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Arrogância da Frelimo precipitou o país para a (actual) violência armada

Arrogância da Frelimo precipitou o país para a (actual) violência armada

O antigo membro da Renamo e actual presidente do Partido para a Paz, Democracia e Desenvolvimento, Raul Domingos, considera que a aplicação precária do Acordo Geral de Paz, dos quais foi negociador, e a partidarização do Estado por parte da Frelimo são duas das causas (senão as principais) da actual tensão político-militar que se vive no país.

Segumdo Raul Domingos, que chefiou a delegação da Renamo às negociações com o Governo, que culminaram com a assinatura do Acordo Geral de Paz, em 1992, na cidade de Roma, Itália, ficou acordado que as Forças de Defesa e Segurança seriam compostas por 30 mil homens, provenientes de ambas as partes, mas isso não aconteceu.

Embora a Renamo tenha integrado os seus homens nas fileiras das Forças de Defesa e Segurança, com o passar do tempo, estes passaram à reforma compulsivamente, principalmente os que ocupavam cargos de chefia. “A reforma compulsiva dos homens da Renamo, com destaque para os oficiais superiores das Forças Armadas de Defesa de Moçambique, provocou a guerra que hoje vivemos no país porque muitos deles regressaram às antigas bases”, afirma.

Por outro lado, Raul Domingos afirma que o Governo e a Renamo nunca estiveram em igualdade numérica no que diz respeito à composição das Forças de Defesa e Segurança, o que constitui o primeiro atropelo ao AGP. “Ficou acordado que as FDS deviam ser compostas por 30 mil homens e que cada uma das partes (Governo e Renamo) devia indicar metade, ou seja, 15 mil”. “Estou convencido de que as condições de paz, negociadas em Roma, não são as que se vivem hoje no país. A precária implementação dos termos acordados precipitou o país para um novo clima de violência armada em que este se encontra”, entende Raul Domingos.

“Nunca tivemos eleições transparentes”

Chamado a comentar à volta das últimas eleições autárquicas, marcadas por diversas irregularidades, que ditaram a repetição da votação nos municípios de Nampula e Gúruè, Raul Domingos foi peremptório na sua resposta e disse que as mesmas foram tudo, menos transparentes.

“A Comissão Nacional de Eleições e o Secretariado Técnico da Administração Eleitoral estão partidarizados, por isso nunca tivemos eleições transparentes, livres e justas, como preconiza o slogan, ao qual estes dois órgãos não fazem jus. As últimas eleições autárquicas foram prova disso”, acusa. Entretanto, questionado sobre se se iria candidatar a Presidente da República nas próximas eleições gerais, marcadas para o dia 15 de Outubro, Domingos escusou- se a responder, limitando-se apenas a afirmar que quando chegar a altura dirá se o seu partido irá ou não participar no pleito.

Sobre a condecoração

No dia 3 de Fevereiro, Dia dos Heróis Moçambicanos, Raul Domingos recusou-se a receber a condecoração atribuída pelo Estado moçambicano porque, na sua opinião, tal devia ser feito em momentos de paz e harmonia, e não de guerra. “Se eu aceitasse, estaria a festejar as desgraças dos moçambicanos que sofrem, directa ou indirectamente, os efeitos desta guerra evitável”.

Raul Domingos entende que “as circunstâncias em que ocorreu a galardoação, que se caracterizam pelo alto nível de intolerância, desigualdades, perseguições políticas, incluindo prisões e assassinatos de membros da oposição, o sofrimento em que vivem os moçambicanos nos campos dos deslocados, aliadas ao sangue derramado dos inocentes e ao luto que enche muitas famílias de dor, medo, incerteza e desespero, nomeadamente em Nampula, Nhamatanda, Homoíne, Funhalouro e outros locais, afectaram a minha consciência e constituíram determinantes que ditaram a minha decisão de não aceitar receber a condecoração”.

Por esta razão, o presidente do PDD é de opinião de que o Governo devia estar mais preocupado em restabelecer a paz no país e não em condecorações. “A condecoração de cidadãos que se notabilizaram pela paz deve ser feita, em regra, em momentos de paz e na data de celebração da Paz e Reconciliação Nacional, o dia 4 de Outubro”. Refira-se que Raul Domingos ia receber a distinção “Ordem 4 de Outubro do Primeiro Grau”.

Partidarização do Estado

Outra violação ao Acordo Geral de Paz, segundo o antigo chefe das Relações Exteriores da Renamo, que depois viria a fundar o PDD, tem a ver com partidarização do Estado, por parte do partido no poder, a Frelimo. No seu entender, o Estado deve ser neutro no tratamento dos cidadãos, o que não acontece no país, daí que os moçambicanos sempre se queixa(ra) m das desigualdades e falta de oportunidades. “Há moçambicanos que confundem o Estado com a Frelimo. Há células do partido Frelimo em instituições do Estado”.

“Neste momento que estamos a falar, todos os funcionários do Estado são membros do partido no poder, e aqueles que não aceitam essa condição correm o risco de perder os seus cargos de chefia ou de serem excluídos da promoção ou progressão”, assevera. Recorde-se que a despartidarização do Estado é um dos pontos (o segundo) da agenda do diálogo entre o Governo e a Renamo.

 

(Alguns) Casos de cidadãos que foram vítimas da partidarização do Estado

Ismael Mussa

Ismael Mussa foi exonerado do cargo de director dos Serviços Sociais da Universidade Eduardo Mondlane, em Fevereiro de 2005, depois de ter sido eleito deputado da Assembleia da República pela Renamo.

Eduardo Namburete

No mesmo período, foi afastado Eduardo Namburete, que ocupava o cargo de director da Escola de Comunicação e Artes da mesma instituição. À semelhança de Ismael Mussa, Namburete acabava de se tornar deputado, pela Renamo. Aliás, Namburete tinha sido, antes, afastado da função de chefe do Gabinete de Imprensa da Reitoria daquela universidade quando foi nomeado chefe do gabinete eleitoral da Renamo durante as eleições gerais de 2004.

Benjamim Pequenino

Já em 2006, o Conselho de Ministros exonerou do cargo de presidente do Conselho de Administração da empresa pública Correios de Moçambique Benjamim Pequenino, membro da Renamo, que teria sido nomeado no último mandato de Joaquim Chissano. Embora fosse da oposição, Pequenino era e ainda é conhecido pela sua capacidade técnica e competência como gestor.

Candidatos do MDM

Inhambane

Fernando Nhaca, que foi candidato do Movimento Democrático de Moçambique a edil da cidade de Inhambane, viveu três anos sem salário devido às suas “preferências políticas”.

Nhaca é professor de Desenho e quando, em 2009, se filiou ao MDM foi transferido da cidade de Inhambane para o distrito de Funhalouro. “O estranho, no meio desta história, é que fui transferido para o distrito de Funhalouro como consequência de uma medida disciplinar. O que é, no mínimo espantoso, num país em que a Constituição da República permite que eu tenha uma escolha partidária pessoal”.

O mais grave, contudo, nem foi a transferência em si, “mas o facto de a mesma ter sido passada para leccionar numa escola fantasma (que não existe)”. Sem contar que “os alunos da 10ª, 11ª e 12ª classe, da Escola Secundária Emília Daússe, ficaram privados de professor, sem aulas de desenho, porque eu era a única pessoa qualificada”.

Mocuba

O governo do distrito de Mocuba, na província da Zambézia, através da respectiva administradora, emitiu uma carta de rescisão de contrato de trabalho com Fernando Pequenino, candidato a edil de Mocuba pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM) e derrotado nas últimas eleições municipais. Pequenino exercia as funções de docente da cadeira de História na escola secundária local desde 2002 e não foram apresentadas as razões da sua demissão.

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