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Um bailarino com alma guerreira

Um bailarino com alma guerreira

Na cidade da Matola encontrámos Antoninho Joaquim Mabote, um artista cuja alma “brota” danças tradicionais e modernas que – ao manifestá-las – alegram os que o vêem. Apesar do seu inquestionável talento, a sua relação com a arte não tem sido pacífica. Por isso, para a sua afirmação no sector, muitas batalhas tiveram de ser travadas. O substantivo Antoninho Sotchwa – como mais tarde, carinhosa e popularmente, os seus admiradores o trataram – é sinónimo do seu espírito guerreiro.

Presentemente, o bailarino de 47 anos de idade é residente do bairro Trevo, algures na cidade da Matola. A sua carreira é uma narrativa que se pode relatar a partir de 1986, quando tinha 19. É nessa época que começa a frequentar as casas nocturnas locais. O seu intuito era fazer amizade com a classe artística, com enfoque para os músicos destacados na época. O conceituado cantor moçambicano Mário Ntimane é um exemplo, mas Sotchwa também apreciava imenso as músicas de Lucky Dube bem como dos Soul Brothers, uma banda sul-africana.

Com um rosto de um homem sofrido, nessa altura, cantando ou dançando, é como se Sotchwa não tivesse conseguido impressionar – para não dizer alegrar – os detentores do poder para apoiar os artistas e a sua produção. Faltou-lhe alguém que o visse como um diamante bruto por lapidar ou simplesmente um talento sobre o qual se devia investir.

Como se pode perceber no seu comentário, as dificuldades da época infringiram-lhe uma sanção punitiva cujo impacto se reflecte nos dias actuais: “Comecei a cantar em 1986. Na altura só tínhamos os estúdios da Rádio Moçambique para gravar as músicas. Por essa razão, e sobretudo devido ao elevado número de cantores, não era fácil aceder ao equipamento da estação emissora. Infelizmente, quando decidi apostar noutras vias a fim de gravar o meu primeiro trabalho discográfico, nenhum patrocinador acolheu favoravelmente a iniciativa”.

Naquele Moçambique do período pós-independência, em que as actividades artísticas e culturais pareciam uma espécie de refúgio, Antoninho não encontrou abrigo na arte. “No começo da minha carreira tive a oportunidade de ser membro de banda Cossa, um grupo constituído por membros da referida família, que ao se aperceberem do meu desejo e vontade de aprender integraram-me na colectividade. Fiquei com eles durante um ano, mas depois afastei-me e decidi continuar a trabalhar a solo”.

O artista revela que teve imensas dificuldades para se afirmar como cantor. De qualquer modo, se tomarmos em consideração que, nessa época, os companheiros de Antoninho Sotchwa – muitos dos quais tinham o sonho de se tornarem músicos – acabaram por desistir, podemos assumir que ele é um exemplo de persistência. “Muitos artistas tinham-me dito que a estrada da arte era longa e difícil de percorrer. Ao mesmo tempo, eu havia descoberto que Lucky Dube – um dos músicos sul- -africanos que admiro – também tinha experimentado imensos obstáculos antes de se posicionar como um astro”, refere Sotchwa que explica a fonte da sua persistência na carreira.

Há muito desassossego nas suas músicas que se percebe não somente a partir dos ritmos, como também das mensagens que o artista emite. Estamos diante de um crítico social. Como tal, questões relacionadas com a discórdia, a exclusão social e outros problemas que se registam no seio da sociedade moçambicana são as mais abordadas nas suas composições. Atento e receoso em relação aos problemas enfrentados pela classe artística no/do seu país, Sotchwa não perde a esperança e considera que é preciso lutar continuamente para se ser bem-sucedido.

O pseudónimo Sotchwa

“Não há conquista sem batalha e não há batalha sem guerreiros”, afirma Antoninho Sotchwa, o homem que sentiu a dor da exclusão social no campo das actividades artísticas. Tal como sugere o seu pseudónimo – cujo equivalente em português é soldado –, o cantor lutou e combateu a discriminação e a exclusão social com que se debateu. O seu sonho, esta vontade de querer ser músico conceituado, fê-lo agir como se fosse um verdadeiro militar num campo de batalha. Não desistiu! Enfrentou os obstáculos, que se lhe apareciam ao longo do percurso, com coragem e determinação.

“Os soldados são pessoas que batalham e, mesmo tendo a consciência do perigo, não deixam de ir à guerra. Por isso, resolvi identificar-me com esse nome e essa atitude”, refere o artista. Em conversa com o nosso repórter, Antoninho Sotchwa manifestou a sua indignação em relação aos conteúdos obscenos emitidos em certas composições musicais, no país. Na sua opinião, devia haver uma instituição que avalia a música, antes de ser disseminada, caso tenha mensagens que ferem sensibilidades.

Ao artista não faltam argumentos: “o controlo do tipo de mensagens que o artista emite não é apenas um assunto a ele inerente, mas também ao Estado que tem o papel de dinamizar as actividades culturais no país. Sabe-se que a partir da música também se constrói a imagem da nação”. A preocupação central do artista é a necessidade de se disseminar – através das artes – uma informação socialmente responsável que contribua para o desenvolvimento do país. Por isso, “embora as actividades culturais sejam uma espécie de negócio, temos de saber fazê-las de forma coerente”.

À procura do sucesso

Até 2002, Antoninho Sotchwa já possuía composições suficientes para gravar um trabalho discográfico. Por isso, associou-se a alguns músicos mais experientes, como é o exemplo de Mário Ntimana, com quem gravou o seu primeiro disco intitulado Tatana Sitoe. Cinco anos depois, em 2007, com o apoio dos seus vizinhos, Sotchwa regista o seu segundo trabalho discográfico publicado no mercado nacional. Como um guerreiro determinado, neste ano o artista pretende publicar o seu terceiro disco em Março. A obra contará com 10 temas nos quais fala sobre a sociedade moçambicana contemporânea.

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