Elevada à categoria de cidade há sensivelmente 42 anos, Cuamba ainda é uma urbe com características rurais, onde prevalecem problemas relacionados com o desemprego, a falta de água potável e estradas sem asfalto, não obstante o esforço das autoridades municipais locais. A abertura de novos furos de água, a construção de unidades sanitárias e o início das obras de colocação de pavé na via pública são alguns sinais de progresso que saltam à vista, revelando que estes são apenas os primeiros anos de um município cujo desenvolvimento socioeconómico vem sendo adiado há quatro décadas.
Quando os ponteiros do relógio marcam as 15h30, a azáfama dos que fazem da estação do Corredor de Desenvolvimento do Norte (CDN), na cidade de Cuamba, um lugar de sobrevivência faz-se sentir com maior intensidade. Escolher o melhor sítio para se instalar, perscrutar potenciais clientes e expor os produtos são as primeiras coisas que um grupo de homens, mulheres e até crianças faz quando chega o comboio.
Os mesmos percorrem longas distâncias. Na sua maioria, provêm de diversos bairros limítrofes da Cuamba e não só. E cruzam-se debaixo de um sol intenso para ganhar o sustento diário e, consequentemente, fomentar a economia local e contribuir para o crescimento da urbe, ainda que informalmente.
A estação do CDN não é somente um simples ponto de encontro e lugar de sobrevivência. É também uma escola onde dezenas de jovens desempregados aprendem a ganhar a vida. Mas, diga-se de passagem, neste espaço as lições e as regras são outras. Até porque são traçadas todos os dias – com excepção das segundas-feiras – pela necessidade de se obter o pão de cada dia. E também pelo curso da própria vida.
“É neste local onde comecei a ganhar o meu sustento diário e da minha família. Este é o meu posto de trabalho”, afirma Juma Manuel Agy, de 34 anos de idade, estivador há aproximadamente quatro anos, que nasceu neste ponto do país, cresceu entre as cidades de Lichinga e Nampula, mas decidiu fixar residência em Cuamba, onde há 16 anos mora com o seu agregado familiar constituído por sete pessoas.
De terça a domingo, quando o comboio chega por volta das 15h30 na estação de Cuamba, o local torna-se um centro de oportunidades de negócio para muitas famílias. Cebola, tomate, feijão, mandioca, entre outros produtos agrícolas adquiridos ao longo da viagem, são os mais vendidos.
Com a 5ª classe interrompida, Estêvão António, de 28 anos de idade, tentou ganhar a vida vendendo sacos plásticos e capulanas no comboio durante as viagens Nampula-Cuamba e vice versa, mas, volvidos seis meses, abandonou a actividade. Mais tarde, depois de juntar algum dinheiro, abriu uma pequena banca na sua terra natal (Cuamba), no entanto, os elevados custos de transporte para a aquisição dos produtos na “capital do norte” precipitou a falência do seu negócio de produtos de primeira necessidade.
Presentemente, na maior parte do tempo fica a ver o dia a passar lamentando a falta de oportunidades de emprego para os jovens. E não pensa em continuar com os estudos, pelo contrário, prepara-se para abandonar a cidade à procura de um futuro em Nampula.
A falta de emprego tem sido uma das grandes preocupações da juventude. Paira um sentimento de abandono, pois a cidade não conheceu absolutamente nenhum investimento de vulto com o intuito de galvanizar o desenvolvimento económico local. Para os mais jovens, Cuamba ainda é um lugar interdito à prosperidade. A maioria não tem motivos de orgulho da urbe onde reside há anos, apesar de já começarem a surgir os primeiros sinais de desenvolvimento. O desagrado de viver neste município que, em tempos idos, era considerada a capital económica da província do Niassa continua estampado nos rostos dos munícipes.
Fernando Aiuba, de 43 anos de idade, oriundo da cidade de Maputo, reside há mais de 20 anos nesta autarquia e conta que teve dificuldades em adaptar-se a tudo: às ruas sem asfalto, à falta de água, ao deficitário acesso aos cuidados básicos de saúde e à vida recatada. Por outro lado, mostra-se insatisfeito com o estado em que se encontra a urbe. “Já começa a assistir- -se a algum trabalho por parte da edilidade, porém, nada muda, os problemas continuam”, diz.
O “eterno” problema da falta de água
Todas as manhãs, Anabela Momade, quando sai de casa para ir buscar água, tem de caminhar pelo menos uma hora e meia até ao furo mais próximo. A situação fica mais complicada quando precisa de lavar a roupa. Ela é obrigada a percorrer, no mínimo, três quilómetros até ao rio. É a esse local onde centenas de munícipes recorrem. O aglomerado de gente no curso de água que atravessa a cidade revela o crítico problema da falta do precioso líquido.
A escassez de água para o consumo tem sido a principal dor de cabeça dos moradores de Cuamba. Apesar de as autoridades municipais terem aberto 12 novos furos, perfazendo um total de 93, os problemas continuam. Ou seja, o poço não satisfaz todos os residentes. Tem sido uma vida de sofrimento para a população.
A situação que se verificava há dois anos ainda persiste. A título de exemplo, todos os dias, pelas manhãs, o cenário é sempre o mesmo: homens, mulheres e crianças circulam pelas artérias da urbe com diversos recipientes. Uns a pé e outros de bicicleta, mas todos são movidos pelo mesmo objectivo: obter água potável. Um calvário que começa nas primeiras horas do dia e prolonga-se até ao pôr-do-sol.
Tanto o manifesto eleitoral do edil demissionário, como o do actual, a questão de acesso à água canalizada para a população é uma das principais prioridades, porém, pouco ou quase nada foi feito. Até agora, a única solução encontrada pelos moradores mais desfavorecidos é o rio, para onde centenas de famílias acorrem para lavar a roupa e buscar água para o consumo. Na maioria dos bairros, o acesso à água potável ainda é um problema sério que afecta directamente milhares de agregados familiares que compõem o município. E, como se não bastasse, a essa situação agrega-se o precário (ou quase inexistente) sistema de abastecimento.
A edilidade pretende abrir mais furos de modo a aliviar o sofrimento dos munícipes, mas as rochas dificultam. A título ilustrativo, no bairro de Aeroporto foram feitas diversas tentativas em locais diferentes e não foi possível encontrar água. Em Maniua também se verificou a mesma situação. Segundo o Conselho Municipal, esse problema acentua a crise em Cuamba.
A percentagem de cobertura da rede de abastecimento de água canalizada em Cuamba ronda os 18 porcento. Porém, as autoridades municipais querem inverter esse cenário. Já foi lançado um concurso para a implementação de um projecto que preconiza a colocação de uma nova tubagem de diâmetro maior, partindo da fonte em Mpopola até à zona de Rimbane, o que vai permitir a pouco mais de 50 porcento dos munícipes o acesso a água potável.
Saúde e saneamento do meio
O acesso aos serviços de saúde no município de Cuamba continua precário, não obstante a construção de novas unidades sanitárias com o objectivo de descongestionar o único centro de saúde da cidade. Presentemente, a autarquia conta com um hospital rural, um centro e três postos de saúde. Porém, apesar disso, a situação ainda é dramática, pois a maior parte da população, sobretudo os moradores do bairro de Xilico, é obrigada a percorrer pelo menos três quilómetros para obter os cuidados básicos.
As novas unidades sanitárias foram erguidas no bairro de Tetereane e na zona de Adine 3 e vão atenuar o sofrimento dos moradores dos 11 bairros que constituem o município de Cuamba, uma vez que vão reduzir as longas distâncias que a população percorria. Por outro lado, de modo a garantir o bem-estar dos munícipes, a edilidade assumiu o desafio de construir um centro de saúde anualmente.
Relativamente ao saneamento do meio, tem havido recolha de resíduos sólidos de forma permanente na zona urbana, porém, o mesmo não acontece na periferia. O que há dois anos era um problema que saltava à vista nas estradas poeirentas de Cuamba, pondo a descoberto um sistema ineficiente de recolha de lixo, hoje o cenário é inverso. Um pouco por todo lado, é possível ver o esforço do Conselho Municipal de uma pequena cidade com todas as características rurais.
Contando apenas com três tractores, o lixo é removido diariamente. Além de garantir a limpeza da cidade, o Conselho Municipal tem vindo a apostar na construção de sanitários nos locais públicos tais como mercados, escolas, unidades de saúde, entre outros.
Vias de acesso, electricidade e transporte
Nem todos os problemas estão resolvidos, pois a população de Cuamba clama pela reabilitação de vias de acesso, reabilitação, construção de salas de aula, instalação de corrente eléctrica e pelo transporte.
No que respeita ao melhoramento das vias públicas, ainda há muito por ser feito. Diga-se, em abono da verdade, a cidade ainda não dispõe de uma estrada asfaltada sequer. Mas a edilidade teve a ousadia de iniciar as obras de colocação de pavé em algumas vias de acesso, como é o caso da Avenida Samora Machel.
Relativamente à expansão da rede eléctrica, ela acontece de forma tímida. Grande parte dos bairros do município de Cuamba debate-se com o problema de falta de corrente eléctrica. Porém, segundo as autoridades municipais, essa situação tem os dias contados, pois já existe um projecto para a electrificação de algumas zonas residenciais, tal é o caso dos bairros Xilico e Matia e o povoado de Cansina. A parte urbana vai beneficiar de reabilitação total da rede de modo a melhorar-se a qualidade da energia, que presentemente é considerado deplorável.
A par dos problemas relacionados com a falta de vias de acesso e a precariedade da electricidade, os munícipes debatem-se com a ausência de transporte público urbano. Não existe sequer uma viatura fazendo a ligação entre os bairros. Para se deslocar de um ponto para o outro, a população socorre-se de motorizadas, o principal meio de transporte dos cidadãos.
Breve historial
Localizada no distrito com o mesmo nome, antes da independência nacional, Cuamba era conhecida por Nova Freixo. Hoje, administrativamente, é um município com uma população estimada em 56.801 habitantes. O distrito conta com mais de 184 mil pessoas, distribuídas em 43.290 agregados familiares, e tem uma superfície de 5.359 km². Elevada à categoria de cidade a 30 de Setembro de 1971, ainda é uma das urbes moçambicanas cujo desenvolvimento social e económico acontece de forma tímida.
A nível de distrito de Cuamba, apenas 0.6 porcento dos agregados familiares – num total de 43, 290 – tem água canalizada no domicílio, aproximadamente nove fora dele, quase 34 porcento recorrem aos poços (a céu aberto) e 31 socorrem-se dos rios.
Município de Cuamba em números
Vereações: 6
População: 56.801
Unidades sanitárias: 5
Água canalizada: 18%
Furos de água: 93
Bairros: 11
Funcionários do município: 295