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Armas que matam rinocerontes na África do Sul são compradas em Maputo com conivência de funcionários do Governo de Moçambique

Armas que matam rinocerontes na África do Sul são compradas em Maputo com conivência de funcionários do Governo de Moçambique

Armas de grande calibre, fabricadas na República Checa, usadas por caçadores furtivos de rinocerontes na África do Sul são adquiridas em lojas de caça em Maputo com a conivência de funcionários de alto escalão nos ministérios do Interior, Turismo e Agricultura. Uma das empresas de armas tem ligações com o Ministério da Defesa, com o SISE e ao filho do Presidente Filipe Nyusi.

Seguindo os números de série que identificam cada arma de fogo a organização não governamental Conflict Awareness Project (CAP no acrónimo em inglês) descobriu que armas de grande calibre que foram usadas na caça furtiva de rinocerontes no Parque Nacional Kruger, na África do Sul, foram fabricadas na República Checa por uma empresa denominada Ceská zbrojovka Uherský Brod (CZUB).

Embora a caça furtiva do rinoceronte tenha começado há mais de duas décadas a partir de 2010 aumentou significativamente. Até essa altura os animais eram mortos, para obterem o seu corno que é vendido na Ásia por 100 mil Dólares o quilograma, por armas adquiridas junto de elementos corruptos das forças de segurança da África do Sul e de Moçambique.

Após anos com registo de algumas dezenas de animais assassinados em 2010 as autoridades registaram 146 rinocerontes mortos. No ano seguinte foram 252, em 2012 foram abatidos 425, em 2013 o número subiu para 606 e em 2014 foram caçados ilegalmente 827 rinocerontes no Parque Nacional Kruger.

Autópsias aos rinocerontes abatidos mostraram que quase 90 por cento haviam sido vítimas de tiros disparados por carabinas de calibre 375 e 458. Nos anos anteriores, enquanto usaram armas AK-47, os furtivos tinham de disparar várias vezes para matar o animal, com armas de calibre 375 e 458 passaram a precisar de apenas um tiro certeiro que podia ser abafado com um silenciador, não chamando atenção das autoridades.

Investigações subsequentes determinaram que as armas de grande calibre que estavam a ser usadas pelos caçadores furtivos pertenciam a marca CZUB, manufacturadas pelo maior produtor de armas da República Checa.

Rastreando cada uma das armas recuperadas após a matança de rinocerontes a CAP, numa investigação conduzida ao longo de 4 anos, em três continentes, descobriu que as mesmas chegavam aos caçados furtivos através de Moçambique.

À investigação da Conflict Awareness Project determinou, e a Ceská zbrojovka Uherský Brod confirmou, que centenas de carabinas de calibre 375 e 458 apreendidas na África do Sul, e identificadas pelos seus números de séries, haviam sido vendidas às empresas Cacicambria, Fabitrade, Fabicaça e ExploAfrica.

ExploAfrica, Ministério da Defesa e Nyusi

A ExploAfrica, que tem na Afrocaça a sua loja de venda de armas na Cidade de Maputo, é parte de uma rede de empresas de armamento e explosivos estabelecida em Portugal e com ramificações na Espanha, Angola, República Democrática do Congo e na Guiné. O líder da empresa é Nuno Miguel da Silva Vieira um cidadão de nacionalidade portuguesa que desde 2015 é também moçambicano.

Nuno Miguel da Silva Vieira e os negócios da sua família tem um passado “dúbio” segundo apurou a investigação da CAP: “Foram investigados pelas autoridades portuguesas e espanholas por relação com os explosivos usados em 2004 no atentado contra o metro da Cidade de Madrid onde morreram 190 pessoas”.

No nosso país este empresário tem relações comerciais com o Ministério da Defesa Nacional, é sócio da Monte Binga na Sociedade Distribuidora de Explosivos, e com os Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE), na Mudemol (Munições de Moçambique, Lda) onde é sócio da Gestão de Investimentos, Participações e Serviços, Limitada (GIPS) e da Monte Binga.

Nuno Miguel da Silva Vieira é ainda sócio de Jacinto Ferrão Filipe Nyusi, filho do Presidente de Moçambique e do partido Frelimo Filipe Jacinto Nyusi na The Gafe.

Por seu turno a Fabitrade e a Fabicaça são empresas de armamento e munições baseadas em Portugal, tem como proprietários os irmãos António José Fonseca Fabião e Maria Isabel da Fonseca de Jesus Fabião. Ambas empresas tem como parceiro comercial em Moçambique uma empresa identificada por Casa Fabião.

A Conflict Awareness Project descobriu que o principal cliente das carabinas de calibre 375 e 458 vendidas pelas empresas ExploAfrica e Casa Fabião são a empresa a Investcon, assim como o Ministério do Turismo de Moçambique.

Johan Stoltz, Eugénio Numaio e a escalada da matança de rinocerontes no Parque Kruger

A Investcon (também conhecida com Investicom) foi estabelecida em Moçambique no ano de 2006 pelos cidadãos sul-africanos Johan Rudolph Stoltz e Gabriel Petrus Stoltz, assim como o moçambicano Isaac Arnaldo Samuel. No entanto em 2007 este sócio moçambicano foi substituído por Eugénio Numaio, Governador da Província de Gaza durante dois mandatos e com passagem pela Assembleia da República na bancada do partido Frelimo.

Até ao surgimento da Investcon o abate de rinocerontes não passava da dezena no Parque Nacional Kruger. Mas em 2008 foram assassinados 36 animais, em 2009 mais 50.

Entretanto em 2010 a Investcon de Johan Rudolph Stoltz, Gabriel Petrus Stoltz e Eugénio Numaio adquiriu uma fazenda do bravio no Norte da Província de Gaza, na fronteira entre a África do Sul e o Zimbabwe, a Limnetzi. Virada para ricos caçadores dos Estados Unidos da América a publicidade da Limnetzi prometia caçadas de crocodilos, búfalos, elefantes e rinocerontes.

Nesse ano 146 rinocerontes foram mortos no Parque Nacional Kruger, em 2011 o número de animais assassinados para o corte do seu corno aumentou para 252 e em 2012 foram abatidos 425.

A Conflict Awareness Project descobriu que os números de série de centenas das armas de fabrico Checo recuperadas pelas autoridades de combate à caça furtiva na África do Sul apresentaram números de série sequenciais sugerindo que teriam sido adquiridas num mesmo carregamento.

A investigação apurou em 2013 a Investcon comprou 13 carabinas de calibre 375 e mais 21 de calibre 458, todas fabricadas pela CZUB, na Afrocaça. Nesse ano a matança ascendeu a 606 rinocerontes.

A CAP estabeleceu que no ano de 2014 a Investcon comprou mais 81 carabinas de calibre 375 e 458 fabricadas pela Ceská zbrojovka Uherský Brod, 64 a Casa Fabião e 17 a Afrocaça. A matança no Parque Nacional de Kruger chegou ais 827 rinocerontes.

A investigação da Conflict Awareness Project determinou com evidencias que pelo menos 113 carabinas calibre 375 e 458 da CZUB foram compradas pela empresa de Johan Rudolph Stoltz, Gabriel Petrus Stoltz e Eugénio Numaio na Afrocaça e na Casa Fabião entre 2013 e 2015. E o assassínio de rinocerontes não parou desde então.

PGR tem toda investigação mas não age contra os chefões da caça ilegal

Importa salientar que a importação destas armas fabricadas na República Checa para Moçambique, algumas com passagem por Portugal, obdece aos requisitos que a lei do nosso país impõe com autorização do Ministério do Interior.

Já a licença das armas que a Investcon adquiriu, e cujo processo normal demora pelo menos 3 semanas, Johan Rudolph Stoltz disse a CAP que as conseguia em menos de 2 horas, pagando subornos. A CAP apurou que grande parte das licenças foram assinadas por Abílio Arnaldo Ambrósio e pelo seu colega Rogerio Moises Chiau, na altura funcionários seniores do Comando Geral da Polícia da República de Moçambique.

Antes de ter sido tornada pública, a investigação foi apresentada, em 2015 à Procuradoria-Geral da República, que abriu uma investigação, porém o @Verdade apurou que desde então nenhum dos empresários foi sequer detido para averiguações.

Contudo desde 2016 que a Investcon parou de comprar carabinas de calibre 375 e 458 produzidas pela CZUB directamente à Afrocaça e a Casa Fabião no entanto a Conflict Awareness Project descobriu que continuam a compra-las às mesmas empresas através de “testas de ferro”. Em 2018 um dos complexos da ExploAfrica, o restaurante Tio Manuel na Cidade da Matola, foi fechado, alegadamente para dar lugar a expansão da Estrada Nacional nº4.

As informações prestadas pela Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, desde 2015 até 2019 nenhuma menção fazem a esta investigação nem aos chefões da caça ilegal. Apenas caçadores ilegais, pequenos traficantes e alguns compradores são presos e responsabilizados pelo assassínio de rinocerontes mas também de elefantes na África do Sul e também em Moçambique.

Os aeroportos e portos de Moçambique foram identificado pela Agência de Investigação Ambiental(acrónimo em inglês EIA) como um dos principais locais de exportação de cornos de rinocerontes para a Ásia, entre 2010 e 2016 foram traficados pelo nosso país 797,78 quilos com valor de mercado a rondar os 80 milhões de Dólares norte-americanos.

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