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Governo empenhado em esvaziar causas de descontentamento popular

Um grupo de sacerdotes católicos da congregação dos Padres Brancos concluiu, no termo de uma reflexão interna sobre a actual situação social e política em Moçambique, que existe um “risco real” de desestabilização do país devido a descontentamentos provocados pelas precárias condições de vida da maioria da população.

O moderador do grupo foi o Padre Jean-Pierre Scour, que presentemente missiona na Paróquia dos Libombos. É comumente reconhecido como competente observador das realidades moçambicanas, que conhece bem; teve uma participação especial no processo negocial que levou em Outubro de 1992 à conclusão do AGP com a RENAMO.

Os Padres Brancos têm antigas tradições em Moçambique como voz crítica de desigualdades e injustiças. Na fase final da administração portuguesa do território chegaram mesmo a ser expulsos, devido a denúncias públicas que então promoveram de aspectos do sistema vigente.

O ponto de vista predominante na reflexão dos sacerdotes é o de que as diferenças sociais e económicas se têm acentuado, com a agravante de a pobreza, que atinge parte substancial da população, ter aumentado; ao contrário, a elite tem prosperado – criando um fosso notório entre ambas as camadas.

Uma avaliação sobre a situação no país, de origem diversa, conclui que também há sentimentos de descontentamento na classe média. É apontado o caso concreto de jovens gestores e quadros de empresas públicas que têm sido preteridos em processos de privatização ou de reestruturação das mesmas do interesse directo da elite política.

Os bispos católicos de Moçambique também manifestaram na sua última Carta Pastoral “sérias preocupações” em relação aos desequilíbrios sociais e a inerentes riscos de crises internas. O episcopado moçambicano é, em geral, independente e frontal nas suas tomadas de posição sobre a situação no país.

2. Os governantes e responsáveis políticos deixam transparecer preocupação “fora do comum” face à eventualidade da ocorrência no país de manifestações de protesto semelhantes às de 2008/2010; temem que as mesmas, acicatadas por razões de conjuntura (contágio de revoltas no Norte de África), possam vir a ter dimensão superior.

O PR, Armando Guebuza, é apontado como o dirigente aparentemente mais preocupado – atitude remetida para a “informação privilegiada de que dispõe”. Algumas medidas vistas como inevitáveis, mas de efeitos presumivelmente nocivos, entre as quais um aumento dos preços dos combustíveis, têm vindo a ser proteladas por sua própria influência.

O Governo tem garantido que manterá por tempo indefinido todas as medidas de austeridade e o congelamento de preços adoptado no rescaldo dos protestos sociais de 01/02.Set.2010. Há dúvidas fundadas, porém, de que os subsídios do Estado destinados a manter os preços de gasóleo e bens de primeira necessidade possam continuar.

Os doadores internacionais têm vindo a reduzir as suas contribuições para o Orçamento do Estado, além de que, conforme reconheceu o ministro da Planificação e Desenvolvimento, Aiuba Cuereneia, o actual quadro da situação é agravado por factores adicionais como a alta dos preços dos combustíveis e dos cereais no mercado internacional.

Analistas políticos nacionais, alguns dos quais ligados à FRELIMO, consideram que o clima social, descrito como sendo de “saturação e descontentamento”, apresenta um elevado grau de propensão a protestos e revoltas, com a agravante de não haver plena confiança de que a Polícia esteja em condições de manter a ordem pública.

3. O Governo tem anunciado políticas e planos destinados a prestar mais atenção aos sectores agrário, agroindustrial e mineiro, que passaram a ser prioritários na estratégia de desenvolvimento económico e social de Moçambique. A nova orientação é reflexo de pareceres e recomendações como as seguintes:

– O agravamento da pobreza em Moçambique é essencialmente decorrente da diminuta atenção que a agricultura tem merecido da parte do Governo nos últimos 15 anos – em termos de investimento público e de medidas destinadas a atrair investimento privado.

– A actual estrutura económica, baseada em grandes projectos industriais, está desligada da realidade e não corresponde a exigências elementares de melhoria das condições de vida da população; não gera emprego nem rendimento. Peritos de instituições como o BM, BIRD, FMI, BAD e outros defenderam pontos de vista favoráveis a um rápido desenvolvimento da agricultura numa conferência recente em Maputo.

A agricultura predominante no país, do tipo familiar ou de subsistência, também está sob ameaça de projectos de biocombustíveis. Na época da administração portuguesa a agricultura era, a par dos transportes e comunicações, um dos mais dinâmicos sectores da economia. O território tem condições consideradas privilegiadas para a agricultura, entre as quais aptidão dos solos, abundância de água e clima.

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