A vida nas zonas rurais deixou de ser a mesma. A indústria de caju está a transformar a estrutura económica e de saúde das pequenas comunidades rurais do norte de Moçambique, conclui o estudo denominado “Fábricas no Campo: Transformação Rural e Organização do Trabalho no Triângulo do Caju em Moçambique”.
Dados existentes dão conta de que, em 2007, as fábricas e o sector informal moçambicano combinados processaram mais de 60 mil toneladas de castanha de caju, 32 mil de castanha bruta, tendo o valor total das exportações ultrapassado 40 milhões de dólares norte-americanos. Este crescimento traduziu-se também na melhoria de vida dos residentes das zonais rurais produtoras de castanha de caju.
Ou seja, o renascimento da fábrica e o advento de um “novo modelo” de processamento daquele produto, veio insuflar um “novo fôlego” nas relações sociais e económicas em algumas comunidades rurais a norte do país, uma vez que, desde 2002, as fábricas de pequena escala e mão-de-obra intensiva assumiram uma presença crescente na paisagem rural da província de Nampula.
Actualmente, as comunidades têm vindo a testemunhar a criação de emprego. A título de exemplo, a aldeia de Namige registou um crescimento rápido e diferenciado desde que foi implantada uma unidade industrial de castanha de caju. Algumas mudanças ocorridas naquela região verificam-se no número de vendedores no mercado que ultrapassou o triplo, no funcionamento de uma estância hoteleira de oito quartos, nos pequenos estabelecimentos comerciais e na criação espaços de diversão.
O processo de crescimento económico está a ser conduzido pelos empresários, agricultores comerciais, pequenos proprietários, trabalhadores assalariados, trabalhadores de machambas e uma classe de vendedores emergentes. Em toda a província de Nampula, dois porcento da população tem trabalho em regime de assalariado enquanto grande parte se dedica à agricultura ou à pesca.
A pesquisa realizada no Triângulo da Castanha de Caju pelo especialista em assuntos de sistemas de trabalho, Brad Paul, e apresentado no Simpósio sobre Ergonomia em Moçambique organizado pela USAID, revela que o “efeito duplo da indústria de caju de impulsionar a agricultura comercial e as crescentes oportunidades do trabalho assalariado promete uma rota alternativa para atacar a pobreza”.
Refira-se que o simpósio enquadra-se no âmbito do Programa AgriFUTURO lançado em Maio transacto e conta com um financiamento do Governo dos Estados Unidos da América, de cerca de 25 milhões de dólares, com o intuito de promover mais competitividade, prosperidade e comércio internacional sustentável ao sector privado agrícola em Moçambique.
Triângulo da Castanha de Caju
O Triângulo da Castanha de Caju de Nampula faz fronteira com o distrito de Murrupula a oeste, Mogincual a leste, Moma a norte e Monapo a sul. Segundo o estudo, dentro das demarcações daquelas fronteiras imperfeitas onde existem cerca de 18 milhões de cajueiros, plantados e colhidos por agricultores comerciais e proprietários de pequena escala, a vida dos residentes está a mudar.
Existem naquele espaço 12 unidades de processamento, empregando um pouco mais de 5 mil trabalhadores; diversas unidades de pequena escala; viveiros; pequenas lojas de máquinas; e produtores familiares que produzem, descascam e vendem os produtos ao longo das ruas.
A pesquisa mostra também que as comunidades do Triângulo da Castanha de Caju organizam a produção económica de acordo com o ritmo de trabalho da agricultura. Além disso, o trabalho físico e a distribuição não são definidos pelas relações de mercado, pelo contrário, encontra-se em contraste com os impulsos da venda da sua força de trabalho à fábrica.
Quanto às obrigações agrícolas, na época de sementeira e colheita, são responsáveis por quase 30 porcento da taxa de absentismo na indústria. Ainda de acordo com o estudo, entre os trabalhadores existe uma relação complexa e geralmente conflituosa com a indústria, mas a grande maioria deles afirma que a vida está melhor desde a chegada das fábricas, citando a melhoria de infra-estruturas habitacionais e as oportunidades económicas.
De camponeses a trabalhadores
Das entrevistas feitas aos trabalhadores, agricultores, comerciantes e membros da comunidade, o trabalho de pesquisa constata que as pessoas procuram emprego nas fábricas de castanha de caju para custear as despesas básicas e imediatas, mas, à medida que a ocupação se acumula e os traços do trabalho assalariado se tornam mais comuns, vêem-se como parte integrante do sistema da fábrica.
“Os camponeses estão a tornar-se trabalhadores e as comunidades estão a tornar-se vilas de mercado”, lê-se no estudo. No Triângulo da Castanha de Caju, segundo o estudo, existem pelo menos cinco categorias de produtores económicos que são fundamentais para explicar a transformação rural, nomeadamente agricultores comerciais, de subsistência, trabalhadores remunerados, trabalhadores agrícolas e por conta própria.
Dos trabalhadores assalariados inquiridos nas fábricas de processamento de Angoche, Namige e Meconta, apenas trinta e um porcento obtêm o seu rendimento exclusivamente do trabalho industrial. Um total de oitenta e três dos trabalhadores em Namige e Mogincual dedica-se à agricultura de subsistência, além de laborar na fábrica.