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Autárquicas 2013: Vilanculos, uma vila singular

Numa manhã calma de sábado, um homem com água até ao joelho tenta arrastar uma enorme rede do mar para terra firme. Ao seu redor, barcos, lodges, outras redes e pescadores compõem o cenário da zona costeira de Vilanculos. Ao pé do mar, um imponente empreendimento turístico chama a tenção dos citadinos para a possibilidade de emprego, mas ainda está em obras. No seu esforço quase sobre-humano – e aparentemente inútil –, o homem pequeno no grande cenário do rico mar encarna a luta pela sobrevivência nesta vila singular…

Um dos desafios de um município em expansão é conciliar o desenvolvimento económico com a preservação do ambiente. Os problemas decorrentes desse desequilíbrio são o desemprego e o surgimento de famílias carenciadas. O investimento em infra-estruturas é fundamental para que o crescimento não seja sinónimo de problema. O acesso aos serviços de água canalizada, luz e cuidados sanitários é imprescindível.

A vila que quer ser cidade e nasceu incrustada ao Índico, Vilanculos, exibe um histórico de missões cumpridas. Dos 9000 talhões que compõem a zona urbana, 4500 têm corrente eléctrica num espaço geográfico que há 15 anos não sabia o que era energia. Cerca de 98 porcento da população urbana são atendidos no hospital local. A recolha e o tratamento dos resíduos sólidos funciona. Apesar disso, as autoridades municipais construíram um aterro sanitário – o primeiro na história da municipalização no país numa vila – que irá reaproveitar o lixo.

A Vila de Vilanculos, sede do distrito do mesmo nome, situa-se a norte da província de Inhambane, a cerca de 250 quilómetros de Maxixe. Os seus limites físicos são estabelecidos a sul por Chixocane, Macunhe no norte, Pambarra mais a oeste e o Índico a este. Com um clima tropical e húmido ainda que com baixa pluviosidade, solos arenosos, relevo de planície e a bacia hidrográfica do rio Govuro, a autarquia via, no passado, o seu desenvolvimento dependente do trabalho migratório e da pesca.

No início do processo de municipalização, os estudantes que terminavam o ensino primário do segundo grau tinham de sair da Vila para prosseguir os estudos. Efectivamente, Vilanculos progrediu e hoje orgulha-se de ter uma instituição de ensino de nível superior. Portanto, esse problema comum às pequenas vilas foi relegado para o passado.

Na abertura do ano escolar a vila é invadida por autocarros que trazem novos estudantes para a Escola Superior de Extensão Rural. Os operadores turísticos esfregam as mãos de contentamento. Afinal uma escola superior onde antes nem sequer escolas secundárias existiam oferece mão-de-obra qualificada.

Uma das ambições do município é reduzir a dependência que os operadores turísticos têm dos produtos agrícolas da África do Sul. O ensino superior não poderia vir em melhor altura. Os camponeses, com o apoio da Escola Superior de Extensão Rural (ESUDER), estão a desenvolver produtos orgânicos e a edilidade acredita que, num espaço de três anos, deixará de haver necessidade de trazer bens do país vizinho.

Há 14 anos Vilanculos não tinha energia e nem água canalizada. Em 1999 arrancou o processo de recuperação da rede de abastecimento e distribuição de água. O investimento de 1.5 milhão de dólares, volvidos 10 anos, revelou-se pouca coisa. Na verdade, a população nesse mesmo intervalo de tempo cresceu 115 porcento. Eram 18 mil habitantes em ’99 e hoje são pouco mais de 40 mil.

A cobertura actual de água canalizada abrange apenas 30 porcento da população actual. Contudo, 80 porcento dos habitantes têm acesso à água por vias alternativas. No que diz respeito ao meio urbano, o número total de ligações é de 2500. Em meados de Julho, de acordo com fontes municipais, o investimento para o aumento da rede de distribuição e qualidade da água será visível com a materialização, primeiro, de um laboratório cujo objectivo é testar o líquido e, segundo, ligar mais lares à fonte com a conclusão do estudo geológico das águas do subsolo de Vilanculos.

Efectivamente, existem em funcionamento 1500 bancas, 50 estabelecimentos comercias, duas agências funerárias, uma clínica, diversos restaurantes, uma fábrica de agro-processamento, 33 carpintarias de pequeno porte, duas padarias e 17 oficinas de pequeno porte. Estas actividades asseguram 2789 postos de trabalho. O Estado emprega apenas 719 munícipes e o sector privado seis vezes mais . O total de pessoas assalariadas é de 4200 cidadãos.

Na área do comércio existem 1200 pessoas empregadas. A reabilitação e requalificação da marginal, um sonho antigo do actual edil, poderia, de acordo com as suas estimativas, gerar cerca de 700 postos de trabalho. Esse sonho custa 11 milhões de dólares, um valor muito acima das receitas municipais que rondam 1.5 milhão de dólares por ano.

Na verdade, 14889 cidadãos estão em idade de trabalho. Portanto, excluindo os que procuram emprego pela primeira vez, a população economicamente activa é de 9383 pessoas o que, de acordo com dados do Administração Estatal, reflecte uma taxa implícita de desemprego e subemprego estimada em 46.4 porcento.

O aspecto da vila, diga-se, poderia ser melhor não fosse a proliferação de cercas com base em plantas espinhosa no centro e arredores da autarquia. Fala-se, para colmatar esse desinteresse pela estética visual, numa campanha de sensibilização, uma vez que não se trata de falta de dinheiro como as construções atestam. É um problema cultural que representa uma nódoa na imagem de uma vila que reivindica o estatuto de cidade.

 

Edifícios

Diferentemente das grandes superfícies urbanas, 95 porcento da população de Vilanculos têm casa própria. O número de pessoas que alugam o espaço onde moram é praticamente insignificante e partilha uma característica: não é população nativa. Ou seja, os estudantes e os funcionários afectos ao Aparelho de Estado provenientes de outros pontos do país é que dão corpo aos 3 porcento dos citadinos que alugam residências.

No entanto, ter casa própria não significa habitação de qualidade. 59.6 porcento das casas de Vilanculos têm paredes de caniço ou paus. 12 porcento dos edifícios apresentam tecto de laje ou betão. 84 porcento contam com cobertura de chapa de zinco. No que diz respeito ao piso, a situação é bem melhor. 77.2 porcento dos lares dispõem de um piso feito com material durável.

Ernesto José, de 24 anos de idade, vive numa palhota com um pavimento de terra. É apenas um número e representa os 3 porcento de estudantes que fugiram da dura realidade de partilhar um quarto sem portas com mais três colegas no lar de estudantes e preferiram alugar uma residência própria.

Na mesma situação de Ernesto encontra- -se o grosso de estudantes da Escola Superior de Extensão Rural. Na verdade, um lugar no lar custa a módica quantia de 2500 meticais e as condições oferecidas não agradam. A solução é encontrar uma casa de caniço e mudar-se de armas e bagagens para a aventura de movimentar os cordelinhos do destino conforme o seu próprio arbítrio.

Na prática é bem mais barato. Uma casa de caniço com cobertura de zinco custa 1000 meticais e oferece uma privacidade que o lar não concede. O problema desta aparente liberdade dos estudantes é a promiscuidade que permite. Muitas estudantes vivem literalmente em união de facto. Alguns “casais” já têm rebentos frutos de uma relação que começou num local onde foram parar para se formar. No meio desse caos do lar, os estudantes vivem como baratas tontas sem saber que a direcção da ESUDER trama contra os seus destinos. O internato é disso um exemplo flagrante.

Enquanto a discussão decorre sobre as vantagens e desvantagens do espaço próprio, o destino de centenas de estudantes passa pela construção das novas instalações da Universidade Eduardo Mondlane em Vilanculos. Há uma equação a ser resolvida que envolve melhorar a vida de uma maioria de estudantes que se especializou em sobreviver. Contudo, a ESUDER é uma encruzilhada, o ponto de paragem da juventude antes de prosseguir rumo à inevitável independência.

 

Caçadores

Como em todos os pontos do país onde o turismo oferece alternativas de sobrevivência aos moçambicanos, em Vilanculos a ideia de muitos jovens com aversão ao trabalho é caçar turistas que, aos seus olhos, parecem incautas. Adolescentes da periferia pouco dados aos estudos crescem embriagados pela possibilidade de atravessar o continente e conhecer a Europa no colo de uma branca possuída de amor por um africano. Aos fins-de-semana, ocupam as praias exibindo músculos para as turistas de tez branca que procuram um pouco de sossego nas paradisíacas praias de Vilanculos.

João, como quer ser tratado, diz que um dia vai sair da pobreza com uma europeia. Apesar da concorrência, jovens e adolescentes cortejam as turistas sem brigas. À noite, quando metade de Vilanculos dorme, eles deambulam pelos bares. Na parte mais baixa da vila, a história de João repete- se. Jovens sonham com formas de conquistar uma mulher com posses. Trabalham com o corpo, vagueiam pelas ruas à procura de trocados e recolhem o que cai na rede. Espalham-se por toda a cidade. E isso explica as reservas das poucas turistas quando alguém de pele mais escura se aproxima.

 

Actividade piscatória

O peixe é muito barato na praia. Um quilograma de garoupa custa, quando adquirido ao pescador, 80 meticais o quilograma. Paradoxalmente, quem ganha dinheiro com o negócio são os revendedores. Maputo é um mercado preferencial de uma classe de especuladores que prospera com um trabalho de um grupo de cidadãos que não se quer organizar. No novo Mercado Municipal os mariscos também são comercializados.

Mas aqui é bem mais caro do que na praia, onde o pescador quer lucro imediato. Por exemplo, um quilograma de lula custa 150 meticais no mercado. Porém, na praia e no balde de um pescador, não sai por mais de 100 meticais. @Verdade não conseguiu ter acesso ao número de cidadãos que vivem da pesca e que retiram o seu sustento nas águas calmas de Vilanculos.

 

Investimento em sectores críticos

O edifício do Município é antigo e situa-se ao pé da Cadeia Distrital de Vilanculos. Actualmente, as receitas próprias da edilidade são insuficientes para encorajar o investimento em sectores críticos da vila com o marginal. Os impostos provenientes da fiscalização não representam sequer dois porcento daquilo que Vilanculos amealha em cada ano.

Só para dar um exemplo, em 2009 as receitas da vila foram de 8.604.832,92 meticais. O fundo de compensação autárquica contribuiu com 48,30 porcento desse valor. Ou seja, 4.153.040,00 meticais. Por sua vez, o Fundo de Investimento de Iniciativa Local significou 38 porcento do bolo. A cobrança pelo exercício económico ofereceu aos cofres do município a irrisória quantia de mil meticais, apenas 1.3 porcento.

A equipa do Vilankulo Futebol Clube é um orgulho da vila que se sente, agora, mais importante por ser uma rota do Moçambola. O lema do clube reflecte a rivalidade entre o município e a capital da província. O clube diz que é o orgulho de Inhambane. Dados em poder do @Verdade indicam que a edilidade despende 250 mil meticais por ano no futebol recreativo.

Uma verba que poderá aumentar com o arranque de actividades no Campo Polivalente de Jogos inaugurado aos 18 de Abril de 2013. Para além do campeonato municipal de futsal que movimenta 250 atletas de várias escolas e bairros, a ideia é introduzir, nos mesmos moldes, o basquetebol.

 

Contexto histórico

Vilanculos é o nome de uma das mais antigas famílias Chope, provavelmente de origem Ntama. Entre 1901-1902 foi sede do Comando Militar (B no 1/1901 e 11/1902). A povoação foi criada pela portaria no 1060 de 23 de Julho de 1913. Pela resolução no 9/87 de 25 de Abril a povoação foi elevada à categoria de vila. A lei no 7/87 de 25 de Abril classifica-a como nível de D. A lei 3/94 de 13 de Setembro determina a criação do Distrito Municipal. Pela lei 10/97 a vila foi transformada em município.

Município de Vilanculos em números

Vereações: 4

Consumidores de energia: 4500

Consumidores com água canalizada: 2500

População com acesso a água: 80 porcento

Habitantes: 41000

Vias de acesso asfaltadas: 10 mil quilómetros

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