O líder da Renamo, Afonso Dhlakama, manifestou na passada sexta-feira (23) a vontade de sair das matas de Gorongosa, na província de Sofala, onde supostamente se encontra, de modo a poder iniciar a pré-campanha eleitoral rumo ao escrutínio de 15 de Outubro, mas diz que tal não acontece porque continua cercado pelas Forças de Defesa e Segurança. “Eu gostaria até de sair hoje, mas estou trancado, cercado pelas tropas. Vou continuar a ter paciência como forma de evitar o pior. Mas eu gostaria, de facto, de fazer o é trabalho de pré-campanha. Ainda não sou candidato do partido que dirijo, mas sou líder. Tudo vai depender também da boa vontade da outra parte, neste caso o Governo”, afirmou.
Dhlakama diz que a sua saída de Gorongosa está condicionada ao acordo de cessar-fogo, cuja matéria está a ser debatida em sede de diálogo, no Centro de Conferências Joaquim Chissano, pelas delegações do Governo e da Renamo. Dhlakama expressou a sua vontade a um numeroso grupo de jornalistas que o ouviam via telefone, na sede do seu partido, em Maputo.
“Eu estou preocupado com a situação do país, sobretudo com as eleições de 15 de Outubro. Faltam poucos meses, os outros já estão a fazer pré-campanha e eu estou aqui nas matas”, afirmou o líder do maior força da oposição em Moçambique, lamentado o facto de os candidatos da Frelimo, Filipe Nyusi, e do MDM, Daviz Simango, estarem já em actividades de pré-campanha.
Logo após iniciar a sua intervenção, Afonso Dhlakama afirmou aos presentes o seguinte: “Eu quero sair daqui de Gorongosa, quero começar a andar. Quero sair e já demonstrei que tenho essa vontade de estar com a família e com vocês, amigos, mas o Governo continua a mandar as suas tropas para aqui, embora eu, Afonso Dhlakama, tenha mostrado boa vontade”. Para fundamentar a demonstração da sua “boa vontade”, recordou que de forma unilateral mandou cessar os ataques em todo o território moçambicano, contudo, o Governo continua a enviar tropas para o cercarem.
Segundo entende, essa postura do Executivo visa impedir-lhe de “começar a organizar-se como candidato do partido, embora ainda não tenha sido legitimado”. Para a sua saída das matas, o líder da “perdiz” quer que lhe seja garantida a retirada das tropas que o “cercam” em Gorongosa.
“Uma das garantias seria que hoje Guebuza demonstrasse boa vontade que eu tenho demonstrado e mandar retirar o Exército que está a cercar-me, para eu poder circular à vontade”, afirma, recordando que ele é um cidadão com o direito de votar e ser eleito.
Que paz quer Guebuza?
Afonso Dhlakama criticou ainda o Presidente da República, Armando Guebuza, por estar a mandar continuamente tropas para Gorongosa. Diz ele ter garantido aos observadores do diálogo político que há dias lhe pediram para que continuasse com esta “boa vontade” de manter o cessar- -fogo. “Apesar de a Frelimo estar a provocar, eu não quero e não vou atacar”.
“E eu disse sim (ao pedido dos observadores), até porque está a pesar-me a consciência, como chefe de família, ordenar de novo ataques, mesmo que sejam em defesa própria. Pesa-me muito,” assevera. Dhlakama diz que o PR está a enganar o povo dizendo que quer paz e não entende como é que este está em Presidência Aberta numa altura em que os moçambicanos clamam pela paz. O líder da Renamo questiona: “Que paz o Guebuza quer, quando o outro cessou-fogo e mesmo assim manda tropas para cercar Dhlakama e ele está a passear a fazer Presidência Aberta?
Não queremos que cada partido tenha forças armadas
Sobre a exigência da paridade nas Forças de Defesa e Segurança, Dhlakama reiterou que o princípio está previsto no Acordo Geral de Paz (AGP) assinado em Roma, do qual o actual Presidente da República foi um dos negociadores. “Está escrito (no AGP) que a Renamo tem direito a 50 porcento e a Frelimo 50 porcento nas Forças Armadas. Hoje já não querem discutir o acordo, mas querem que a Renamo entregue as armas. Como é que o Dhlakama vai entregar as armas da segurança que o protege e do partido às forças do outro partido? Temos que criar um exército técnico-profissional. Não queremos que cada partido tenha as suas forças armadas”.
“A Renamo não está a exigir uma coisa nova, apenas a implementação do AGP testemunhado pela comunidade internacional. Se não querem unificar as tropas que o digam à comunidade nacional e internacional para que eu possa reorganizar o meu exército”.
Dhlakama diz estar bem de saúde
O líder da perdiz garantiu à Imprensa que ele está bem de saúde. Diz que os rumores de que está com a saúde fragilizada é invenção dos membros da Frelimo que temem que ele concorra às eleições. “Estou bom, bom mesmo. Só o cabelo está branco. Não estou doente, são os irmãos de Frelimo porque têm medo de o Dhlakama concorrer com eles, até dizem que apanhei trombose, que estou doente, morri, estou no Quénia, na América”. Recorde-se que Dhlakama apareceu em público há cerca de duas semanas na Serra de Gorongosa para se recensear, mas mesmo depois disso o seu paradeiro continua desconhecido.
Falta coerência no seio da Renamo
A forma como a informação tem sido gerida na Renamo e difundida aos meios de comunicação social revela que há desorganização e falta de coordenação entre as estruturas daquela formação política. É que enquanto diversos quadros seniores da Renamo insistem em dizer que Afonso Dhlakama, líder do partido, é o seu candidato às eleições gerais do próximo dia 15 de Outubro, este nega e afirma que, se o é, ainda não foi legitimado. Dhlakama disse, no dia em que se recenseou, no distrito de Gorongosa, na província de Sofala, que ainda não era candidato e que os órgãos haviam de se reunir para legitimar a sua candidatura ou indicar uma outra pessoa, mais jovem.
Só que, estranhamente, Manuel Bissopo, secretário-geral, tinha dito no ano passado, durante uma visita à província de Nampula, que Dhlakama era o candidato “natural” da Renamo, ou seja, que era de consenso entre os membros do partido e que não havia necessidade de se legitimar a escolha. Mas esta informação viria a ser refutada por Dhlakama, talvez na tentativa de fazer jus ao princípio defendido pelo partido que dirige, nomeadamente o da democracia, que pressupõe que as pessoas devem ser escolhidas através do voto e não indicadas.
Já este ano, depois das declarações de Afonso Dhlakama, Bissopo veio a público dizer que o candidato do partido seria conhecido até meados do mês de Junho quando os órgãos do partido se reunirem. Dias depois, o partido queixou-se do facto de o Ministério da Justiça, através da Direcção Nacional dos Registos e Notariado, obrigar que o reconhecimento das assinaturas dos apoiantes dos candidatos a Presidente da República seja por presença e não por semelhança.
Este facto faz pressupor que a Renamo já estava a recolher assinaturas para suportar a candidatura de Afonso Dhlakama, antes mesmo de os seus órgãos se reunirem para o legitimar como tal. Entretanto, as dúvidas viram a ser dissipadas quando começaram a circular as fichas de proponentes, com a imagem do líder da Renamo, que ainda se encontra em “parte incerta”, deixando cair por terra a “peça teatral” que estava a ser ensaiada para ludibriar a opinião pública.
Estas situações confundem, até certo ponto, os eleitores, com destaque para os membros e simpatizantes desta formação política. Espera-se que a Renamo diga onde e quando reuniu os seus órgãos, tal como prometera, e apresente os resultados das eleições que culminaram com a escolha do seu líder, Afonso Dhlakama, como candidato a Presidente da República. Ainda há tempo para tal!