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Algumas notas eleitorais

Separe-se a diplomacia da Justiça

Pois é, a primeira coisa que há a destacar nestas terceiras eleições autárquicas é um índice de participação muito superior ao dos dois pleitos anteriores. A campanha de apelo ao voto parece ter sido bem acatada, como demonstram os cerca de 50% de eleitores que se deslocaram às mesas de voto a nível nacional. Em algumas autarquias o nível de participação chegou mesmo aos 60%! É bom, muito bom mesmo. Estes números provam a vitalidade da nossa democracia que, embora jovem e inexperiente, parece ainda ter muitos crentes.

Segundo aspecto a realçar: a razoável, em alguns casos mesmo bastante boa, organização dos órgãos eleitorais que, excepto um ou outro caso, deram uma boa resposta à demanda. Uma das excepções ocorreu na Beira onde um presidente de Mesa justifi cou o atraso na abertura das urnas e a pouca celeridade do processo com a frase caricata: “Não estávamos preparados para tanta afl uência, daí o atraso”, como se o normal fosse as pessoas não irem votar. Esta mentalidade, infelizmente bastante enraizada, constitui uma inversão total dos princípios que devem presidir uma eleição, porque, no limite, as Mesas devem estar preparadas para receber todos os eleitores inscritos nos cadernos eleitorais. Desta vez só compareceram metade. Se tivessem comparecido todos nem imagino qual seria a reacção daquele senhor!

Olhando para o mapa do país, o vermelho tomou praticamente conta de todo o espaço. A Frelimo venceu em todos os municípios excepto na Beira. Isto é, manteve todos os que já possuía e conquistou ainda Nacala, Angoche, Ilha de Moçambique e Marromeu ao partido da Perdiz. Em alguns casos, o fosso entre os dois partidos é mesmo irreversível. Esta vitória esmagadora, com contornos humilhantes, deve-se, sobretudo, à forma como os dois partidos encararam o acto eleitoral. A Frelimo trabalhou arduamente desde há muito para estas eleições. Se quisermos foi 100% profi ssional, não deu, passe a expressão popularucha, abébias, nem mesmo nas zonas onde sabia, à partida, que o triunfo estava garantido. A vitória da Frelimo foi a vitória do trabalho, da organização, do rigor táctico, do não facilitismo, da militância, do profi ssionalismo. O partido enviou para o terreno, ao serviço da campanha, metade dos ministros – primeira-ministra incluída – e algumas das mais antigas e respeitáveis figuras. Desta forma os candidatos do partido sentiram-se extraordinariamente amparados e apoiados pelos seus superiores. E sabe-se como o povo dá valor ao facto de os políticos se misturarem com ele, nem que seja só no período eleitoral. E isso foi seguramente sentido pelos munícipes em relação à Frelimo.

E o que fez a Renamo? Nada, rigorosamente nada. E, como diz o adágio popular, “quem não trabuca não manduca” por isso a Renamo, ao não trabalhar minimamente, facilmente perdeu os poucos municípios que detinha. Nunca se viu nenhuma fi gura destacada do partido no terreno em apoio aos candidatos, nem mesmo naqueles municípios que tradicionalmente podiam ser seus. O partido limitou-se a enviar algum material de campanha – pouco – e nada mais, permanecendo os seus líderes dentro de autênticas paredes de marfim cegos, surdos e mudos a tudo o que se passava à sua volta. Deste modo era difícil, aos esforçados candidatos, pedir mais. Enfraquecida como nunca, à deriva e sem liderança, a Renamo tem um ano pela frente para repensar toda a sua estratégia e para se organizar, sob pena de Moçambique voltar ao monopartidarismo, desta vez não por imposição revolucionária mas por inércia total da oposição. Um cenário semelhante ao angolano, onde a oposição passou a residual, ganha contornos mais acentuados.

Por fi m, debrucemo-nos sobre o que se passou na Beira. Nesta autêntica Aldeia de Astérix, venceu o candidato independente Daviz Simango. Simango venceu contra tudo e contra todos. Contra a Frelimo e a sua poderosa máquina, contra a Renamo e sobretudo contra uma bizarra e inédita aliança entre os dois, na lógica do inimigo do meu inimigo é meu amigo. Simango teve força sufi ciente para juntar inimigos ancestrais. Por isso os seus partidários devem estar agora a sentir o mesmo que os gauleses sentiram quando derrotaram os romanos em Gergóvia: euforia total. O curioso vai ser ver a coabitação entre o presidente do município e as bancadas na Assembleia Municipal da Frelimo, da Renamo e do intruso Grupo para a Democracia da Beira (GDB) que, inexplicavelmente, obteve 12.712 votos, enquanto o seu candidato ofi cial à presidência do município não chegou aos mil!

Terá havido alguma confusão com outro Grupo?

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