Menos feijões no armazém, mais tempo de espera pelo guagua (autocarro) e calor sufocante nos locais de trabalho: a crise econômica internacional começa a golpear ainda mais os cubanos na já por si só difícil vida cotidiana.
Diante da gôndola de mercadorias, com sua cesta de palha ainda vazia, Luisa Suárez, de 67 anos, se resigna à nova disposição do ministério de Comércio Interior que reduziu a partir deste mês a cota mensal de alguns produtos que os cubanos compram a preços subsidiados com a caderneta de racionamento. “Claro que afeta, mas já estamos acostumados a viver nesta agonia. Para dizer uma verdade, os feijões que nos davam só bastava para uma sopa”, disse a mulher num armazém da Havana Velha.
Estampada em letras negras na parede, um anúncio – distribuído a todas as lojas – explica que a cota de feijões e ervilhas foi reduzida de 30 para 20 onças e a de sal, praticamente para a metade. “Disseram que isto se deve à difícil situação econômica, mas não sabemos se se estenderá a outros produtos”, disse, sem querer revelar o nome, o gerente do armazém com paredes descascadas, mas com prateleiras e equipamento de refrigeração dos anos 50 impecavelmente limpos.
Os cubanos, com salário médio mensal de 400 pesos (17 dólares), compram com “la libreta” uma cesta básica (arroz, açúcar, óleo, ovos, entre outros) a preços baixíssimos mas em quantidade insuficiente. O que falta é adquirido no mercado negro ou nas lojas mais caras que cobram em divisas estrangeiras.
“Que crise internacional?. Em Cuba temos 50 anos de crise. Estou cansada de ouvir justificativas para os problemas de sempre”, desabafa uma dentista de 28 anos. O governo Raúl Castro executa um programa de austeridade e poupança e sustenta que procura evitar a deterioração dos programas sociais, garantir o emprego e assegurar que em Cuba “ninguém morra de fome”.
Como parte dos ajustes, o governo se dispôs a descentralizar o comércio agropecuário a partir de 1 de agosto para garantir maior acesso da população aos alimentos, num país que importa 80% do que consome e gastou 2,5 bilhões de dólares em 2008 na compra de gêneros básicos.
Para Ana Orosco, uma artesã que vende bonecas de pano no bulevar de Obispo e chega a ganhar até 30 dólares por dia, está claro que “a crise está batendo as nossas portas”. “Aqui, quem tem uma empresa saca dinheiro, mas quem vive de salário tem a vida muito difícil”, comentou a costureira, de 60 anos.
A crise, reconhecem as autoridades, reduziu para a metade o crescimento da ilha de 6% para 2,5%, e afeta setores importantes da economia como turismo, a exploração de níquel e a produção de tabaco. Suando por trás da vitrina de uma loja de Havana, Yakelín Rodríguez, de 44 anos, queixa-se do plano de economia de energia que também entrou em vigor este mês. No seu local de trabalho, como em muitos outros, só se pode ligar o ar condicionado durante quatro horas, às tardes. “Não sou hipertensa, mas estou morrendo de calor”, afirmou.
Com o lema “poupança ou morte”, o governo lançou campanha contra o desperdício e a improdutividade, e pede a colaboração dos cubanos porque a situação é difícil não só em Cuba, mas em todo o mundo.