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EDITORIAL: Haja vergonha, e cérebro também

Os últimos tempos têm sido férteis em notícias sobre os Jogos Africanos de Maputo 2011, relativas à possibilidade de as obras, sobretudo a Vila Olímpica, não ficarem prontas antes dos jogos. Essa possibilidade, aliás, já não é apenas habitual para a generalidade dos cidadãos. Galgou, literalmente, as estruturas do Ministério da Juventude e Desportos e o titular da pasta, Pedrito Caetano, sem perceber, já deixou transparecer, para a opinião pública, a incerteza no cumprimento dos prazos. O sentimento geral, depois das declarações do ministro, é o de que tais jogos acabarão por deixar o país com uma má imagem no exterior.

Esta constatação é tanto mais curiosa quando é sabido que, ao longo do ano, os nossos dirigentes apresentaram discursos diametralmente opostos aos actuais. Efectivamente, quando Pedrito Caetano diz, sem a mínima vergonha, que o Governo tem outras soluções no caso de as obras não ficarem concluídas não revela, como se pode supor, a existência de um “plano B”. Revela, isso sim, uma falta de planificação bem antiga.

Ou seja, este hipotético incumprimento explica-se com a ausência de políticas desportivas claras, com o desembolso tardio dos fundos, com os cortes orçamentais e com o atraso no início das obras, nomeadamente ao nível de recintos desportivos. Por outro lado, há um completo desconhecimento da dimensão dos Jogos Africanos. A este propósito, recorde-se o chamado pacote de divulgação da imagem dos jogos pela Ferro & Ferro, apresentado pelo COJA e que acabou por ser enviado para a gaveta do esquecimento.

Resta a falta de articulação eficaz entre o Ministério da Juventude e Desportos e as federações. Basta lembrar as referências feitas ao aproveitamento do Estádio Nacional do Zimpeto e à actuação no apetrechamento dos recintos desportivos, à promessa de medalhas, à identificação de atletas com o mínimo vestígio de moçambicanidade nas veias, aos Nacionais de atletismo, ou, mais recentemente, à realização do “Espectáculo do Século” no Zimpeto.

Uma vez que os dois primeiros casos ainda vão pôr muitos cabelos em pé, vejamos, apenas, o caso do apetrechamento dos recintos desportivos. Trata-se de uma questão delicada que tem estado literalmente parada quando faltam menos de 100 dias para os jogos – apesar de já se saber que a montagem desse equipamento necessita de tempo. Será que este desacerto pode conduzir a algum resultado? Claro que não! Na maioria dos casos, Pedrito Caetano ficará mesmo, como diz o povo, a ver os Jogos Africanos por um canudo…

A solução, então, passa por uma de duas receitas: ou se coloca a conclusão dos obras na dependência orgânica, funcional e operacional de uma equipa competente, passando os seus responsáveis a ser nomeados pelo próprio Presidente da República e a responder hierarquicamente perante Armando Guebuza, ou, no mínimo, se integram voluntários, presos e funcionários públicos no processo de construção. Para quem esteja preocupado com eventuais excessos e desvios de poder, o contraponto parece-nos óbvio: os jogos sem a Vila Olímpica seriam a maior vergonha em 36 anos de Independência.

Portanto, quando faltam menos de 100 dias, seria bom que o ministro da Juventude e Desportos perdesse algum tempo a apresentar soluções para este tipo de problemas, porventura mais importantes para a nossa “auto-estima”, como é moda dizer, do que o chamado “Espectáculo do Século” no Estádio Nacional que, mais do que promover os jogos, parecia destinado a desviar a atenção de problemas reais. Já agora: era bom saber o que moveu o ministro a pronunciar-se, ainda que hipoteticamente, sobre a não conclusão das obras da Vila Olímpica. Será apenas ignorância?

PS: O cidadão deve exigir mais dos nossos líderes. Contrariando algumas ideias tornadas públicas, não basta saber assinar papéis para se gerir um ministério. Na administração do Estado exige-se bom senso e humanismo, além de sólidos conhecimentos técnicos, aplicados de forma expedita. Por outro lado, também deve ser assegurada a legitimação do poder. Este resultará enfraquecido, se forem admitidos como “ministros” pessoas que não tenham a necessária idoneidade técnica para o desempenho do cargo. É tempo de os moçambicanos começarem a ser mais exigentes com os titulares dos órgãos de soberania. Perdoem os leitores esta nossa concepção elitista de certos cargos. Ao fazê-lo, apenas exprimimos um elevado grau de exigência, que julgamos ser necessário. O exercício de certos cargos tem de ser, por natureza, exemplar.

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