta-feira negra.”

No momento em que escrevo estas linhas – segunda-feira à tarde – a crise pulou o Atlântico e instalou-se, com toda a sua pujança, como se de um vírus terrível se tratasse, no coração da Europa, provocando imediatamente baixas entre os bancos do velho continente. Os governos dos diferentes países, como pais preocupados com a saúde dos filhos, prontamente ocorreram em seu auxílio, resgatando-os da bancarrota. Foi assim com o gigante belga Fortis, com o britânico Bradford & Bingley (B&B), com o alemão Hypo Real Estate, só para citar os principais. Tanto assim que hoje o Fortis já se encontra debaixo do controlo público, após um acordo celebrado com as autoridades da Bélgica, Holanda e Luxemburgo, em que estas injectaram 11.200 milhões de euros para salvar o grupo bancário. Para o resgate do banco hipotecário Hypo Real Estate e também para cobrir as suas necessidades e financiamentos futuros, foi aberta uma linha de crédito, financiada por um consórcio de bancos alemães, de vários biliões de euros.

Mas hoje, segunda-feira, estas intervenções nos bancos europeus vieram dissipar o possível efeito positivo que poderia ter nas bolsas o acordo entre republicanos e democratas sobre o plano de resgate financeiro no valor de 700 mil milhões de dólares delineado pelo Governo de Bush para salvar o sistema financeiro norte-americano e acalmar os mercados bolsistas.

Efectivamente, há muito que os cidadãos norte-americanos não se sentiam, colectivamente, tão inseguros. E o caso não é para menos. Bush já foi várias vezes à televisão, em pose de Estado e com uma expressão carregada, como se o país tivesse sido novamente atacado em larga escala pela Al-Qaïda, explicar a delicada situação, consciencializando os compatriotas para os dias difíceis que aí vêm. Na noite da passada sexta-feira, McCain, o candidato republicano à Casa Branca, deixou toda uma nação expectante sobre a realização do primeiro debate entre os candidatos às presidenciais, uma vez que a sua presença estava em risco devido, precisamente, à crise financeira, algo impensável há menos de meia dúzia de meses. O Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimentos nos Estados Unidos e com uma existência sólida de 158 anos, decretou falência devido à crise no imobiliário e de hipotecas e também aos avultados empréstimos concedidos. O banco perdeu mais de 77% do seu valor de mercado apenas numa semana. Outra instituição financeira, a Merrill Lynch, foi salva à última da hora pelo Bank of America. Não faltam, portanto, razões para os americanos andarem apreensivos. 

Mas a que se deve este colapso financeiro? Deve-se sobretudo à especulação que é sempre ilusória, gerando ciclos de euforia que não são reais e depois, inevitavelmente, vem contracção, e a isso chamamos, vulgarmente, crise. Há alturas em que a especulação, tal como o ilusionista no circo, faz magias e, como quem tira coelhos da cartola, compra por cinco e vende, minutos depois, por 20 ou 30.

 Há uns anos, bancos, corretoras, avalistas e demais agentes que vivem dos mercados bursáteis defenderam, para uma maior eficiência, a desregulamentação dos mercados. Algumas vozes, sobretudo no meio académico, aconselharam prudência, mas as necessidades do capital financeiro impuseram-se e saíram vitoriosas. Hoje estamos todos a pagar essa ausência de regras. A Moçambique a factura também há-de chegar ou não dependêssemos nós das chamadas ajudas internacionais.

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