Os números não deixam mentir. Há pelo menos 250 mil pessoas a passar fome em Moçambique. Os dados avançados pelo Relatório de Monitoria da Situação de Segurança Alimentar e Nutricional (RMSSAN), do Ministério da Agricultura, poderão estar muito aquém da realidade.
Contudo, dados estatísticos escasseiam. Ainda assim, organizações humanitárias que trabalham no país falam de mais de um milhão de pessoas em situação de insegurança alimentar. Por outro lado, a fome não é determinada pela falta de comida, mas por políticas ineficazes de destruição daquilo que se produz.
Por outro lado, há registos do Programa Mundial de Alimentação, PMA, de crianças que vivem nas zonas produtivas e que se apresentam malnutridas. No entender da directora-geral do PMA, Lola Castro, esse quadro revela “uma contradição. Por isso, estamos a trabalhar na área da educação, água e saneamento e na área dos produtos alimentares complementares para melhorar a situação.”
Lola Castro sugere que se reforce a rede comercial nas zonas produtivas, no norte e centro de Moçambique.
O fenómeno da fome em Moçambique não leva à subnutrição evidente e nem mata “de um dia para o outro”, mas tem consequências graves a longo prazo, afirma Manuel Macamo, professor universitário, que calcula que entre 35 a 40 porcento das famílias que vivem em zonas de risco possam ter “uma despesa com alimentação inferior àquela que se estima necessária para satisfazer as suas necessidades alimentares básicas”.
Refira-se, contudo, que os distritos mais críticos em termos de insegurança alimentar são: Maputo (Magude, Moamba, Namaacha e Boane), Gaza (Chigubo e Chicualacula), Inhambane (Funhalouro, Panda e Mabote), Sofala (Búzi, Machanga, Muanza, Nhamatanda, Chemba, e Gorongosa) e Tete (Mutarara, Changara, CahoraBassa, Chiúta, Moatize e Magoe).
Efectivamente, os baixos níveis da resiliência dos agregados familiares, devido à pobreza causada por vários factores, tais como a imprevisibilidade dos rendimentos e o esgotamento das reservas alimentares e de outros bens produtivos, nos últimos três anos e com condições de períodos de seca, provocaram baixos níveis de poder de compra o que limita o acesso económico aos alimentos, especialmente provenientes de mercados.
De acordo com o RMSSAN, a situação de vulnerabilidade está “a ser agravada pelo impacto negativo das condições de seca moderada, que afecta especialmente a produção de alimentos e outras fontes de rendimento das famílias” tais como o “autoemprego nas zonas áridas e semiáridas do país”.
Refira-se, contudo, que o Índice de Satisfação das Necessidades Hídricas (WRSI), actualizado em Março de 2012, deu a indicação de que a seca de meia estação que afectou a zonas sul e centro de Moçambique poderia provocar quebras nas colheitas abaixo da média nacional. Contudo, a zona norte do país registou um desempenho relativamente satisfatório das culturas. Porém, teve um desempenho entre médio e medíocre nas áreas semi-áridas na zona centro.
A dureza da seca pode, às vezes, dar a impressão de que a tragédia está em toda a parte. Mas é falso imaginar que a totalidade dos cidadãos que vive em áreas afectadas pela seca passa fome. Nas áreas atingidas vivem 650 mil pessoas. Desse total, 253.000 moram nas zonas mais críticas. Estima-se que nesse grupo haja perto de 100 mil indefesos em épocas em que a chuva escasseia como esta.
A voz do povo
“Mais péssimo do que nunca…Compras nem falo, procuro sobreviver. Ou seja, já não interessa muito o tipo de alimento basta passar da boca”, António Matola
“Não posso expressar a minha opinião, porque em Moçambique só o Presidente da República sabe como as pessoas vivem. O que ele diz encerra toda a discussão. Não se leva em conta as opiniões da pessoas. Então, vou falar para quê? Já se falou muito e nada muda. O meu filho está a trabalhar. O meu neto também. Eu sou aposentado, mas aquele salário que o Governo moçambicano paga é muito insuficiente. Não há emprego. As coisas são caras. Os preços estão-se a agravar. Sustentar o ensino das crianças, comprar vestes, cadernos, pagar “chapa” todos os dias é muito oneroso”, Narciso Tchecane, residente no bairro da Malhangalene, aposentado
“No nosso país, o custo de vida é muito elevado. Eu sou um pai de dois filhos e com os 3.500 meticais que recebo mensalmente não consigo fazer nada. Este país está péssimo. A minha sorte é que não vivo numa casa arrendada. Imagina se eu, com o pouco salário que ganho, tivesse de tirar uma parte para arrendar a casa. Este país ficou estragado desde 2009, quando o actual Presidente da República ascendeu ao poder.
Tudo mudou, o custo dos transporte foi-se agravando ano apôs ano; a qualidade do ensino reduziu drasticamente”, Jaime Sithoe, residente no bairro de Triunfo, bar man Eusébio Paulino, 42 anos de idade, residente do bairro de Mutauanha, tem um agregado familiar composto por nove pessoas.
“O meu modo de vida é caracterizado por sacrifícios, a única actividade que desenvolvo é a venda de casacos usados nas ruas da cidade de Nampula. Faço-o para evitar roubar aos outros que trabalham para ganhar o seu pão de cada dia. Compro cada artigo por 100 ou 150 meticais. Depois de lavados e engomados consigo vender por 180 ou 200 meticais. Com o valor compro alimentos para os meus filhos que abandonaram o processo de ensino e aprendizagem por insuficiência de recursos financeiros.
Tenho lutado, diariamente, para sobreviver visto que sou um cidadão desempregado e sem meios de sobrevivência para o sustento da minha família. Sofro barreiras dos dirigentes do Conselho Municipal para ter acesso ao fundo de Desenvolvimento Urbano disponibilizado pelo Governo central para apoiar as iniciativas de geração de renda. Nessas condições considero que o Estado da Nação é mau.
“Será que é BOM um Estado onde o funcionário recebe 2.500 MT, e tem de pagar (arroz, óleo, açúcar, escola dos filhos, a camioneta que lhe leva ao serviço, entre outras coisas), este mesmo funcionário está proibido de ficar doente, pois dizem estar coberto por um plano de saúde que atende muito mal (quando atende) e nunca tem medicamentos, e é obrigado a recorrer ao sector privado para pagar os serviços com os mesmos 2.500 MT que acabaram antes mesmo de receber com pagamento de Cotas que, sem o seu consentimento, lhe foram descontadas?”, Anónimo
“Não está bem, mas estamos a caminhar para lá chegar. Se pensarem um pouco verão que estamos muito melhor do que nos anos passados. Hoje já não faço fila para comprar pão, posso comer o que eu quiser e a qualquer hora. Naqueles tempos só comia ovo ou carne quem tivesse costas quentes. Por isso, acho que estamos a evoluir, pouco a pouco, mas chegamos lá”, Alberto Chongo
“O Estado da Nação é péssimo, 2012 foi o ano em que muitos produtos de primeira necessidade registaram uma grande subida, preço e casa subiram, a auto-estima subiu menos e os salários não subiram. Este ano Moçambique registou uma crise interna, por parte da família moçambicana”, Anónimo.
O Estado da Nação foi uma lástima em 2012, o índice de desemprego aumentou a passos galopantes e, como consequência disso, mais famílias tornaram-se pobres, tiveram menos acesso a serviços públicos, tais como saúde e educação. Os megaprojectos nada trouxeram para o povo moçambicano. Enfim, o Estado da Nação foi péssimo”, Manuel Premo
“Na minha óptica, o Estado da Nação não é bom, ressalto que temos um bom ambiente económico, porque há muitas oportunidades a surgir no país, mas o ambiente económico estável que se verifica no momento não tem muitas chances de prevalecer com as ambições de alguns líderes que, a pretexto da democracia, querem dividir e tomar a sua parte de um povo que é, pela sua humildade, tratado como gado” Nelly-ZI
“A meu ver a gestão país está péssima. As disparidades entre ricos e pobres está cada vez mais acentuada. As grandes cidades estão com problemas sérios de transporte e saneamento. Há problemas de inclusão social. Como jovem e funcionário público não vejo, por parte do Governo, políticas (habitação, saúde, transportes, etc.) capazes de me agradar/satisfazer…Sei que se pode fazer mais e melhor, apostem na fiscalização, cobrem resultados e nomeiem pessoa pela competência e não pela cor partidária ou afinidade de qualquer tipo. Quem não tem capacidades que seja substituído e não protegido ou apadrinhado”, Helsio Azevedo