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Filme de Eastwood mostra como Mandela conquistou os brancos com o rúgbi

A África do Sul acabara de abolir o apartheid quando, em 1995, chegou à final do Mundial de Rúgbi e o primeiro presidente negro do país, Nelson Mandela, chegou ao coração dos compatriotas brancos ao assistir a partida com um uniforme dos ‘Springboks’.

O filme ‘Invictus’ do americano Clint Eastwood, onde Morgan Freeman vive Mandela, é dedicado a este momento antológico e estreará nos cinemas da África do Sul na sexta-feira, enquanto o país se prepara para ser a sede do grande evento esportivo do planeta, a Copa do Mundo de Futebol de 2010. “Quando Mandela apareceu com a camisa verde e dourada, a multidão emudeceu com o efeito”, lembra o ex-jogador John Allan, que estava no estádio Ellis Park de Johannesburgo naquele 24 de Junho de 1995 para assistir a final contra a Nova Zelândia.

O estupor era incomensurável: o rúgbi é o esporte preferido dos afrikaners, os descendentes dos primeiros colonos europeus que institucionalizaram a segregação racial e deixaram Nelson Mandela na prisão até 1990. “Foi incrível”, completa Steven Roos, diretor da Federação de rúgbi Sul-Africana e testemunha ocular. “Na época sabíamos apenas que Nelson Mandela era membro do ANC (Congresso Nacional Africano) e para nós o ANC era um movimento terrorista”. “De terrorista, Mandela passou rapidamente a presidente, mas a maioria dos brancos continuavam céticos. Alguns inclusive armazenaram comida porque pensavam que uma vez que os negros estivessem no poder acabaria o abastecimento”, lembra.

E então, apareceu Mandela, eleito um ano antes nas primeiras eleições multirraciais o país, desejando boa sorte a uma equipe de apenas uma cor, com exceção do mestiço Chester Villiams. Nas costas de sua camisa estava um enorme 6, o número do capitão dos ‘Springboks’ François Pienaar. “Uma vez passada a surpresa inicial, todo o estádio começou gritar ‘Nelson, Nelson!”, conta Steven Roos. E nas arquibancadas, vários torcedores começaram a chorar. No entanto, o gesto de Mandela não despertou unanimidade. “Aquela ainda era a época da negociação, antes da aprovação de uma nova Constituição”, recorda Strike Thokoane, secretário-geral do partido africanista Azapo.

“Era prematuro, tivemos a impressão de que se rendia ao inimigo”. Com o tempo, o analista Aubrey Matshiqi, do Centro de Estudos Políticos, lamenta sobretudo que “ao gesto de Mandela não tenha seguido uma verdadeira reconciliação entre negros e brancos”. Na opinião de Matshqi, as relações entre as duas comunidades só vão melhorar quando melhorarem as condições de vida dos negros. “Do contrário, será difícil que surja um sentimento comum de pertencer”. As desigualdades continuam sendo clamorosas na África do Sul, onde 43% da população que vive abaixo da linha da pobreza é quase totalmente negra.

“E continua existindo esta impressão de que sempre são os negros que estendem a mão da reconciliação”, afirma Matshiqi. John Allan admite que, no mundo do rúgbi como em outros âmbitos, “foram feitos poucos esforços pela integração dos jogadores de cor”, o que se reflete na equipe do Mundial de 2007, que ainda era predominantemente branca. “Em certa medida os brancos aceitaram Mandela, mas não sua raça”, opina Matshiqi. “Ao se tornar o símbolo da reconciliação, mascarou a ausência de uma mudança real no país”. “Não se deve ter ilusões. Durante a Copa do Mundo de 2010 negros e brancos serão vistos torcendo para a mesma equipe. Mas, passada a euforia, não haverá mais avanços”, conclui.

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