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FAO e Governo lançam mais um projecto para aumentar a produção agrícola, que não é inclusivo a todos camponeses

FAO e Governo lançam mais um projecto para aumentar a produção agrícola

José Mateus é um jovem camponês da província de Manica, “eu pratico agricultura desde que me lembro, sou filho de camponeses”. Sobre as medidas do Governo para impulsionar a sua actividade, e a dos seus pais, disse-nos que não usa o subsídio de combustível “porque na bomba não querem saber quem sou”, não beneficia da tarifa agrícola de baixa tensão porque onde ele reside a energia eléctrica não chega. Quisemos saber se pelo menos está a beneficiar do programa de vouchers lançado pela agência da ONU para Agricultura e Alimentação (FAO) em parceria com o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar (MASA), para ajudar produtores agrícolas? “Já ouvi falar, mas não nos convidaram” disse-nos José que está a aprender agro-ecologia, uma alternativa a agricultura intensiva que se pretende criar com o PROSAVANA.

Há algumas semanas a FAO e o MASA lançaram na província de Manica – concretamente nos distritos de Bárue, Gondola, Manica e Sussundenga -, um projeto-piloto para disponibilizar aos camponeses moçambicanos sementes de qualidade e insumos agrícolas através de comerciantes com o objectivo de melhorar a produção, o acesso aos alimentos e também melhorar a nutrição, ainda no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM1c).

O projecto, que deverá acontecer durante cinco anos e está orçado em 3,5 milhões de Euros, consiste num cartão eletrónico que traz um subsídio financeiro que permite camponeses irem à lojas parceiras do projecto, chamadas de agro-dealers, comprarem as sementes que precisam, os fertilizantes e outros insumos que possam necessitar para melhorar a sua produção agrícola.

O subsídio já é fornecido desde 2013 pela FAO através de vouchers de papel, que limitavam o camponeses a aquisição de produtos num único comerciante e em caso de perda ficavam sem nada. A inovação é agora esse subsídio está disponível num cartão de plástico, com um código PIN, e em caso de extravio o camponês tem que pedir um novo que trará o subsídio ainda existente que está registado num sistema online.

“Pode, com o voucher electrónico, comprar aos poucos e em várias lojas, tem flexibilidade na escolha dos produtos que quer, tem segurança de um código PIN e o cartão é válido dentro do programa ODM por três anos”, explicou Walter Oliveira, coordenador da FAO em Moçambique para o indicador da redução da fome nos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio.

Walter explica que estão disponíveis dois tipos de subsídios, que requerem uma comparticipação dos camponeses. “Temos um pacote A, o valor é de mais ou menos 35 dólares norte-americanos, que são para aqueles agricultores ainda não têm conhecimento do uso de fertilizantes (agro-químicos). O agricultor paga 30% do valor deste pacote. Já o pacote B é para o agricultores que chamamos emergentes, tem um valor de mais menos 130 dólares norte-americanos e permite-lhe adquirir também sementes híbridas, fertilizantes, insecticidas, herbicidas. Os emergentes tem uma comparticipação de 50% do valor.”

Segundo o coordenador da FAO em Moçambique para os ODM1c, que vê nestes vouchers electrónicos uma ferramenta de inclusão financeira, os camponeses devem comparticipar como forma de eliminar a dependência que se cria facilmente quando se dá tudo de graça.

Acontece que para a maioria dos camponeses reunir o valor da comparticipação não é tarefa fácil, embora o projecto permita que eles possam ir entregando aos comerciantes os valores monetários que tenham e, depois de completarem a comparticipação, comecem a fazer uso do subsídio.

Associado ao subsídio os camponeses recebem formação de técnicas de produção e cultivo, nas “escolas machamba”, onde aprendem ainda como usar as sementes e insumos agrícolas.

Vouchers poderão beneficiar mais aos comerciantes

O drama é que dos milhões de euros investidos no projecto só uma ínfima parte apoia efectivamente os camponeses moçambicanos perdendo-se uma parte significativa nos burocratas e técnicos que o implementam assim como nos comerciantes que não só distribuem os cartões electrónicos, e recolhem as comparticipações, como também são eles que vendem as sementes e os insumos agrícolas, ao preço de mercado, e ainda recebem uma comissão da FAO.

Foto UNACEste projecto da FAO e do MASA também não assegura que os camponeses compram na sua rede de comerciantes produtos de qualidade, agro-dealers existem que vendem até sementes pintadas que depois não germinam.

Numa altura em que a economia de Moçambique atravessa um período de maior crise e todos os entendidos, incluindo os do Governo, apontam a fraca produtividade da agricultura e a grande dependência da importação, principalmente de produtos alimentares, como os maiores problemas as soluções postas em prática ao longo de 40 anos têm-se revelado de uma forma geral desajustadas e pouco efectivas no apoio aos camponeses, que são a grande maioria dos moçambicanos.

Há vários anos que o combustível é subsidiado para os agricultores porém os camponeses não conseguem beneficiar deste apoio pois a maioria nem sequer consegue ter um documento de identificação pessoal e os postos de abastecimento estão longe das machambas.

Existe também uma tarifa agrícola de energia eléctrica mas os camponeses não podem beneficiar-se dela pois a electricidade não existem nos locais onde precisam de ligar as suas moto-bombas para irrigação dos campos de cultivo.

Mais recentemente o Executivo decidiu mexer no código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) para a agricultura, que já prevê a isenção do pagamento do seu pagamento na transmissão interna de bens e serviços no âmbito da actividade agrícola, silvícola e pecuária. Porém em termos práticos esta medida não beneficia os camponeses cuja grande maior não tem o Número Único de Identificação Tributário (NUIT), ou estão em Regime de Tributação Simplificado – o qual não dá lugar à dedução. Até mesmo os grande produtores agrários, representados pela Confederação das Associações Económicas de Moçambique consideram que o IVA no sector é um custo, não dá lugar à dedução.

Dificuldade de acesso aos mercados, DUATs, créditos agrícolas

José é um dos milhões de moçambicanos que vive da agricultura, “nós cultivamos o milho, mapira e hortícolas, numa machamba familiar de três hectares no distrito de Gondola”. É jovem, casado e pai de dois filhos, e estudou até a 12ª classe, sobre o futuro não tem dúvidas que “quer ser agrónomo”.

Mas embora seja camponês não é um dos cerca de dez mil beneficiários dos vouchers electrónicos, nem de papel, que estão a ser distribuídos pela agência da ONU para Agricultura e Alimentação em parceria com o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar, porque é membro do movimento camponês de Moçambique a União Nacional de Camponeses (UNAC).

Foto UNACAlém da machamba familiar, José Mateus trabalha com outros camponeses, agrupados em associações, onde produzem alimentos na província de Manica sem recursos a grandes mecanizações ou a agro-químicos. E não é por causa das mudanças climáticas, mas porque é assim que aprenderam com os seus pais, e estes com os seus avós.

José esta agora a aprender outras técnicas ecológicas para continuar a fazer da agricultura o seu sustento porém num agro-ecossistemas sustentável.

Os problemas que enfrentam são os mesmo de sempre, dificuldade de acesso aos mercados, “das 220 associações existentes só cerca de dez por cento tem DUAT´s(Direito de Uso e Aproveitamento da Terra), porque o processo de legalização é muito moroso, tem muita burocracia e custa dinheiro porque isso trata-se com a Geografia e Cadastro e é longe das machambas”.

Além da falta de subsídios e apoios do Governo os camponeses que são membros da UNAC também tem dificuldades em ter acesso aos créditos, pois os bancos comerciais não só cobram taxas de juros elevadas como pedem garantias que os pequenos agricultores não tem.

Os camponeses não conseguem sequer fazer uso dos Centro de Serviços Agrários, que começaram a ser lançados em vários distritos, pois os equipamentos lá disponíveis têm de ser alugados e como os camponeses não têm dinheiro esses serviços servem apenas os grandes produtores.

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