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Autárquicas 2013: “Temos uma Assembleia Municipal extremamente oportunista” Daviz Simango, edil da Beira

O presidente do Conselho Municipal da cidade da Beira, Daviz Simango, não afirma que o seu mandato foi positivo, à semelhança de outros edis entrevistados pelo @Verdade, apesar de ter aumentado a capacidade de fornecimento de água, de recolha de resíduos sólidos e melhorado algumas vias de acesso a nível da urbe. Pelo contrário, deixa que a avaliação seja feita pelos munícipes daquele que é o segundo maior centro urbano do país. Porém, Simango diz que a Assembleia Municipal é oportunista, por tentar inviabilizar alguns projectos municipais.

@Verdade – Qual é o balanço que faz do seu mandato?

Daviz Simango (DS) – É daqueles mandatos históricos que ficam marcados, visto que pela primeira vez em Moçambique se encontra uma candidatura independente a vencer e dirigir uma autarquia e esta mesma candidatura independente é secundada pela criação de uma formação política.

De modo geral, dizer que foi um grande desafio porque, apesar de grandes obstáculos, dificuldades e contornos do próprio funcionamento da Assembleia Municipal que não apoia a nossa governação, foi possível levar a cabo os vários projectos do município e aquilo que nos propusemos realizar para o bem-estar dos munícipes. Se formos a avaliar em termos de áreas de acção, começando pelo sector das estradas, a cidade da Beira tem uma particularidade que é extremamente complexa, devido ao lençol freático.

O facto de estar abaixo do nível médio da água do mar e ser uma urbe bastante plana o escoamento das águas é praticamente difícil. Isso requer que as infra-estruturas funcionem de forma perfeita. A construção de vias de acesso, recorrendo ao asfalto, tem-se mostrado ineficiente, daí que o nosso executivo precisou de tomar a iniciativa de avançar com a colocação de pavés, pese embora sejam estruturas caras. Mas são duradouras e de fácil manutenção.

@V – Na componente de acesso a água potável, o que é que foi feito nos últimos anos?

DS – No que diz respeito à rede de água, demos continuidade à parceria que tínhamos com o Fundo de Investimento e Património do Abastecimento de Água (FIPAG). Há vários projectos que decorrem na cidade. Conseguimos expandir a rede em Munhava com fundos próprios pela primeira vez e, igualmente, em Inhamizua. Essas duas povoações não tinham rede de água. Além disso, vários fontenários foram construídos na zona de Nhangau. A nossa vontade é que as comunidades bebam água potável, além de se evitar o problema das doenças de transmissão hídrica.

@V – Há bem pouco tempo a cidade da Beira era conhecida como um dos mais sujos centros urbanos do país. O que se pode dizer dela hoje?

DS – A remoção dos resíduos sólidos constituiu sempre um outro grande desafio. Presentemente, à medida que vamos introduzindo novos equipamentos, quer camiões especializados, quer contentores, temos de alargar a nossa área de acção, porque os munícipes pagam as suas contribuições e isso pressupõe grande capacidade de execução, mas ainda precisamos de ter mais recursos. Este ano, encomendámos mais dois veículos e prevê-se ainda a chegada de pelo menos 60 contentores, mas mesmo assim ainda não estamos satisfeitos.

Cada vez que alargamos a recolha de lixo para novas zonas, significa que a demanda é maior, o número de equipamento é maior e o custo de manutenção também. Por outro lado, continuamos com um desafio que é extremamente difícil de gerir. Os nossos camiões recolhem o lixo todos os dias e é nossa percepção que esse sistema de recolha diária de resíduos sólidos provoca desgaste no equipamento. Se o veículo passasse duas ou três vezes por um contentor, seria muito bom.

O cidadão devia acumular o lixo na sua casa e aí depositaria na estrada na hora prevista para ser recolhido. Outro aspecto interessante é que apercebem-nos de que os homens não davam conta do recado, e tivemos de mudar de filosofia, daí termos introduzido senhoras a conduzirem os camiões. Essa equipa de jovens mulheres está a dar um bom resultado, quer no processo de protecção da própria máquina, quer na velocidade da remoção dos resíduos sólidos.

@V – Qual é o desempenho do município na área financeira?

DS – A nível geral, as finanças municipais são aceitáveis. A nossa capacidade de recolha das receitas é segura, temos um sistema extremamente modernizado de arrecadação de impostos e pensamos que esse banco de dados em termos de gestão financeira facilitou bastante o nosso desafio. Tivemos vários constrangimentos, como as sedes dos bairros que perdemos para o partido no poder e era preciso arregaçar as mangas porque as nossas populações estavam a ser atendidas ao relento, daí tivemos que construir novas sedes.

Neste momento, estamos na fase conclusiva e estamos satisfeitos, afinal de contas acabámos por ter sedes dos bairros com compartimentos amplos e com capacidade de albergar, quer o tribunal comunitário, quer os gabinetes especializados para a juventude, onde foram instalados dois computadores ligados à Internet.

Portanto, os jovens que estão a estudar podem ir até à sede do bairro para fazerem os seus trabalhos de pesquisa, sem pagarem nada, de modo a melhorar os seus conhecimentos académicos. Em termos económicos, Beira tornou-se uma cidade estável. Se nós de facto continuarmos a progredir do jeito que estamos a fazer, não há dúvidas de que este município será uma referência obrigatória na agenda moçambicana.

@V – Todos os dias, devido ao porto, a cidade da Beira tem recebido camiões de grande tonelagem. O que tem a dizer em relação a essa situação?

DS – É verdade, a cidade da Beira é “sufocada” por grandes quantidades de camiões. É um desafio que o município tem de ultrapassar, visto que danificam as nossas estradas e, para fazer face à isso, é preciso que se construa uma nova via de acesso. Há um “master plan” que vai até 2035, onde está prevista a construção de uma via pública a partir da zona da Cerâmica em direcção ao Porto da Beira para desviar os camiões de grande porte, evitando que eles circulem dentro da cidade.

@V – Qual é o tratamento que as autoridades municipais dão à actividade informal?

DS – O comércio informal é uma realidade que se circunscreve àquilo que é a conjuntura moçambicana. Nós, como moçambicanos, não podemos ter vergonha da nossa realidade. Muitos de nós cresceram, foram educados e têm saúde porque os nossos pais sobreviveram vendendo nas ruas.

É verdade que nalgum momento traz algum desconforto, sobretudo quando aparecem épocas de frutas, há certas colheitas que as nossas mães, os nossos pais têm de vender, uma vez que o problema do bolso moçambicano é que é extremamente curto. Muitos de nós recorrem aos mercados informais para comprar roupa e outros bens.

Este exercício todo cria desalento para a urbe, mas é preciso ver quais são os ganhos, e um dos grandes resultados positivos é que o índice de criminalidade baixou, o que significa que aquelas pessoas que eram preguiçosas, ou que olhavam para o crime como fonte de sobrevivência, entendem hoje que devem recorrer ao comércio informal para sobreviverem. É verdade que há muito trabalho de limpeza e condiciona a circulação de viaturas, mas nalgum momento temos de ter a consciência de que estamos a salvar vidas humanas.

@V – O que se pode dizer do Fundo de Redução da Pobreza Urbana na cidade da Beira?

DS – O nosso município tem uma experiência inédita, comparado com aquilo que temos ouvido e assistido: as administrações a entregarem o dinheiro. Na Beira, nós criámos Conselhos Consultivos nos bairros. Os mesmos são eleitos, mas, para promover a transparência, entendemos que devíamos incluir a sociedade civil nos postos administrativos. Ela colabora na selecção, na identificação e na promoção dos projectos a nível dos postos.

Existe aquilo que chamamos “apuração técnica” composta por oito elementos, entre técnicos profissionais assistentes, dos quais cinco são do Conselho Municipal e três da sociedade civil. Os que recebem os projectos do Conselho Consultivo vão ao terreno verificar se existe capacidade para a sua execução, se é viável ou não. Depois propõem ao executivo. A edilidade limita-se apenas à orientação e a instruir a instituição bancária. Há dias, tivemos que assinar um contrato com o Banco Terra para a entrega dos valores. O Conselho Municipal não toca nesse dinheiro. Tanto os vereadores, directores, administradores, assim como os secretários dos bairros estão interditos de beneficiar desse fundo, incluindo os membros do Conselho Consultivo.

Nós já tivemos a oportunidade de explicar que, uma vez querendo os fundos, devem renunciar ao cargo, colocar-se na posição de um simples munícipe e solicitar os valores. Já tivemos a devolução no primeiro ano. A cidade da Beira recebe 14 milhões e 960 mil meticais e o reembolso foi de pelo menos oito milhões de meticais. Esse é um sinal de que o município conseguiu, via banco, realizar um bom exercício financeiro. Esses oito milhões que já foram devolvidos, hoje já estamos a dar a outro grupo.

@V – Por que razão a gestão de Transportes Públicos da Beira (TPB) ainda não passou para a edilidade?

DS – Essas questões, quer a educação, quer a saúde, continuam a manter- se sob um panorama político. Há uma ligação por interesses políticos; como pode imaginar, as autoridades municipais de Pemba têm educação e saúde primárias. Mas no caso concreto dos transportes, submetemos um projecto de criação de uma empresa de transporte público municipal e a partir desta iríamos abordar dois cenários.

O primeiro seria receber os TPB com as dificuldades e os desafios que têm, e o outro seria criar uma nova estrutura que não funcionasse como acontece actualmente. Isso significaria que o município iria negociar com vários parceiros e instituições financeiras, até o Ministério dos Transportes e Comunicações, no sentido de adquirir autocarros que têm sobressalentes e com facilidade de fazer a sua manutenção.

Isto iria criar uma certa concorrência aos “chapa 100”, além de minimizar o sofrimento da nossa população. Há “encurtamento de rotas” e a edilidade tem feito o seu trabalho de boa forma. Nós pensamos que com viaturas próprias, nas horas da ponta, seriam afectos às zonas críticas e isso seria um alívio para os utentes.

@V – Grande partes dos edis entrevistados pelo @Verdade afirma ter cumprido o seu manifesto em mais de 90 porcento. Qual é a avaliação que faz do seu manifesto?

DS – Nós não gostamos de ir por esse ponto, vamos deixar que os munícipes façam a avaliação. A nossa consciência diz-nos que cumprimos a missão, fomos fazendo coisas que não estavam previstas; por exemplo, assegurámos que a cidade da Beira tivesse um auditório municipal.

Além disso, é uma das primeiras cidades que, recorrendo a fundos próprios, está a construir uma Assembleia Municipal. Nós queremos criar uma assembleia forte, que seja capaz de acompanhar o interesse dos munícipes. Mas, infelizmente, temos uma assembleia extremamente oportunista, especializada em inviabilizar os projectos municipais, e não é isso que nós queremos.

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