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Estado moçambicano quer despejar seu funcionário reformado para entregar o imóvel a empresário estrangeiro

Estado moçambicano quer despejar seu funcionário reformado para entregar o imóvel a empresário estrangeiro

Aniceto Jorge Rapieque, funcionário público, está na iminência de ser despejado pelo Governo Provincial de Nampula, da residência pela qual pagou e habita desde 1979, alegadamente porque é foi reformado. “Um empresário propôs ao Governo a oferta que visava expandir os serviços de saúde e em troca receber duas casas e uma delas é esta, onde habita o Aniceto e sua família” explicou ao @Verdade o Governador Victor Borges. Um despejo coercivo foi encetado pelas autoridades, usando a forças policiais, que até suspenderam o pagamento da sua parca reforma como forma de pressiona-lo a abandonar o imóvel onde reside com a esposa, filhos e netos. “Eu e minha família temos fé em que, ainda que se manipule a justiça humana há sempre espaço para se revelar a justiça Divina, pois esta, ainda que demore nunca falha” desabafa.

Natural do distrito de Meconta, Aniceto Rapieque tornou-se funcionário do Estado em Março de 1975. “Em Janeiro de 1979, fui transferido para a Repartição de Finanças de Nampula, província de Nampula, com a categoria de Recebedor de Fazenda, até o ano da minha reforma, em 2015, a qual atingi com a carreira de Técnico Tributário” conta numa exposição enviada às autoridades e que o @Verdade publica em na íntegra em separado.

Como vinha transferido de Pemba, na província de Cabo Delgado, foi-lhe atribuído um imóvel, tipo 3, localizado na Rua Francisco Manyanga nº 185, na cidade de Nampula, que estava na altura abandonado e de certa forma degradado. A família Rapieque tornou-a habitável, com os seus parcos recursos, tendo-a transformada no seu lar ao longo dos últimos 37 anos.

Entretanto, por sugestão do seu então superior hierárquico, Fernando Eduardo Vaz, na altura director Provincial de Finanças de Nampula, foi feito um acordo verbal de cavalheiros, que segundo o lesado era a prática corrente nesses anos iniciais do pós independência, para que Aniceto adquirisse a casa pagando em prestações mensais, descontadas da sua remuneração. “A partir de Janeiro de 1979 comecei a sofrer descontos mensais de renda de casa sob o regime de retenção na fonte, no valor de 2.160,00 MT (…) Este acordo fora testemunhado pelo então Chefe dos Recursos Humanos, o senhor Henrique Vieira Pateguana, a quem coube a responsabilidade de guiar o processo”.

De acordo com o lesado “em Agosto de 2011 dirigi um requerimento ao então Ministro do Plano e Finanças, pedindo para que me fosse concessionado o referido imóvel, uma vez tendo cumprido com minhas obrigações, e que nele habito há quase 40 (quarenta) anos e é por mim mantido. O meu pedido foi indeferido, porém com a prerrogativa de a DPPF (Direcção Provincial do Plano e Finanças de Nampula) fazer melhor juízo sobre o assunto provavelmente por entender que só esta teria os pormenores que justificassem”.

Reformado e intimidado a abandonar um imóvel que pagou

Passados alguns anos, em meados de 2015, Aniceto Rapieque foi intimado a reformar-se, nos termos regidos pelo Estatuto dos Funcionários e Agentes do Estado. Cerca de um mês depois foi surpreendido com uma notificação “para, no prazo de 90 (noventa) dias, proceder à entrega das chaves da casa em que me encontro a residir”.

Simultaneamente o nosso entrevistado foi contactado telefonicamente por um empresário radicado em Nampula, de ascendência asiática e nacionalidade portuguesa, que se identificou pelo nome de Issufo Nurmamade e o convidava para uma conversa amigável.

“A conversa inicia com a pergunta do empresário, que pretendia saber se eu havia recebido algum documento dos Serviços, tendo seguidamente passado a interpretar os direitos e deveres do funcionário aposentado, como se de funcionário do Departamento dos Recursos Humanos se tratasse. Perante o meu silêncio o senhor Issufo continuou com a dissertação, dizendo que o Estado pode decidir sobre o destino a dar à um imóvel, caso este atinja o seu limite de vida. Prosseguindo, afirmou ser nesses moldes que sob sua proposta, o Governo Provincial de Nampula lhe concessionara dois imóveis, sendo um actualmente ocupado por mim e o outro ao lado (património da Direcção Provincial da Agricultura de Nampula), avaliados e propostos por ele em 12 e 18 milhões de meticais, respectivamente”.

Segundo Aniceto o empresário predispôs-se a ajuda-lo a abandonar o imóvel concedendo-lhe 150 mil meticais. Por coincidência, recorda o lesado “numa audiência tida com alegada comissão criada pelo Director Provincial do Plano e Finanças de Nampula, no gabinete do chefe do Departamento do Património, foi-me garantido que os Serviços me abonariam com o valor de 150 mil meticais como responsabilidade social dos mesmos, o que causou espanto pela coincidência do valor”.

“Naquela mesma audiência tive a informação de que podia permanecer na casa apenas até 30 de Agosto de 2015, porque o meu pedido de prorrogação de prazo fora indeferido”, relata o reformado funcionário público moçambicano.

Director Provincial da Economia e Finanças ignora o Ministro Adriano Maleiane

Inconformado com a decisão, Rapieque solicitou uma audiência ao Governador da província, Victor Manuel Borges, tendo sido recebido a 17 de Julho de 2015. Todavia o governante apenas confirmou que “a entrega da casa era irreversível”.

Conhecedor da função pública Aniceto Rapieque não se deu por vencido e deslocou-se à capital do País para apresentar a injustiça que está a ser alvo ao Ministro de Economia e Finanças, Adriano Maleiane. Contudo, enquanto aguardava deferimento da audiência que solicitara recebe um telefonema dos filhos, em Nampula, “na qual clamavam por socorro, pelo facto de uma equipa da Direcção Provincial de Economia e Finanças ter se dirigido à minha casa com um contingente policial fortemente armado, para proceder ao despejo”.

“Perguntei se eles traziam algum documento da Justiça e eles responderam que não, apenas afirmaram que pretendiam tomar a posse da casa mesmo que fosse a força. Única chance que poderiam dar era a de permitirem que os meus filhos retirassem todos os nossos bens para uma casa alternativa, que eles dariam em regime de empréstimo por um período de seis meses, fim dos quais teríamos que nos desfazer da mesma. Na ocasião, embora já tivessem vindo munidos de cadeados e correntes, os meus filhos resistiram a acção, justificando que não podiam colaborar com aquele acto na minha ausência”.

“Dois dias depois, em 24 de Junho de 2016, aproveitando-se da saída dos meus filhos para os seus postos de trabalho, por volta das 11:30 min, apareceu a mesma equipe e trancaram todas as portas da residência, tanto as de acesso ao quintal como as de acesso ao interior da casa, com todos os pertences no seu interior e deixaram cerca de 15 pessoas, entre adultos, jovens, adolescentes e crianças menores ao relento e sem mantimentos, nem fármacos, nem agasalhos” relata Aniceto Rapieque que em Maputo dirigiu-se imediatamente ao Ministério da Economia e Finanças onde foi recebido em audiência por Adriano Maleiane.

De acordo com o lesado o ministro Maleiane “reconheceu ter havido falhas no processo por parte dos colegas de Nampula. Ainda assim, no mesmo instante efectuou uma chamada telefónica ao Director Provincial da Economia e Finanças persuadindo-o para que mandasse abrir as portas com vista a salvaguardar a integridade física das pessoas afectadas por aquele acto, enquanto se aguardava pelo meu regresso. Apelo este que foi pura e simplesmente ignorado até a presente data” desabafa.

Empresário oferece centro de saúde em troca de duas casas no centro da cidade

O @Verdade entrevistou o Governador da Província de Nampula, Victor Borges, que confirmou o seu conhecimento sobre esta injustiça mas reiterou que o despejo da família Rapieque é uma decisão irreversível, pois os imóveis do Estado “são inalienáveis”.

“Os imóveis são alienados em condições excepcionais, como é o caso da casa onde o Aniceto vive. Um empresário propôs ao Governo a oferta que visava expandir os serviços de saúde e em troca receber duas casas e uma delas é esta, onde habita o Aniceto e sua família” explicou o Governador. “Nós, como Governo e porque entendemos que se tratava de interesses do povo, aceitámos a proposta e o empresário cumpriu com a promessa. Por isso, é chegado a hora de nós fazermos a entrega das casas. O Aniceto foi informado sobre isto desde o início”, acrescentou Victor Borges que revelou ao @Verdade ter dado instruções a Direcção Provincial de Economia e Finanças para que arranjassem uma casa para alojar o ex-funcionário público.

De acordo com o Governador a Direcção de Economia e Finanças foi relutante a aceitar a orientação. Entretanto, em Julho último, aquando da inauguração do Centro de Saúde construido pelo empresário, Borges disse que havia uma casa onde seria alojado Aniceto Rapieque e a sua família.

Todavia, a 11 de Julho, um dos filhos de Rapieque dirigiu-se ao Departamento do Património para inteirar-se da habitação que lhe seria alocada mas o chefe do sector, Dionísio Quaria, disse não ter as chaves tendo somente prometido contactar a família assim que as possuísse.

Confrontado com esta situação o Governador de Nampula prometeu resolver o assunto pessoalmente. “Queremos que a coisa se resolva pacificamente, mas ele (Rapieque) furtasse. Nós podemos encontrar uma casa e negociar para ele, que não deve ser aquela, porque já tem dono”.

Com a reforma suspensa e de parcos recursos Aniceto Rapieque está sitiado em Maputo desde Junho. A sua família em Nampula mantém no imóvel em litígio que está trancado pelas autoridades provinciais.

“É verdade que sou de pouca renda, como bem se conhece o leque salarial da função pública mas, com certeza, se ao menos me tivesse sido dado, como condição para a reversão da residência a meu favor, a construção, de um Centro de Saúde do Tipo II, com certeza me desdobraria a reunir tal condição ou renunciaria. Mas, tomando em consideração os descontos sofridos para a renda de casa nos critérios retro mencionados e os cerca de 40 anos nela residente estou ciente de que não se tratara necessariamente de uma ”concorrência” a que me tenho que submeter para poder ser legitimo proprietário do imóvel, mas sim da reposição da justiça” escreveu Aniceto ao patrão dos moçambicanos, o Presidente Filipe Nyusi.

“Mas, porque a esperança é a última luz que se apaga, eu e minha família temos fé em que, ainda que se manipule a justiça humana há sempre espaço para se revelar a justiça Divina, pois esta, ainda que demore nunca falha”, acredita o cidadão moçambicano.

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