À medida que o tempo passa, as circunstâncias que rodearam a morte do Presidente da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira, na madrugada da passada segunda-feira, vão-se clarificando, embora ainda permaneçam muitos pontos nebulosos.
Sabe-se que o assalto teve lugar por volta das quatro da madrugada de segunda-feira e que durou cerca de uma hora. Durante esse tempo, travou-se um duro combate entre a guarda presidencial e os assaltantes afectos ao Chefe de Estado Maior – General Tagmé Na Waié, morto na véspera por uma bomba colocada junto ao Estado Maior.
Sabe-se também agora que “Nino” Vieira foi morto com três tiros e vários golpes de catana em diversas partes de corpo. “O Presidente sofreu pelo menos um tiro no estômago e dois no tórax”, afirmou uma fonte diplomática à agência Lusa. “Foram disparando até darem conta de que ele já tinha morrido”, acrescentou. “Foi ainda vítima de golpes de catana em várias partes do corpo, incluindo a cabeça”, assegurou a mesma fonte. “Nino” foi surpreendido pelos assaltantes numa sala com porta para as traseiras, tudo apontando que se preparava para fugir quando foi encurralado. Foi assassinado diante da mulher que assistiu assim ao desenlace fatal. Só depois é que os assaltantes permitiram que a primeira-dama abandonasse a habitação, acabando por refugiar-se na embaixada de Angola. Após a fuga dos assaltantes, foram retirados do interior da residência presidencial dois corpos: o do presidente falecido e outro do seu adjunto de segurança. No tiroteio morreram ainda várias pessoas não se conhecendo ao certo o seu número.
Ajuste de contas e não golpe de Estado
O Conselho para a Paz e Segurança da União Africana (UA) considerou esta terça-feira que o assassínio de “Nino” Vieira não foi um golpe de Estado. As autoridades militares da Guiné-Bissau, através do seu porta-voz, o coronel Zamora Induta, já tinham assegurado, na própria segunda-feira, a sua fidelidade à Constituição e aos poderes instituídos, rejeitando liminarmente a tese de que se trataria de um golpe de Estado. “Não consideramos, na situação actual, estar perante um golpe de Estado. Trata-se do assassínio de um chefe de Estado, mas não ultrapassámos a linha de definir esta situação como um golpe de Estado”, declarou o embaixador do Burkina Faso.
Entretanto, o deputado e ex-ministro das Finanças da Guiné-Bissau, Victor Mandinga, defende a necessidade de elaboração de um inquérito internacional que dê a conhecer definitivamente quem está por trás do tráfico de droga que assola o país. Mandinga afirmou, citando a célebre frase do Marquês de Pombal após o terramoto que devastou Lisboa em 1755, “é chegado o momento de enterrar os mortos e cuidar dos vivos.” O deputado pretende ver criada uma comissão parlamentar de inquérito que integre juízes dos Palop’s, da União Económica e Monetária da África Ocidental (UEMOA) e da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), tendo os resultados que ser entregues a um tribunal internacional. “Para sabermos, de uma vez por todas, quem está na droga. Há mortes motivadas pela droga. Há mortes políticas, motivadas por rivalidades entre políticos e militares pela chefia. Que tudo fique claro”, defendeu Mandinga.
Raimundo Pereira é o novo Presidente
De acordo com o art. 71 da Constituição guineense, o presidente da Assembleia Nacional Popular (parlamento), deve assumir interinamente a presidência do país até à realização de novas eleições que deverão ter lugar 60 dias após a morte do chefe de Estado. Deste modo, Raimundo Pereira é o novo presidente da Guiné-Bissau, sendo o décimo a assumir essas funções desde a independência, em 1974. Raimundo Pereira tem 50 anos, é advogado de profissão e tido como um político moderado e adepto da concertação política e de consensos. Iniciou a sua carreira política no PAIGC – antigo partido único –, tendo, desde então, desempenhado vários cargos, quer a nível partidário, quer a nível do Estado. Homem de confiança do actual primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, foi diversas vezes membro de sucessivos governos ocupando vários cargos desde o de secretário de Estado da Comunicação Social até o de ministro da Justiça, após ter dirigido a Televisão da Guiné-Bissau (TGB) e a Rádio Difusão Nacional (RDN).