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Cortes de energia em Maputo: solução só dentro de seis meses

Os clientes da Electricidade de Moçambique devem processá-la por violar a Constituição e a Lei de Defesa do Consumidor

Desde que se registou um incêndio na subestação da Electricidade de Moçambique (EDM), localizada no Campus Universitário da Universidade Eduardo Mondlane, alguns bairros desta urbe debatem-se com cortes sistemáticos de corrente eléctrica.

Na semana passada, os bairros Polana Caniço, Alto-Maé, e não só, foram parcialmente afectados pelo corte da corrente eléctrica e ficaram pouco mais de dois dias sem energia. O facto aconteceu por volta das 21 horas da quinta-feira (22), deixando vários lares às escuras.

Em seguida, como era de se esperar, os moradores tentaram, sem sucesso, ligar para a Linha de Atendimento ao Cliente da EDM e para o Provedor do Cliente, uma figura recentemente criada para defender os interesses dos clientes.

Foram atendidos quando eram sensivelmente 23 horas. Como sempre, o agente que lhes atendeu disse que os técnicos se fariam ao local da ocorrência o mais rápido possível, o que não aconteceu. Só apareceram no dia seguinte (sexta-feira), mas não conseguiram resolver o problema.

Curiosamente, estes cortes aconteceram numa altura em que os engenheiros e técnicos da EDM provenientes de todo o país se reuniam no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano, onde decorria a reunião de balanço das actividades referentes ao ano passado. No referido encontro, o novo presidente do Conselho de Administração da EDM, Augusto de Sousa Fernando, disse que a situação iria prevalecer até os próximos seis meses.

“O incêndio que se verificou há dias na subestação número 5 na cidade de Maputo está a criar sérios problemas no abastecimento da corrente eléctrica. A iluminação dos bairros afectados está a ser feita com recurso a meios alternativos e provisórios, enquanto não se fizer a reposição definitiva do material danificado”, afirma para depois acrescentar que este problema irá provocar cortes e oscilações constantes da corrente eléctrica.

O público revoltado com a EDM

Os consumidores, sobretudo os afectados pelos cortes sistemáticos, pouco ou nada têm a ver com as causas que estiveram por detrás da explosão da subestação em causa. A sua maior preocupação tem a ver com o impacto que isso pode ter nas suas vidas, pois não raras vezes têm visto os seus electrodomésticos danificados, e os produtos a apodrecerem porque o congelador não funciona.

“Na semana passada e depois daquele corte de dois dias, todos os produtos alimentares que estavam na geleira e no congelador apodreceram. Eu faço o rancho uma vez por mês. Compro carne, peixe, frangos e não só. Perdi tudo”, conta Nádia da Silva, de 24 anos de idade e moradora do bairro do Alto-Maé.

“Quando ligávamos não atendiam, só depois de aproximadamente três horas é que fomos atendidos mas o agente com quem falámos despachou-nos. Disse que os técnicos chegariam ao local rapidamente, o que não passou de uma mentira. Aliás, uma equipa técnica composta por cinco agentes fez-se ao local na noite do dia seguinte e nem sequer trazia lanternas ou candeeiros. Tivemos de usar as nossas viaturas para poder iluminar a área, o que prova que eles são desorganizados”, acrescenta.

Esta situação leva a que os consumidores desliguem os electrodomésticos durante o período da noite por temerem possíveis cortes e, consequentemente, prejuízos. As interrupções, cujas origens ainda não foram explicadas publicamente pela empresa Electricidade de Moçambique (EDM), registam- se por volta das 18.30 horas e prolongam-se, de forma faseada, até cerca das 23 horas, sendo que, nalguns casos, chegam a durar dois ou mais dias.

No bairro do Alto-Maé, por exemplo, os residentes afirmam que, depois de terem ficado mais de 48 horas às escuras, na segunda-feira foram registados mais de três cortes, para além das oscilações que se prolongaram até à madrugada. Já nos dias 22 e 24, a situação foi pior porque os cortes começaram muito cedo, cerca das 17 horas.

Nas vésperas um abaixo-assinado

Dada a gravidade da situação, que já é recorrente, alguns clientes equacionam a possibilidade de fazer um abaixo-assinado para manifestarem o seu desapontamento com a alegada péssima qualidade dos serviços prestados pela EDM.

“Não passa um dia sem que se registe um corte de energia aqui e isso acontece durante a noite. Vezes há em que apenas um quarteirão, dentro do bairro, fica horas e horas às escuras enquanto outros têm energia. Isto já está a passar dos limites. São electrodomésticos que acabam por queimar por causa disto e eles nunca nos indemnizam”, disse Zacarias Matavele.

Crateras que podem degenerar em desgraças

Ao longo da Avenida Guerra Popular, próximo ao mercado informal Estrela Vermelha, os técnicos da Electricidade de Moçambique abriram dois enormes buracos no passeio onde procuravam identificar uma avaria nos cabos subterrâneos.

No interior dessas crateras vêem-se cabos eléctricos que semeiam um clima de intranquilidade na via pública. Alguns fios não têm revestimento plástico, criando uma situação de perigo para os transeuntes (as crianças em particular). O risco de electrocussão é iminente.

Solução definitiva dentro de seis meses

Entretanto, a Electricidade de Moçambique, através do seu porta-voz, Celestino Sitoe, disse que, para fazer face a esta situação, “estamos a accionar as medidas intermédias que compreendem a colocação de painéis de distribuição em forma de contentor, o que vai contribuir para a minimização dos cortes e oscilações constantes de energia. A medida definitiva só terá lugar dentro de seis meses, e vai compreender a reposição do transformador queimado e a instalação de um novo quadro de painéis”.

Celestino Sitoe assegurou que já foi constituída uma comissão técnica para apurar os reais motivos que estiveram na origem do incêndio, cujos prejuízos directos rondam os três milhões de dólares americanos.

CNELEC e Provedor do cliente para nada

O Conselho Nacional de Electricidade (CNELEC) não parece estar a desempenhar o papel para o qual foi criado. Este não passa de um órgão quase inexistente. Os consumidores da energia eléctrica, que deviam ser os primeiros beneficiários dos seus serviços, não o conhecem. Aliás, nunca ouviram falar de tal instituição.

Entretanto, são muitas as correntes de opinião que apontam para o facto de que a Electricidade de Moçambique tem sido “juíza em causa própria” por usar estar a usar os seus recursos (humanos, técnicos e materiais) para o funcionamento do Conselho Nacional de Electricidade, que devia ser independente e imparcial no exercício das suas actividades.

Jeremias Pauzene, residente na cidade de Maputo, afirma que as consultas públicas que o CNELEC se propôs desde cedo fazer deviam ocorrer nos bairros suburbanos, pois é onde vive a esmagadora maioria da população, por sinal a maior vítima da fraca qualidade e dos cortes sistemáticos da corrente eléctrica.

“O povo devia unir-se contra a hipocrisia da EDM. Ela é que define em que circunstâncias os consumidores devem ser indemnizados. Não faz sentido que a causa da danificação de aparelhos electrodomésticos se esgote na oscilação da corrente eléctrica, como eles afirmam”.

Impossível recorrer a um órgão que não existe!

O CNELEC é um órgão criado pelo Estado para defender os interesses dos consumidores mas continua, pelo menos para o cidadão comum, um segredo fechado a sete chaves.

A Electricidade de Moçambique (EDM), entidade pública responsável pelo fornecimento da corrente eléctrica, é acusada de pouco ou nada fazer para reparar os danos e indemnizar os lesados, apesar de Celestino Sitoe, seu porta-voz, contrapor afirmando que para além de acusar é “imperativo apresentar provas”.

“A EDM somente indemniza em caso de danos que ocorrem por acidente ou quando a empresa é culpada. Caso as pessoas não se sintam satisfeitas com a decisão tomada pela nossa empresa, devem recorrer ao CNELEC”, acrescenta Sitoe. No entanto, dirigir-se ao CNELEC é uma ideia pouco viável. Ela não se faz sentir no seio do povo (leia- -se, consumidores).

O CNELEC significa Conselho Nacional de Electricidade. Segundo a Lei 21/97 de 1 de Outubro, (Lei de Electricidade), é um órgão com uma função consultiva, de defesa do interesse público, e serve também como um espaço de auscultação da opinião pública sobre assuntos relevantes da Política Nacional de Energia Eléctrica. Foi criado em 1997 e estabelecido em 2008.

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