Criado há 16 anos, o prémio CNN Multichoice Jornalista Africano do Ano é o mais prestigiado e ambicionado troféu da Comunicação Social no nosso continente. Um moçambicano está intimamente ligado ao prémio: Arlindo Lopes.
Jornalista sénior com mais de 30 anos de experiência na área da Comunicação em África, primeiro como repórter, tendo posteriormente assumido sucessivamente as funções de editor, director e gestor, e desde 2005 as de jurado do prémio da CNN e Multichoice.
Sem estar no activo, e a viver na África do Sul, Arlindo Lopes falou com @Verdade sobre o jornalismo de hoje em Moçambique e deixa algumas dicas para os jornalistas moçambicanos que nos próximos anos pretendam alcançar o reconhecimento, e inspiração, que este prémio representa.
@Verdade – Qual é a sua percepção sobre o jornalismo que se faz hoje em Moçambique, em relação ao tempo em que estava no activo?
Arlindo Lopes (AL) – Há uma diferença enorme. Primeiro por causa da diversidade de órgãos da Comunicação Social, há mais opções para os leitores. Podes ter vários tipos de jornalismo, desde o formal ao mais livre, liberto mais criativo, mais jovem até!
Temos uma vaga de jornalistas que se iniciaram nos últimos anos, uns passando pela Escola de Jornalismo outros pelas instituições de formação superior a nível de comunicação social que hoje existem em Moçambique, e outros ainda que não passaram por nenhum desses caminhos mas começaram a escrever. Isso enriqueceu bastante a Comunicação.
Claro que há coisas boas e más, alguns podem-se queixar de que há menos observância das regras básicas de jornalismo por alguns profissionais, mas, acima de tudo, penso que só se ficou a ganhar com essa diversidade e é sempre possível separar o trigo do joio. Eu agora posso escolher o jornal que quero ler, que corresponda aos meus interesses.
V – Mas acredita que esta quantidade de media foi correspondida pela qualidade?
AL – Não necessariamente. Eu pessoalmente esperava que em termos de qualidade tivéssemos crescido muito mais nestes anos todos, precisamente devido à diversidade de órgãos de comunicação que existem, devido à concorrência pelo leitor, telespectador ou ouvinte.
V – Qual julga ser a causa desta falta de qualidade no jornalismo moçambicano?
AL – Talvez haja menor exigência da parte dos editores. Faz-se pouca investigação, talvez pela pressa de ir ao mercado, pela necessidade de satisfazer vários públicos em simultâneo, talvez o rigor profissional não esteja a ser acautelado.
V – E o que deve acontecer para se inverter esse cenário?
AL – Eu penso que o tempo se encarregará disso. O leitor, o telespectador, o ouvinte são hoje cada vez mais exigentes daí eu penso que alguns órgãos deixarão de ter a devida aceitação, aqueles que tiverem qualidade vão sobreviver!
V – Há alguns anos que é jurado do CNN Multichoice Jornalista Africano do Ano. Tem havido muitos candidatos moçambicanos para este prémio?
AL – Tem havido um número crescente de participantes. Quando a categoria de língua portuguesa deste prémio foi lançada em 2005 o número de trabalhos que consideramos não ultrapassava os 15.
Nos anos subsequentes empenhei-me na divulgação do prémio (em Moçambique), falei com o sindicato, falei individualmente com colegas jornalistas que eu sabia que tinham potencial para ganhar, falei inclusivamente com alguns chefes de redacção para que motivassem os seu repórteres e à medida que começaram a aparecer vencedores moçambicanos então mais candidatos apareceram.
Devo dizer que no último ano, dos países de língua portuguesa, Moçambique foi aquele que contribuiu com um maior número de trabalhos.
V – E sobre a qualidade dos trabalhos submetidos pelos jornalistas moçambicanos?
AL- Infelizmente, estamos a lutar com esta questão da qualidade. Apesar de concorrerem cada vez mais jornalistas moçambicanos julgo que poderiam concorrer muitos mais.
V – Que dica dá aos jornalistas moçambicanos com vista a ganharem o prémio CNN Multichoice Jornalista Africano do Ano?
AL – Este prémio é para um jornalismo de excelência. Não basta escrever a história como mandam os manuais e respeitar todas as regras do ofício, a história tem que sobressair acima do bom. Tem que ser óptima. Tem que mostrar alguma criatividade e algum impacto que aquela história teve nos meios em que foi publicada. Às vezes a história pode até ter mudado a vida de uma sociedade.
Tem que ser uma história, se for escrita, que agarre o leitor ou prenda os telespectadores desde as primeiras imagens até ao fim, se for uma história de televisão. Caso seja uma história radiofónica tem que permitir ao ouvinte também visualizar e ter sensações sobre o que está a escutar. Outra dica: tem que ser um trabalho de que nós não nos esqueçamos.
V – Porque será que uma história veiculada pela rádio nunca ganhou o troféu principal deste prémio?
AL – Sem ser especialista em rádio, mas pelo trabalho que tenho feito com outros membros do júri que tem experiência em rádio, o que sobressai de negativo é que muitos profissionais de rádio africanos entendem por sonorizar colocar apenas música por baixo do texto, sendo quase uma narrativa monótona intercalada por música. A rádio tem que inspirar o ouvinte a usar a imaginação mesmo quando se trata de informação.
V – Existe a ideia de que para se ganhar este prémio é preciso ser-se um jornalista experiente, com uma carreira longa. Isso é verdade?
AL – Para se ganhar estes prémios não é preciso ser-se um jornalista com muitos anos de carreira. Felizmente têm concorrido, e vencido, estes prémios muitos jovens, o que lhes dá mais autoconfiança para continuarem a fazer mais histórias. Os vencedores, depois deste reconhecimento, sentem-se galvanizados a escreverem ainda mais.
Se uma pessoa publica apenas uma história e pára torna-se numa referência morta, ficamos sem saber se aconteceu por acaso (ter feito uma boa história) ou se é profissionalmente boa. A ideia destes prémios é também criar referências no jornalismo a nível do continente, daquilo que é o bom jornalismo.