Não há dúvidas de que estamos diante de uma Xiconhoquice de bradar aos céus. A importação de uma quantidade de equipamento bélico e o desfile do mesmo pela cidade, numa demonstração clara e inequívoca das pretensões do Governo, revelam o que é primordial para os donos do país. Preferem, o que não nos devia espantar, o estrondo arrogante de uma arma do que a força apaziguadora do diálogo.
“Ninguém percebia o que realmente se estava a passar. Quando eram por volta das 21 horas, o trânsito a partir da Praça dos Trabalhadores até à avenida 24 de Julho, através da Guerra Popular, ficou condicionado no sentido sul – norte. De repente viu-se um total de 25 camiões militares novos saindo do porto que transportavam, entre armamento bélico e de grande porte à vista de todos, outros 25 veículos de marca Land Rover com um feitio militar, todos escoltados por duas viaturas da Polícia Militar (PM) das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM)”, relata a edição online deste semanário que o leitor tem em mãos.
Aqui, no país das Xiconhoquices, o diálogo é um pecado maior. Aqui não se estabelecem pontes por via de consensos. Não se perde um metro na mesa das negociações quando é mais fácil resolver com fogo. A Xiconhoquice é uma doutrina que desconhece literalmente o diálogo. Ama a força e exibe armas de fogo.
Portanto, nenhuma pessoa sensata deve ficar espantada com os assaltos aos paióis e a altas patentes das Forças de Defesa e Segurança. À medida que o Governo adquire armamento pára e mostra, de forma tão eloquente, que a sua prioridade reside no confronto militar, é lógico que a Renamo se prepare para uma guerra. Contudo, importa lembrar que as armas não disparam flores e ceifam vidas.
O pior mesmo é que na equação da subtracção de vidas quem tomba, regra geral, não é o proprietário do dedo que autoriza o confronto, mas a mão do soldado que prime o gatilho no meio de um fogo cruzado sobre o qual desconhece as reais motivações e a população que tão-pouco acredita no discurso das AK’s 47.
Importa, também, dizer que o interesse que se esconde por detrás do acirrar de posições, quer de um e quer do outro lado, não visa salvaguardar o desenvolvimento do povo do Rovuma ao Maputo e do Zumbo ao Índico. O que está em jogo, meus caros, é a divisão do que nos torna um país apetecível para as grandes multinacionais.
A Renamo quer a sua parte do bolo. Contudo, o actual Presidente da República, que ficou milionário depois que chegou ao poder, não pretende, de forma alguma, dividir o seu filão de ouro com quer que seja. Nós, enquanto povo e uma vez que somos colocados à margem dos recursos, preferimos que o dinheiro que nos é roubado seja dividido por mais pessoas. Talvez aí possamos recolher benefícios indirectos do mesmo.
Uma guerra, na situação que o país atravessa, vai separar pais e filhos, mulheres e maridos. Vai cimentar, na mente dos moçambicanos, o tribalismo e vai justificar qualquer espécie de ódio entre irmãos. O dinheiro não nos pode dividir e, claro, não pode enriquecer tão poucos. É bom lembrar que por mais injusta que seja a causa de quem levanta uma arma contra qualquer regime nada é pior do que a exclusão social.
A Frelimo tem de compreender que há muito pouca gente do seu lado. É bem mais fácil sentir simpatia pela luta da Renamo que nos lembra um ovo que se lança, com todas as suas forças contra um muro. As declarações de altos quadros do partido no poder revelam uma arrogância desmedida e que nos poderá colocar num barril de pólvora.
Aos homens da Renamo não se pode exigir decoro e tacto nas suas manifestações. Quem deve, em última análise, respeitar a vontade do povo é o partido que governa. Não é preciso dizer que foi o povo que o elegeu. Portanto, antes de olhar para o orgulho deste ou daquele dirigente a Frelimo deve impedir, por via do diálogo, que os moçambicanos tenham medo de viver no seu próprio país.
A culpa, é bom que se diga, será sempre de quem governa. A escolha entre a paz e a guerra está ao alcance dos dedos da Frelimo. Se ela, a paz, deixar de ser uma realidade no território nacional, a Frelimo deve arcar com a culpa.