Eu tenho um sonho…
Não posso? Não consigo? Não devo? Não está certo?
Pois… essas são as questões que ecoam na cabeça de muitas mulheres em diversas partes do mundo…e em Moçambique não é diferente!
E é incrível pensar que há muito tempo nas civilizações da antiguidade realizavam-se cultos de adoração à mulher, à Deusa da fertilidade e da maternidade.
E hoje, deparamos com situações de desconsideração e desrespeito gritante contra a mulher. A mulher em Moçambique é discriminada, limitada, e violentada de todas as formas imagináveis e possíveis!
Por isso eu tenho um sonho! Eu quero viver num país em que não sou tratada como um ser humano de segunda categoria, um ser humano de capacidades limitadas, e do qual não se pode esperar muito!
E no nosso país, os costumes, a tradição e a família constituem alguns dos factores mais relevantes na distorção da apreciação objectiva das capacidades da mulher…as famílias têm a concepção de que o lugar das meninas é em casa, primeiro ajudando a mãe nas tarefas domésticas…e mais tarde cuidando do marido e dos filhos!
Quem olha Moçambique do lado de fora, pensa “Uau, um exemplo da implementação da Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e da prossecução do 3º dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio!”… Mas infelizmente não é assim!
Ainda que haja uma grande presença de mulheres em posições de liderança, elas são como um grãozinho de areia…pois grande parte (para não dizer quase todas) das mulheres moçambicanas ainda sofre com uma estrutura social machista repressiva, enfrentando dificuldades no seu quotidiano, que vão desde problemas de inserção no mercado de trabalho a esferas domésticas atrozes…! E eu tenho um sonho…e o meu sonho são essas mulheres!
Aqui (em Moçambique) até existe uma lei contra a violência doméstica… mas… não parece! Os casos de violência física (agressão) e violação sexual contra a mulher multiplicam-se a cada dia…mas ninguém toma atitude alguma! E quando a violência é emocional, verbal, psicológica ou económica… a situação é muito pior…como não há hematomas, ninguém liga… “não houve nada”!
E eu digo, mais uma vez, eu tenho um sonho… que é um mundo em que as mulheres terão o controlo sobre o próprio corpo…apenas isso! Porque é essencial ter-se a consciência de que a violência contra a mulher é uma forma de discriminação, e transcende o plano em que ocorre, e constitui uma violação dos direitos humanos, com consequências nefastas, no circuito familiar, social e até estadual.
E o Estado? O que é que faz?
O Estado é extremamente passivo…peca por meio da omissão! Principalmente, nos casos de violência, percebe-se que, muitas vezes, primeiro, a própria polícia tem um comportamento hostil em relação às denúncias, e depois, os agressores não são responsabilizados; e no âmbito laboral, as mulheres encontram-se muitas vezes em trabalhos precários e desamparadas pela legislação laboral em muitas situações, por exemplo, já está mais do que comprovado, que ainda que haja igualdade de oportunidades e acesso ao trabalho, não há igualdade salarial! Não faz sentido!
Eu tenho um sonho para o Estado moçambicano!!! Esse sonho é um Governo interventivo, que toma medidas, de modo a inserir a mulher no mercado do trabalho, no mundo dos negócios, na política e na cultura… Ou seja, um Governo com a consciência de que, enquanto não se elevar o status da mulher, dificilmente se irá atingir a estabilidade em qualquer vector, seja ele social, cultural, político ou económico.
Por esses e muitos outros motivos, eu me pergunto: Porque continuarmos a viver numa sociedade baseada no sexismo? Uma sociedade baseada na discriminação?
Eu tenho um sonho…e o meu sonho é com o dia em que vamos abrir os olhos para a neutralidade das oportunidades e, consequentemente, dos papéis sociais; ver que eles não dependem do género ou do sexo, mas sim das capacidades de cada um como ser humano!
Tem de se compreender que a mulher desempenha um papel crucial na sociedade, no desenvolvimento de um país, sendo que a sua actuação tem efeitos em vários domínios… um dos quais é, de certa forma, espantoso, que é o caso do domínio ambiental!
É mesmo verdade… basta pensar que um dos principais problemas ambientais da actualidade é o aumento demográfico; e para se resolver o problema demográfico é necessário melhorar o status da mulher, promovendo possibilidades de estudo e emprego para ela.
Então, eu posso dizer que eu tenho um sonho, que é um ambiente saudável e equilibrado…e uma das formas de consegui-lo é expandindo as oportunidades da mulher, e fomentando uma “igualdade” relativa entre o homem e a mulher.
Entretanto, como as maiores interessadas, nós mulheres devemos tentar – com o que tivermos, por mais insignificante que possa parecer – cultivar a mente, a auto-estima, de modo a vencer até a discriminação que se esconde, de forma directa ou indirecta, atrás da desigualdade nas expectativas em relação à nossa actuação; e vencer essa parcialidade que há na interpretação das nossas capacidades.
E também, devemos confiar na outras mulheres, e por isso eu tenho um sonho…Sonho com um mundo, com um país em que nós as mulheres acreditemos no potencial das mulheres para governar. Pois, por mais contraditório que possa parecer, nós somos, simultaneamente, o maior empecilho na luta pela queda da sociedade machista, e também a maior força para que tal aconteça.
E por fim, como uma mulher, eu posso gritar EU TENHO UM SONHO- …e Senhoras como a Graça Machel, a Michelle Bachlet, a Asha-Rose Mijiro, a Hilary Clinton, a Ellen Johnson, entre outras, são uma prova da luta pela causa das mulheres!
Todos nós precisamos de sonhos, pois quem não tem sonhos não tem objectivos na vida…e uma vida sem objectivos não vale a pena ser vivida!
