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Diga “não” aos direitos humanos!

Diga “não” aos direitos humanos!

No concerto da gravação do seu primeiro DVD, Jah Lite, além de realizar um espectáculo invulgar, Ras Haitrim disseminou uma mensagem – que se for avaliada sem se considerarem os seus argumentos, pode-se concluir que é – perversa. É que ordenou que “não defendamos os direitos humanos”. Talvez haja alguma vantagem. Experimentemos…

Há vezes em que os Homens precisam de se deixar, deliberadamente, conduzir por Jah a fim de libertarem o espírito Reggae que habita em si. Por isso, numa noite de calor intenso, como o da sexta-feira passada, 13 de Agosto, em Maputo, os amantes desse género musical encontraram- se no Centro Cultural Franco-Moçambicano. Iam ver Ras Haitrim e a sua banda Word Sound and Power.

Acredita-se que Jah esteve lá – e viu o concerto – afinal foi suplicado e sublimado do princípio até o fim. Mas quem dirigiu a actividade foi Ras Haitrim. Era o seu dia. Gritou, pulou, cantou, disse palavras especiais, encantou os presentes que saltitaram em proporções quase similares às suas. Foi uma festa com um decurso muito imprevisível, porque não apenas Ras e os seus convidados cantaram – o público também o fez. O evento foi uma pura interacção.

Poderia ter havido muito mais gente. Assim, o DVD seria muito rico. Mas os presentes desempenharam o seu papel – rumo à sublimação da música Reggae. Todos estavam vinculados por uma espécie de One Love – a segunda música exposta pela colectividade.

A excelente qualidade de execução dos instrumentos por parte de Ras Kafre, o baterista, Mighty Mito, o baixista, Jojó Zita, o teclista, Samito Tembe, o percussionista, e o guitarrista Diogo não só garantiu que se tivesse um concerto com elava qualidade, como também que nós, os espectadores, estivéssemos numa espécie de Security Place. Ou, pelo menos, assim cantou Ras Haitrim. Depreende-se que esta performance se deveu mais ao talento e ao engajamento dos artistas do que à experiência acumulada ao longo de muitos anos na área. Esses instrumentistas são muito jovens.

Ampliar o reino para criar o império

Atraídos por tal segurança, também tivemos actuações invulgares de convidados como Wazimbo e Valdemiro José que, não obstante o facto de explorarem um estilo musical diferente, se sentiram confortáveis no Reggae. É que a diferença que existe entre o Reggae e o resultado que se nos foi apresentado foi ténue.

Como se percebeu – desde a entrevista colectiva, nas vésperas, até à realização do concerto – Ras Haitrim quer expandir o reino da música Reggae no país. Por isso, induziu Valdemiro José a dizer ao público que irá publicar um trabalho discográfico, contendo Reggae. Promessa é dívida, costuma-se dizer; por isso esperemos para ver e consumir. Até este nível o concerto estava muito bom.

O problema é que Ras Haitrim (este jovem de 33 anos de idade com um espírito muito mais velho que isso, como afirma), depois referiu que “é melhor não defendermos os direitos humanos”. Disse-o em forma de ordem. Ficámos com algum receio porque, como ele é que estava a dirigir aquela congregação musical e todos os presentes, poderia influenciá-los nesse sentido – o que seria um problema.

Na sociedade em que vivemos, atordoada pela acção de gente que, recorrentes vezes, faz da vida a negação da própria vida, imagine-se que as organizações que defendem os direitos humanos abandonem a sua missão! O que seria das pessoas oprimidas e que, vezes incontáveis, vêem os seus direitos básicos abusados violentamente? O estimado leitor há-de convir que se produziria um caos social. Naquela noite, Ras Haitrim estava inspirado – o que se constatou a partir do que falou e da interactividade que produziu no concerto de mais de três horas.

“Toda a mudança é boa” – aportou uma nova ideia e atacou as Organizações Não Governamentais, dando-lhes a seguinte orientação: “Todas as ONGs que vêm a Moçambique para nos ajudar não se metam nos aspectos inerentes à nossa cultura”. Se Ras Haitrim, ou qualquer outro familiar ou admirador seu estiver a ler este artigo, agora, poderá – é uma possibilidade sobre a qual cogitamos – achá-lo demasiado chato, por entorpecer os factos, narrando-os parcialmente. Então, apresentemos os argumentos do artista.

Para sustentar a sua tese, o autor da famosa música Jah Lite sugere-nos que “lutemos pela paz, pelo amor e pela harmonia social para todos. Se defendermos, apenas, os direitos humanos, o que será das plantas e dos animais?” Construímos, imediatamente, um gancho para perceber a sua filosofia, questionando-o novamente.

Os parágrafos que seguem são uma resposta integral, mais elaborada, sobre o seu ponto de vista. “Para mim, toda a mudança é boa quando for necessária. Por isso, eu não posso introduzir uma transformação numa certa cultura – só porque tenho a minha como padrão. No entanto, nós nessa situação no país.

As organizações internacionais vêm a Moçambique, apoiam- -nos, mas também têm algo a dizer-nos. O problema é que não pesquisam nada sobre a nossa cultura. Impõe-nos os seus padrões de vida – sem considerar o nosso contexto. Por exemplo, se as pessoas têm mercado no centro da cidade de Maputo, o mesmo não pode ser transferido para outro espaço sem que, antes, sejam consultadas as pessoas.

Consultadas, as pessoas dirão, por exemplo, que se estão mal-situadas no seu espaço habitual, numa situação em que os seus clientes estão na zona do Museu, então que sejam transferidas para lá. Ou seja, iria-se produzir certo consenso, antes de se transformar o local. No entanto, na prática, e neste momento, nós não vemos isso a acontecer no país.

Participei num curso sobre os direitos humanos, na vertente da mulher. Por isso, penso que não vale a pena apostar só numa variante quando se trata de direitos como, por exemplo, os da mulher e defendê-los. É melhor lutarmos pelos direitos do Homem, dos animais e das plantas de forma integrada. Assim teríamos um mundo melhor – constituído por Homens, plantas e animais.

Há países em que a pessoa é encarcerada por cortar uma planta ou matar um animal. Para mim, nesses países, a qualidade de vida é melhor, porque os Homens circulam nos parques e, com medo de ser predados, os pombos, por exemplo, não os abandonam. É muito bom educar todas as pessoas à base da cultura da paz. Mais vale ter a cultura de paz, o amor e a harmonia do que gastar dinheiro e tempo lutando, de uma forma isolada, pelos direitos somente da criança, da mulher ou da pessoa idosa”. Diante de tudo isso, faz sentido que o concerto de Ras Haitrim tenha terminado com uma ordem evangélica: “Go and tell the world!”

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