Autor de “Ximbomana” tem saudades da censura
Xadreque Mucavel é um dos ícones da música ligeira moçambicana. A sua entrada para esta vertente cultural aconteceu com a gravação do tema “Sónia uta Rhandza” nos anos setenta, uma declaração de amor que se mantém sempre actual. Ao longo do seu percurso de pouco mais de 35 anos de carreira, o músico registou grandes temas como “Pitory”, o popular “Ximbomana” e “Barigana”. A sua voz caracteristicamente rouca e grossa, constitui um elemento de atracção e diferença.
O músico tem quatro álbuns editados, para além de inúmeras canções publicadas no tempo colonial sob a chancela da Produções 1001 e depois do INLD (Instituto Nacional do Livro e do Disco). Xadreque começa a cantar em 1972 com uma banda chamada “Black Boys”. Na altura apresentavam-se em cinemas e centros culturais como Ntsindza, Folclore, Sheik, Zambi, Dragão e Gil Vicente. “Éramos contratados por várias casas de pasto e abrilhantávamos as noites com música ao vivo e fazíamos boas composições, com conteudos educativos, porque havia censura”.
Segundo o músico, Dilon Djindji e Batshisso são os moçambicanos que faziam a censura das letras, antes de estas chegarem aos ouvidos dos colonos e do público. Como exemplo da falta de cautela, Xadreque referiu-se ao mologrado Fany Fumo, que fez uma canção polémica intitulada “Loku u lhula mina uta lhula ngonhama”, que em português quer dizer “se me derrotares poderás derrotar o leão”. Foi uma música polémica que fez com que Fany Fumo fosse perseguido pela pelos colonos opressores, porque tinha um carácter revolucionário e anti-colonial. Devido à tal polémica o músico fugiu para a África do Sul. De acordo com a narrativa do cantor, no tempo colonial os músicos eram mais disciplinados e não se fazia música de passagem efémera e vergonhosa como hoje acontece. “Há necessidade de se criar uma comissão para censurar as letras e é urgente, porque a nossa música está a caminhar para o ridículo, não há composição nem melodia”. Segundo o músico, por outro lado é preciso que as editoras percebam que há música comercial mas há também música bem executada e audível.
Xadreque Mucavel disse que já trabalhou com várias bandas, porque é seu forte cantar com o acompanhamento de banda, em que se destacam o “Grupo RM”, “Nova Dimensão”, “Omba Mô” e “Central Line”. Estas duas últimas até hoje o acompanham. Aos 35 anos de carreira, o autor de “Ximbomana” aponta como principal preocupação para a sua classe a falta de atenção e reconhecimento por parte da entidade que tutela a cultura. “Sofremos pela revolução política e pela música, mas hoje não somos reconhecidos, no mínimo que nos devolvam os espaços onde actuávamos, como os cinemas e casas de cultura que se encontram encerradas, para que possamos divulgar a nossa música ligeira que afinal é o cartão de visitas para o turismo”. Para o nosso entrevistado a comunicação social também não apoia a música, as rádios e televisões estão corrompidas. “Nenhuma rádio excepto a RM paga os direitos autorais aos músicos”, acrescentou. Convidado a explicar o conteúdo de “Ximbomana”, uma das suas mais famosas canções de todos os tempos, lançada em 1978 e reeditada duas vezes, o músico disse que aquela composição retrata situações de tortura que eram protagonizados pela polícia de choque nos bairros suburbanos. Apesar das várias dificuldade que apresentou, o cantor afirmou que continua firme e activo na músca, que para ele é uma forma de honrar muitos outros músicos da sua geração que já perderam a vida, porque, segundo ele, seria cobardia render-se ao actual sistema.