Um falso casamento ou 6.000 meticais (158 euros) por uma certidão é quanto custa aos ilegais adquirir a nacionalidade moçambicana na província de Manica, situação que está a deixar “perplexas” as autoridades policiais.
As jovens moçambicanas aceitam um “casamento instruído” com estrangeiros, na sua maioria imigrantes ilegais da África Central e dos Grandes Lagos, mas também asiáticos, em troca de casa ou de dinheiro.
O divórcio só acontece quando o homem adquire os “direitos”, que incluem Bilhete de Identidade e passaporte de Moçambique. “A minha filha casou três vezes (com um paquistanês e dois congoleses), não teve divórcios litigiosos e ganhou muitos bens”, como casa e viatura, contou à Agência Lusa uma dona de casa, que pediu anonimato.
Os casamentos não se realizam com luxo e pormenor, como tradicionalmente acontece noutros países. Ao cartório, só vão testemunhas e padrinhos, que geralmente pertencem ao círculo. Dois estrangeiros e dois moçambicanos estão a responder na justiça, sob acusação de falsificarem documentos de identificação.
“A circulação de estrangeiros com documentos adquiridos de forma fraudulenta está a preocupar a província. Mesmo os serviços de migração reclamam casos de cidadãos que nem falam português, mas com nacionalidade moçambicana, e que vão pedir passaporte”, disse à Lusa Firmino Hemilio, porta-voz da Procuradoria provincial de Manica.
A venda de cédulas pessoais, a porta para aquisição de todos os outros títulos, é um negócio que assenta em documentos desviados do circuito oficial, envolvendo os secretários dos bairros, que emitem declaração de residência, e funcionários dos registos e notariados, e é assegurado por jovens que actuam com discrição.
“Tramitámos dois processos este ano sobre falsificação de documentos. Um funcionário da Direcção Provincial da Justiça, ligado aos registos e notariados, foi apanhado em flagrante na posse de enorme quantidade de cédulas. Os assentos das cédulas não coincidiam com o que estava no livro de registo”, explicou Hemilio.
As cédulas são geralmente emitidas como sendo da segunda via, nos distritos distantes de Sussundenga, Gôndola, Machaze e Manica, mas também na capital da província, Chimoio.
O contacto com os potenciais clientes para a aquisição é breve e muito discreto. Depois de estabelecido o contacto, a troca do dinheiro pela cédula exige que o cliente forneça o seu contacto de telemóvel — o contrário não é válido — e aguarde a chamada do fornecedor, que muitas vezes efectua com números diferentes e ou a partir de uma cabine pública.
“De facto é um caso complexo. Nas nossas esquadras, temos registados casos de circulação de documentos falsos e em Maio detivemos dois estrangeiros e levantámos os processos-crime para seguirem os trâmites legais”, disse à Lusa Belmiro Mutadiua, portavoz do Comando da Polícia de Manica.
Os estrangeiros geralmente adquirem a nacionalidade para procurar emprego, desenvolver comércio e ou “abrir” portas que lhes permitam residir de forma legal nos países vizinhos como o Zimbabwe e África do Sul, a economia mais próspera do continente.
“Podes arranjar-me um emprego se eu conseguir arranjar documentos moçambicanos? Sou bom em informática”, indagou em conversa num café em Chimoio um cidadão que se identificou como sendo somali.