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A Ntyiso wa wansati: Imaginar o Amor

Querido Diogo:

Estás em toda a parte, como se o teu perfume, entranhado em todos os objectos que me cercam, todos os dias libertasse a sua magia, como um novelo infinito de fios de seda em meu redor. Estás em toda a parte do meu ser e do meu estar, à noite, sempre que me deito, de manhã, ao acordar.

Estás nos gestos e nas palavras, em todas as histórias que conto sobre ti e mim e nós, quando nos conhecemos, a primeira vez que nos rimos juntos, as viagens inesperadas, os momentos de prazeres quase secretos e sempre perfeitos. Se fosse pintora era capaz de desenhar a tua cara e o teu corpo em meia dúzia de traços.

O nariz afilado, os olhos redondos, a boca enorme, o olhar de criança, as mãos longas e fortes, a cintura estreita, as costas em V, o pescoço de garça, o cabelo em desalinho, as pernas magras e os pés de estátua. Nunca soube bem o que era o amor porque só conheço uma única forma de o viver, protegendo aqueles que amo como meus filhos, sobrinhos, irmãos mais novos emprestados, pessoas frágeis que acolho nos meus braços de mãe, com quem gosto de conversar sobre o que já vivi e que acabam sempre por me ensinar mais do que precisam de aprender.

Nunca amei de outra maneira, esta é a minha, não a consigo explicar, eu que sou escritora e já fui professora, eu que dou palestras e vou a programas de televisão onde falo da paixão, do desejo, do beijo, daquilo que posso imaginar que é o amor.

Quando te conheci não imaginei que serias uma parte da minha vida. Agora, quando olho em volta e te vejo em objectos e memórias, rio-me da minha ingenuidade e rezo para que estejas feliz na tua cidade de chocolate, pedindo aos deuses que te vás lembrando de mim, que também tu, na tua memória fresca e automática, me consigas ver a andar de bicicleta ao teu lado como uma aprendiz de feiticeira que ensaia os primeiros passos da felicidade.

Tens esse talento raro e inconsciente de respirar como uma flor e crescer como uma árvore, como se tudo fosse fácil e possível. Uma sabedoria inata e inexplicável que te dá um entendimento do mundo que eu nunca alcancei. Eu vivo do outro lado do entendimento, quero perceber tudo, dissecar a realidade como um cientista louco, procurar e encontrar o porquê de todas as coisas, como se uma boa ideia matasse a tristeza. Mas nada mata a tristeza, a tristeza é um gene que vive nas tuas células, que nasce contigo ou te é plantado quando és ainda quase uma semente e depois nunca mais te larga, tal como a alegria, que vive em ti, e que tantas vezes me escapa.

Imagino-te por perto, em silêncio, abraçado a mim a caminhar pelas ruas da tua cidade de chocolate. E depois oiço as tuas gargalhadas, a voz meiga, e sinto as tuas mãos a levantarem-me pela cintura como se pesasse pouco mais do que uma flor e sinto-me feliz outra vez. Não vivo em sonhos nem me alimento de ilusões, o mais provável é que nunca mais voltes a ocupar o lugar que deixaste vazio no meu corpo e no meu coração, mas quero que saibas que o teu entendimento do mundo me vai chegando em mensagens trazidas pelo vento e pela mudança das estações e que guardo de ti o melhor; a memória do nosso amor que nunca foi imaginada porque era feita de gestos e de palavras, de prazer e de felicidade, dessa alquimia indecifrável que une dois espíritos livres numa viagem ao centro da felicidade onde o bem-estar reina sobre todas as coisas.

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