O tailandês Apichatpong Weerasethakul, de 39 anos, ganhador da Palma de Ouro do 63º Festival de Cannes com “Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives”, é autor de filmes experimentais e singulares que ultrapassam o sobrenatural. “Na selva, nas colinas e nos vales, nossas vidas anteriores, em forma de animal e outras, ressurgem para mim”, afirma o protagonista do filme premiado, o tio Boonmee, um idoso que chegou no fim de sua vida.
Afetado por uma insuficiência renal aguda, prepara-se para a morte conversando com sua cunhada, e com a mesma naturalidade fala com sua esposa e seu filho, mortos anos antes. Seus fantasmas aparecem para ele, um com forma humana, o outro com forma de macaco, e o tio Boonmee também se prepara para sua última viagem, sinônimo de reencarnação para Apichatpong Weerasethakul.
“Acredito na transmigração das almas entre os homens, as plantas, os animais e os fantasmas”, explica Apichatpong Weerasethakul. “Além disso, me interessei (no filme) pelos processos de destruição e extinção das espécies e culturas. Nestes últimos anos na Tailândia, o nacionalismo incitado pelos golpes de Estado provocou confrontos de ordem ideológica”, acrescenta.
Nascido em 1970, Apichatpong Weerasethakul é autor de um cinema singular que foge das convenções cinematográficas e do tratamento do tempo, mescla atores profissionais e amadores, concede um espaço considerável a uma natureza fascinante e sobrenatural. Originário de uma província do nordeste da Tailândia, na fronteira com a Birmânia, estudou arquitetura antes de viajar para Chicago, onde aprendeu sobre cinema experimental e arte contemporânea.
De volta à Tailândia, iniciou um trabalho como artista plástico, montou instalações de vídeo antes de filmar seu primeiro longa-metragem, “Mysterious object at noon”, que estreou em 2000. Com sua própria produtora, chamada Kick the Machine Filmes, pôde realizar um cinema independente e experimental à margem da indústria tailandesa do cinema, mais dedicada à produção do cinema de ação. Fora do sistema tailandês de produção, realizou seu segundo filme, “Blissfully yours”, que enviou por correio ao Festival de Cannes, onde conquistou o Prêmio da mostra “Um Certo Olhar”.
Dois anos depois, voltava ao festival com “Tropical malady”, história de amor entre um soldado e sua amante filmada na selva tropical. O filme, que mesclava mitologia e imaginário, venceu o Prêmio do Juri graças a sua grande beleza plástica. Em 2006, “Syndromes and a century”, autorretrato centrado em suas lembranças de infância, foi o primeiro filme tailandês candidato ao Leão de Ouro no Festival de Veneza.