Vou guardar o nosso amor na caixa de tristeza entre a alma e o coração. Estou cansada de sonhar, parece-me que já nem me lembro de como é a realidade e agora que te ausentaste de ti e de mim, acho melhor assim.
Vou guardar o teu olhar ansioso de quando nos encontrávamos no jardim, tu chegavas sempre antes de mim, atrás de um boné cinzento e de uns óculos muito escuros para que o mundo não desse pela tua presença porque naquela altura o mundo não contava, só nós, e quando eu chegava passeavas as tuas mãos pelas minhas, como quem pega pela primeira vez num recém nascido, solene e circunspecto, excitado e feliz, mas isso só se via no azul dos teus olhos, que aclarava quando se cruzava com o verde dos meus, o verde e o azul tornavam-se o céu e a terra, e eu sentia-me a pessoa mais feliz do mundo.
Dizem que o azul é a cor do infinito e o verde a da esperança, mas a tua ausência já não enche os meus dias, nem consigo alimentar a doçura na espera, por isso guardo o meu amor por ti num lugar onde ninguém lhe possa tocar e dou-te a chave para não ter de pensar mais nisso. É engraçado, quando olho para o futuro, vejo-te lá. Olho para o sofá da minha sala e estás lá sentado. Olho para a janela e estás comigo, ao meu lado, a ver os barcos que sobem e descem o rio.
Deito-me na cama é és tu que me adormeces e acordas. Mas isso é da minha imaginação, que é aquilo a que nos agarramos quando a vida nos rouba o resto. E o resto é estar sentada aqui, na esplanada do jardim, onde via o teu olhar iluminar-me da minha presença e o mundo inteiro em duas cores.
Memórias perdidas no tempo como lágrimas na chuva, memórias que não quero perder e que por isso escondo numa caixa onde as guardo para sempre, esperando sem esperar que um dia encontres a chave e me voltes a fazer feliz. Mas para isso tens que querer. Porque sabes, meu amor, que não há amor, há provas de amor. Fico à espera delas.