O fundo destinado à redução da pobreza, vulgarmente conhecido por “sete milhões”, já está disponível no meio urbano. Porém, para quem tentou obtê-lo, a experiência não foi agradável. Aliás, foi uma “aventura impossível”. O excesso de burocracia, passando pelos duvidosos critérios de atribuição e culminando na falta de informação, eis alguns entraves que o caracterizam…
Três jovens e dois distritos municipais. Eles têm idades diferentes e também ambições, mas partilham um objectivo comum: ter acesso ao Fundo de Redução da Pobreza Urbana destinado à cidade de Maputo. O que, à partida, lhes parecia um “balão de oxigénio” para as suas respectivas situações financeiras transformou-se na maior decepção das suas vidas.Tudo porque acreditavam que era apenas necessário um documento aqui e outro ali para se ser elegível. A realidade foi-lhes dura. Estes são apenas exemplos de alguns moçambicanos que tentaram obter os “sete milhões” e não o conseguiram.
Há seis anos, Américo Manjate, de 31 anos de idade, procura um emprego. Nunca teve um trabalho formal. Durante nove meses, dedicou-se à venda de recargas de telemóveis ao longo das artérias da cidade de Maputo, mas, devido a certas questões, que não quis lembrar, o negócio parou. Mora no bairro 25 de Junho (Choupal), Distrito Municipal Kambukwana, e o seu objectivo é voltar a exercer uma actividade económica. Já definiu o tipo de actividade, mas falta-lhe o essencial: dinheiro.
“Gostaria de abrir um pequeno bar aqui nesta zona”, conta. A falta de financiamento é o seu maior obstáculo para a materialização do seu desejo. Ouviu falar da existência dos “sete milhões” para a cidade, e decidiu tentar a sorte. Mas a sua experiência não foi boa.
Declaração do bairro, Registo Criminal e fotocópia do Bilhete de Identidade autenticado foram os documentos exigidos. Quando Manjate pensava que já estava a um passo de obter os 100 mil meticais para pôr em marcha o seu empreendimento, exigiram-lhe mais um documento. Desta vez, o Número Único de Identificação Tributária (NUIT). E não se ficou por aí. Para a sua surpresa, veio uma enorme lista de exigências, além de saber que se estava a dar prioridade aos projectos agro-pecuários, o que acabou por fazer com que desistisse da ideia.
Paulo Farranguane, de 29 anos de idade, vive do que a sua banca de venda de produtos de primeira necessidade pode dar. É graças a esse negócio que garante o sustento diário da sua família composta por seis pessoas. Mas a sua ambição é mudar de actividade. “Gostaria de me dedicar à confecção de refeições. Cerca de 50 mil meticais é o suficiente para começar um bom negócio”, comenta.
Apesar de saber da existência do Fundo de Redução da Pobreza Urbana, Farranguane desconhecia os mecanismos para a sua obtenção. Logo que pôde, obteve informações e, mais tarde, apresentou todos os documentos exigidos, nomeadamente comprovativo de residência, Certidão de Nascimento e NUIT.
Mas dois obstáculos apareceram no seu caminho. O primeiro diz respeito ao tempo em que reside no bairro. Paulo vive no Albasine, Distrito Municipal de Ka Mavota, há pouco menos de seis meses. O secretário do bairro informou-lhe que o fundo é para pessoas que moram há mais de dois anos naquele local.
E o segundo entrave está relacionado com a apresentação do projecto. “O grupo dinamizador do bairro disse que o projecto devia ser apresentado por escrito e eu não sei elaborar um projecto”, disse Paulo Farranguane que tem apenas a 5ª classe interrompida.
À semelhança de Américo e Paulo, Benedito Gustavo, de 33 anos de idade, também tentou sem sucesso obter o Fundo de Redução da Pobreza Urbana. Mora no Albasine há 10 anos e trabalha no sector de construção. Quando ouvi a falar do fundo dos “sete milhões” para a cidade de Maputo, pensou: “É desta vez que trabalho por conta própria”.
Em mente, Benedito tinha a ideia de adquirir uma carrinha para o transporte de passageiros. Mas depois de apresentar os documentos exigidos ficou a saber que não era elegível, uma vez que o fundo era atribuído às mulheres chefes de família, jovens desempregados, deficientes físicos ou pessoas cujos rendimentos mensais não ultrapassam os 2500 meticais. “Acho que se deveria dar prioridade às pessoas que têm capacidade de reembolsar o valor, à semelhança do que fazem os bancos”, afirma.
Um drama comum
Este não é apenas o drama dos três jovens para se ter acesso aos fundos de desenvolvimento. Grande parte dos moçambicanos, sobretudo os que pretendem expandir (ou começar) os seus negócios, passa pelo mesmo dilema.
Muitas vezes, recorrer ao empréstimo bancário, submetendo- se a juros quase impossíveis de pagar, tem sido a única saída, apesar de frequentemente se anunciarem diversos fundos bonificados para pessoas empreendedoras, tais como o de Apoio à Iniciativa Juvenil, os “sete milhões” para zonas urbanas e de Apoio ao Sector Privado.
Ter acesso ao fundo de “sete milhões”equipara-se a uma missão impossível. Primeiro, é necessário que o interessado apresente um projecto relativo à actividade que pretende desenvolver. Num país em que poucas pessoas são capazes de desenhar um projecto, este deve ser preciso, e ter-se em conta que se dá prioridade aos projectos de desenvolvimento, tais como agro-pecuários e de pequenos negócios.
Posto isto, o segundo passo é encaminhar o projecto para os chefes de 10 famílias do bairro em que o indivíduo reside e estes, por sua vez, enviam-no ao chefe de quarteirão. Os dois líderes locais elaboram uma declaração que deve ser anexa ao projecto e ambos os documentos são enviados para o círculo do bairro.
Na referida instância, existe uma brigada cuja responsabilidade é analisar a viabilidade do projecto. Por fim, o mesmo é enviado à administração do bairro, onde também existe uma comissão cujo objectivo é aprovar ou não a proposta. Depois de atingida essa fase, aguarda-se por uma semana para a obtenção da resposta.
De referir que para se ter acesso ao Fundo da Redução da Pobreza Urbana, a prioridade é dada os jovens desempregados, mães chefes de família e deficientes físicos, cujo financiamento abrange projectos com um custo de até 400 mil meticais.