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Sobreviver numa cadeira de rodas – O engenho que vem da necessidade

Sobreviver numa cadeira de rodas - O engenho que vem da necessidade

 

     O veredicto médico foi terrível para Nguluve: diagnosticaramlhe um cancro e amputaram-lhe a amputar os membros inferiores para que a doença não se alastrasse. Hoje, sem assistência social que lhe valha, para sobreviver, o ex-pedreiro, aluga a sua carrinha de rodas às crianças do bairro.

     O ano de 2008 corria lento, Nguluve trabalhava como pedreiro. A vida, essa corria de feição. Aos 39 anos, era óbvio para a mãe de Nguluve que o filho ia morrer pedreiro. Ficaram, pois, um pouco surpreendidos quando ele não conseguiu vencer uma infecção que lhe provocou feridas na perna direita, depois na esquerda. De início, o médico disse que era só uma ferida: “não havia motivos para alarme”. No entanto, a infecção foi progredindo e um outro médico, prático e decidido, estava convencido de que era algo mais sério.

     Finalmente, os médicos detectaram cancro: “Amputaram a perna direita, meses depois foi a vez da esquerda”. Quando Nguluve percebeu que não era como os outros, já estava numa carrinha de rodas. Lembra-se dos primeiros dias, das dificuldades para se deslocar e, de repente, ver as pessoas a locomoverem-se alheias a ele. “Assim não consigo viver”, pensou. “Ninguém ajuda, estão todos aterafedos com os seus problemas…”, foi a primeira vez que compreendeu que já nada seria como dantes, era diferente das pessoas que podiam levantar-se nas pernas e ficar assim, tão altas.

     Para se mudar de vida, qualquer dia pode ser bom. Com Nguluve, a cadeira de rodas garantiu-lhe a sobrevivência num dia igual aos outros, sem ele se dar conta. Num dia era um jovem pedreiro que vivia de biscates, com um emprego mal pago, noutro estava entrevado numa cadeira de rodas e foi nela que encontrou a solução para arrecadar algum dinheiro.

     A luz no fundo do túnel surgiu num dia indistinto, estava quente e um miúdo pedilhe para subir na sua cadeira e a seguir deu-lhe 2 Meticais. De uma coisa não tem dúvidas: descobriu como ganhar a vida.

     Na primeira pessoa conta-se melhor: “A minha mãe e os meus quatro irmãos, depois do que me aconteceu ignoraram-me, então tive de me virar para comer. Foi assim que depois daquele miúdo ter pago comecei a alugar a cadeira aos miúdos do bairro”.

     Nguluve começou a alugar a cadeira de rodas, essa extensão móvel de si mesmo. Para o efeito, carrega crianças na parte de trás e cobra um Metical por volta, num espaço de 40 metros. No final do dia arrecada, pelo menos, 20 Meticais.

     Apesar de viver com a mãe, Raulina Julai, e quatro irmãos, é obrigado a confeccionar pessoalmente as suas refeições, contudo, a progenitora lamenta a situação do filho, mas diz que nada pode fazer porque também carece de ajuda.

Autoridades do bairro

     As autoridades do bairro, incluindo a população local, lamentam o caso, mas reconhecem-se impotentes para mudar o curso dos acontecimentos, porque impedir Nguluve de alugar a cadeira de rodas, implicaria criar condições para a sua sobrevivência.

     “Neste momento, nós que somos a autoridade do bairro, não temos recursos para providenciar assistência social, em particular alimentar, àquele deficiente e a outras pessoas portadoras de deficiência”, referiu José Matlombe, secretário do bairro de Mavalane B.

     Entretanto, como Nguluve, em Moçambique, há muitos deficientes no estado de vulnerabilidade, a ter fé nos dados fornecido pelo Departamento dos Deficientes, Idosos e Reinserção Social, do Ministério da Mulher e Acção Social (MMAS), que indicam que, do total de 8.255 defecientes idetificados, até meados de 2008, apenas 4.066 beneficiam dos programas de assistência social

     No entanto, “no seio dos portadores de dificiência, prevalece uma total ignorância no que diz respeito às instituições onde se podem dirigir em casos de necessidades extremas”, refere José Manuel, técnico do MMAS.

     A fonte considera bastante preocupante a situação em que se encontra Manecas Joaquim Massitela Nguluve, mas sublinha que para o indivíduo poder beneficiar da devida assistência, é necessário que se aproxime dos órgãos competentes.

     “A nível do bairro onde aquele cidadão vive, há autoridades que podem encaminhálo aos órgãos de direito, de forma a passar a beneficiar dos programas de assistência social”, frisou aquele funcionário sénior do MMAS.

 

 

 

     À primeira vista parece uma pocilga, mas tratase do quarto de um ser-humano. Aliás, chamar de curral o local onde Nguluve dorme é um eufemismo. A começar pelo exterior, desde as paredes de caniço até a porta, está tudo a cair aos pedaços. Só que ao contrário das pocilgas, ninguém cuida dos aposentos do jovem deficiente. O interior faz lembrar um inferno de depósito humano, os pratos há muito que não sabem o que é água. A casa de banho improvisada, dentro do quarto, onde toma banho e faz as necessidades, são três bidões de 20 litros adaptados a alguidares e está posicionada a menos de um metro do espaço onde Nguluve toma as refeições. O acesso à água é um calvário para Nguluve – o fontenário mais próximo da sua residência dista a 200 metros. Não fosse a solidariedade das crianças da zona, nem teria água para beber. Mais grave ainda é que a intermitência com que consegue o precioso líquido fez com que descurasse
a sua higiene pessoal, situação que vêem contribuindo para a degradação acelerada do seu quadro clínico.

 

     O Governo tem programas de geração de rendimentos que tem como finalidade ajudar os deficientes a tornarem-se autosustentáveis, através de crétidos concedidos para investimento em diversas áreas de actividade económica e produtiva.

     No quadro daquela iniciativa, o deficiente pode beneficiar dos fundos, devendo apresentar, para o efeito, um projecto concreto da actividade que pretende desenvolver, com objectivos claros e bem fundamentados.
     Ainda no que diz respeito à assistência social dos portadores de deficiência física, o Governo tem, igualmente, um programa de subsídio alimentar para os que se encontram no estado de maior vulnerabilidade.
     No campo político, o executivo tem aprovado vários instrumentos jurídicos, com realce
para a legislação referente à defesa de pessoas portadoras de defeciência, aprovada pelo Conselho de Ministro, a 23 de Junho de 1999.
     Outro dados na posse do nosso Jornal indicam, também, que foi aprovada em 2006 um Plano Nacional de Acção que se destina a melhorar a assistência social da pessoas portadoras de deficiência, até 2010.

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