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Falta de meios dificulta combate à droga

Falta de meios dificulta combate à droga

O Gabinete Central de Prevenção e Combate à Droga (GCPCD) diz haver falta de recursos financeiros e humanos para fazer face ao combate e tráfico de drogas no país. Esse facto constitui um grande desafio, sobretudo, porque os traficantes têm usado meios sofisticados para fazer circular os seus produtos. Alfredo Dimande, director do Gabinete, entende que pelo nível de influência do narcotráfico “corremos o risco de ter instituições infiltradas por traficantes”, o que será difícil de se combater, apesar de o país não estar numa situação dramática. Em conversa com o @Verdade, Dimande defendeu que o consumidor de drogas não é um alvo a abater, mas um doente com quem devemos nos preocupar.

(@V): Qual é a tarefa do Gabinete Central de Prevenção e Combate à Droga? Alfredo Dimande

(AD): O GCPCD é uma instituição de âmbito nacional, dependente do Conselho de Ministros, tem as funções de de coordenação geral de prevenção e combate à droga, actividades que desenvolve com várias instituições. Temos instituições que cuidam de aspectos primários outros de coordenação secundária e outros ainda de coordenação terciária. Trabalhamos com os Ministério da Educação, Ministério da Saúde, Ministério da Juventude e Desportos, Ministério da Indústria e Comércio, Ministério dos Transportes e Comunicações, do Interior, da Justiça, entre outros. Estas instituições estão representadas e são dirigidas pelos respectivos dirigentes, ou seja, são independentes para que se articulem com o Gabinete Central, uma vez que a mesma é a instituição aglutinadora. A disseminação de mensagem educativa antidroga é feita por instituições próprias.

@V: Qual é o modelo de actuação do Gabinete e das instituições ligadas ao mesmo para o controlo da droga no país?

AD: Cada uma das instituições que mencionei tem responsabilidades próprias. Há aquelas com competências que são atribuídas pelo Gabinete, sob o ponto de vista de coordenação geral das matérias referentes à prevenção e combate à droga. O GCPCD recolhe a informação relativa ao tráfico e consumo de drogas. Os outros gabinetes têm activistas em todo o território nacional, são adolescentes e jovens que têm como grupo alvo pessoas destas faixas etárias, sob forma de campanha. Há outro trabalho que é realizado no cumprimento daquilo que estabelece a legislação, que é toda a necessidade de abordagem da matéria a nível curricular. De forma transversal, nas escolas, faz-se a abordagem destas matérias.

Todas as instituições que integram o Gabinete, no âmbito dos seus planos de actividade, desenvolvem algumas campanhas de disseminação de mensagens educativas antidrogas. Um dos aspectos que é accionado nas campanhas é exactamente o recurso às palestras.

@V: Em Moçambique proíbe-se o consumo e a produção da droga ou apenas o consumo?

AD: Ambas as coisas, mas é um pouco complexo, primeiro temos determinadas realidades em que o produto considerado droga é de natureza agrícola. Mas às vezes a produção pode não ter sido autorizada ou ser utilizada para fins ilícitos porque há quem produz para o seu próprio consumo, em pequenas quantidades e a lei dá tratamento específico a este tipo de consumidor, dando, logicamente ordem para travar estes comportamentos. A nossa lei não abre espaço para que as pessoas possam envolver-se facilmente na produção e consumo ilícito de drogas.

@V: É difícil combater a droga em Moçambique?

AD: É dificílimo. Gostaria de acentuar que para nós a maior satisfação seria estar-se na situação em que existe zero traficantes e zero consumidores de drogas. Enquanto houver tráfico e consumo ilícito de drogas estaremos perante um desafio, mesmo que estivéssemos num quadro em que temos zero traficantes e zero consumidores a droga não deixaria de constituir uma preocupação porque a grande aspiração seria manter esses níveis. Torna-se extremamente difícil toda esta intervenção porque não estamos num país repleto de condições consentâneas para fazer face a este grande desafio.

Somos sacudidos pelas imensas dificuldades que o país tem, fazemos parte deste rol de dificuldades, por isso mesmo não se está a fazer o trabalho em condições óptimas, há recursos que seriam um pouco mais adequados para que pudéssemos desenvolver o trabalho com alguma fluidez e não temos esses recursos. Mas também não é tendo recursos abundantes que se consegue ter grandes sucessos nesta matéria…

@V: A que recursos se refere?

AD: Estou a referir-me a recursos de vária índole, como recursos humanos solidamente preparados para lideram com esta matéria extremamente delicada. Mas o tráfico de drogas envolve grandes somas de dinheiro. Para se fazer face ao tráfico, não se pode proceder de forma voluntariosa, mas, sim, é preciso que haja recursos à altura mais ou menos dos desafios. E aí entram várias matérias, podemos ter outras abordagens, como seja as práticas que os narcotraficantes usam para poder ter muita permeabilidade.

Os traficantes usam variadíssimas formas de actuar incluindo a corrupção. Se alguém está numa situação de fragilidade e tem que lutar com um gigante, o gigante obviamente pode arranjar artifícios para fragilizá-lo cada vez mais e termos assim instituições que possam estar bastante infiltradas por traficantes. É por isso que se quisermos fazer face com seriedade a esta matéria são necessários recursos financeiros, inclusivamente para a mobilidade no terreno, é necessário que existam meios adequados.

Podemos vivenciar aquelas situações em que uma autoridade se desloca com meio inadequados ou não tem meios para se deslocar, mas está para perseguir um criminoso que utiliza meios muito sofisticados. Temos situações destas, em que a droga é produzida em lugares de difícil acesso. Temos, por exemplo, casos em que a droga é contrabandeada no alto-mar. Que meios é que nós temos para podermos controlar? É preciso ver o assunto desta maneira.

A sofisticação dos traficantes requer alguma sofisticação do nosso lado, sob o ponto de vista de meios materiais, treinamento. Temos acompanhado caso de mulheres que são compradas para servirem de “mulas” no Brasil e noutras partes do mundo. A cocaína é transportada de forma mais humilhante: a utilização dos órgãos genitais. Humilhante e extremamente perigoso. Muitas vezes, aproveita-se a situação de pobreza em que se encontram uns e outros.

@V: Em que sentido se pode afirmar que a droga em Moçambique é um dos pilares da violência?

AD: Há várias reacções que as drogas provocam no organismo. Há drogas que podem levar à euforia e as pessoas ficam extremamente violentos, como consequência da estimulação da droga. Existem, sim, situações de violência doméstica, a nível da sociedade que decorrem do consumo da droga. Não só estamos em situações de roubo, há indivíduos que acabam por praticar esses crimes porque fazem parte de quem usa drogas.

Em alguns casos vemos pessoas que perdem a vida vítimas de drogados porque estes querem apropriar-se dos seus bens, outros violam e por aí fora. Destas substâncias que são consumidas, capazes de alterar o comportamento normal dos indivíduos, a mais consumida é o álcool. O que é notório, devido aos acidentes, é o consumo de bebidas alcoólicas e nunca se nota com grande expressão determinadas situações danosas devido ao consumo de outras substâncias. Mas muitas vezes não estamos perante o consumo de bebidas alcoólicas, mas associados a outras drogas.

@V: Como o Gabinete olha para os produtores do álcool?

AD: Já se levantou a questão várias vezes no Conselho de Ministros, no sentido de ter que se prestar mais atenção a este assunto e teve-se como corolário a aprovação da legislação atinente às bebidas alcoólicas. Não quer dizer que isto tenha sido motivado pelo Gabinete de forma exclusiva, mas várias abordagens no Conselho de Ministros para se ter muito cuidado com o perigo que o álcool está a representar, mas houve vários motivos para se apontar os perigos que representam na sociedade. Olhamos para os produtores do álcool com uma grande carga de preocupação e os dados que recebemos do Ministério da Saúde.

Com estes números, o Gabinete Central de Prevenção e Combate à Droga tem que estar preocupado com estas situações, principalmente os fabricantes de bebidas alcoólicas, sobretudo das bebidas com qualidade duvidosa, criam problemas no campo de prevenção em relação às drogas. Em alguns casos, algumas pessoas, depois de ingerirem o álcool, assumem comportamentos inadequados, alegando que se trata apenas de álcool. A nossa preocupação é em relação aos adolescentes e jovens. A abordagem para a criminalização da droga é diferente da abordagem que damos ao álcool, devido à questão da ilicitude.

@V: Que comentário faz sobre a sugestão dos delegados da Terceira Conferência Bienal do ACSA, em que os mesmos dizem haver a necessidade de se humanizar as cadeias sendo uma das formas a descriminalização dos consumidores que estão em grande número nas penitenciárias?

AD: É uma mera opinião, e as opiniões não se transformam em legislação. Nós temos uma legislação própria que trata destas matérias. O consumidor de drogas, de uma maneira geral, é um doente e, como tal, não é um alvo a abater, é apenas um paciente que deve ser tratado.

A nossa legislação é muito complacente, ela permite que haja um tratamento humanitário em relação ao consumo de drogas. Não significa que um consumidor de drogas tem que ser destruído, para além de que as penas são bastante leves, em relação ao consumo de certas substâncias. Estamos a trabalhar, conscientes de que os números que nos são dados não são uma fotografia real, mas de certo modo dão-nos alguns indícios e é sobre isso que nós trabalhamos.

@V: Há espaço para mudanças a médio prazo?

AD: Há bastante clareza para o que se deve fazer. Eu não colocaria a questão sob o ponto de vista de inoperância porque o nosso país não está numa situação bastante dramática tanto em relação ao tráfico, assim como ao consumo ilícito de drogas.

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