Considerada hoje uma verdadeira instituição moçambicana
Cidadãos tornam a carrinha de mão uma grande empresa para fazer a vida. Vulgarmente conhecida por tchova é, actualmente, a nova fonte de rendimento dominante nas zonas urbanas do país e sustenta milhares de famílias no dia-a-dia.
Nos últimos dias, acentuou-se o número de tchovas recheados de produtos alimentares e, como é normal, com alguém a empurrar e/ou a vender estes produtos. É também comum ver cidadãos com esta fonte de rendimento nas ruas de Moçambique a transportar bens para diversos locais, ferro velho para as sucatas, incluindo doentes para postos de saúde, entre outras coisas. Parece mesmo que os tchovas constituem uma verdadeira instituição moçambicana. O aperto da vida pressiona o Homem a procurar formas de viver ou, mais especificamente, a garantir a alimentação do dia-a-dia.
O @Verdade ouviu Soares Fernando, jovem de 23 anos. Ele aluga um tchova por 25 Meticais por dia e carrega produtos ou bens dos seus clientes para os destinos desejados. Soares trabalha com o tchova há 3 anos. Neste período de tempo, granjeou a confiança dos seus clientes, e, por isso, a maioria destes entrega-lhe uma determinada carga e ele leva-a ao destino sem ser acompanhado. Em relação ao preço cobrado por carga, diz que isso depende muito da distância e da quantidade. Este é um facto que o leva a afirmar que esta é uma boa profissão, mas, como não deixaria de ser, há dias em que os clientes rareiam. Quando tal acontece, como Soares não tem como provar ao dono da carrinha que não obteve nenhuma receita, tem de pagar o aluguer à mesma. Este jovem explica que abraçou esta profissão a convite de um amigo que já fazia este trabalho há anos. Outro jovem contactado é Félix Mário, de 21 anos, que comercializa produtos alimentares na avenida Mao Tsé Tung, perto do banco Barclays. Vende a 20 Meticais o quilo de tomate, a 20 o de batata reno e a 15 Meticais o de limão. O nosso interlocutor diz que compra estes produtos no mercado grossista do Zimpeto e, geralmente, adquire 2 caixas de tomate por 510 Meticais, 1 saco de batata reno por 120, 8 quilos de repolho por 7 Meticais cada, meia lata de limão por 65 Meticais, mas o preço de compra varia. Félix diz que por estar a vender na rua, não paga imposto ao Conselho Municipal e, quando a polícia municipal aparece, ele empurra a carrinha para um lugar distante evitando, deste modo, a confiscação dos seus produtos. “Os polícias já me surpreenderam 3 vezes e levaram todos os meus produtos. E quando fui ao Conselho Municipal para recuperar os meus produtos, eles exigiram-me a licença de vendedor ambulante e disseram-me que, caso eu não a tivesse, dariam os meus produtos aos pobres.” Este vendedor ambulante defende que na altura em que comprava os produtos no mercado de Malanga, o negócio era proveitoso, pois no regresso vendia os produtos de casa em casa, mas agora é mais difícil porque adquire-os no mercado de Zimpeto, onde, por ter de pagar o “chapa” fica mais caro. Félix ganha cerca de 1800 Meticais por mês e subtrai alguma parte do lucro para a mãe (viúva) que vive na província de Inhambane. O nosso Jornal ouviu também Victor Manuel, natural de Quelimane, que se dedica à venda de ferro velho que compra em residências particulares e transporta no seu tchova para o comercializar nas sucatas. O nosso entrevistado diz que ganha por mês cerca de 2000 Meticais dos quais retira 65 Meticais por mês para pagar ao dono do tchova. “Muitas vezes, passo por muitos bairros e não apanho ferro velho. Faço este trabalho desde 2002.” Segundo Victor, as sucatas compram todo o tipo de ferro que é vendido a quilos nas sucatas, mas nas residências é vendido a preço aleatório. Um outro entrevistado é Paulo Marcos, jovem de 38 anos, que usa o tchova para transportar pessoas doentes no Bairro de Guava. Este empreendedor diz que já é conhecido por toda a zona porque faz este trabalho há 8 anos. Com o dinheiro que consegue deste humilde emprego, Paulo diz que sustenta a sua família. “Às vezes, levo pessoas doentes para o hospital, aliás, faço todo o trabalho. Geralmente,os meus clientes chamam-me para transportar vidros ou ovos em grandes quantidades. Sinto muito orgulho no que faço.” Segundo Paulo, este trabalho é desprezado por muita gente, só se começa a valorizar quando as pessoas já não têm do que viver, ou seja, um emprego. “Quando um meu tio se mudou para Quelimane ofereceu-me este tchova. E com o tempo aprendi que devemos valorizar o nosso trabalho, só assim o faremos com perfeição.”
Olho de fora…
Na óptica de Nelson Ferrão, comerciante que se instalou perto da avenida Mao Tsé Tung, os tchovas hoje em dia são, na verdade, uma fonte de rendimento porque sustentam famílias e ocupam uma grande parte da camada juvenil. “Em frente da minha loja estão muitos jovens a vender produtos diversos nos tchovas. Muitos outros querem entrar neste negócio porque cobiçam o sucesso daqueles.” Segundo este comerciante, os jovens perdem-se em muitas coisas más, como o banditismo, quando existe uma forma sã de sobrevivência. Na condição de anonimato, uma senhora comerciante também acredita que os tchovas mudam a vida de muitas pessoas. “Estes jovens que estão aqui não passam fome, pelo menos têm o que comer todos os dias. O único problema é a polícia que não os deixa fazer o seu negócio por causa dos impostos. Os polícias perseguem-nos e arrancam os seus produtos, complicando a sua vida.”
Clientes satisfeitos…
Maria Mahuaie é cliente de Félix Mário há anos. Geralmente compra na carrinha de Mário os produtos para a alimentação porque este vende perto do seu prédio. “Gosto muito de comprar na sua banca porque ele é simpático e, muitas vezes, levo os produtos de que necessito e só pago no final do mês.” O nosso Jornal entrevistou Nuno Martins Sambo, residente do Bairro Jardim. Este cliente de Soares Fernando afirma que gosta do comportamento deste último porque sempre que lhe entregou bens para os levar à sua casa, ele fê-lo com zelo. “Sinto que nem preciso de controlá-lo porque ele cumpre sempre. Ele é um bom rapaz e respeita os seus clientes, por isso tem muitos clientes.”