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SELO: Vale a pena (ainda) falar de ética em Moçambique? – Por Artur Capitão

Provavelmente a sua resposta seja “sim” ou “porque não?”, no entanto, muitas são as penumbras que norteiam os valores éticos actualmente na sociedade na qual estamos inseridos. Sem necessariamente centrar a abordagem na definição da ética (que não é objectivo do texto), julga-se necessário rever alguns conceitos, que por hora são mais parecidos ao significado de ética. Todavia, sem esses conceitos torna-se impossível qualquer abordagem sobre esta matéria.

“Ética é um adjectivo substantivado em cuja origem etimológica encontramos dois termos gregos: ???? (éthos), costume, uso, maneira (exterior) de proceder, e ???? (êthos), morada habitual, toca, maneira de ser, carácter” (Cabral, 2003:33). Portanto, Ética é um conjunto de valores morais e princípios que norteiam a conduta humana na sociedade, pode-se ainda definir como “princípios universais, acções que acreditamos e não mudam independentemente do lugar onde estamos”.

Nas carreiras estudantis, (Medicina, Gestão Empresarial), o autor do texto foi-lhe instruído que a ética é a chave para boa prática de qualquer actividade, em todas as esferas da vida, e não só, a ética é importante para a justiça e equilíbrio social, motivo pelo qual os actos e práticas com pouca ou sem nenhuma circunspecção, levam a questionar se ainda vale a pena falar de ética em Moçambique.

Se, aceita-se que a ética é o conjunto de normas que caracteriza um determinado grupo de pessoas, e que por definição visa o bem, as boas normas e o paradoxal momento o qual vive-se na outrora pérola do indico e actual “pátria de heróis”, ou será um tipo de ética peculiar a Moçambique e aos moçambicanos? Seria nesse caso Moçambique uma Ilha ou uma nação mutante com valores éticos jamais antes vistos e de complexibilidade major o que não equipara este país a qualquer outro neste planeta?

Que valores são, quando os mais velhos, que antes eram os “role models” da sociedade hoje são precursoras de atrocidades que afectam mais de ¼ de centena de milhões de pessoas? Vale ainda, por mais que seja por só falar, insistir na ética quando governos e governantes, eleitos com o desiderato de resolver problemas, inversamente trabalham ao cobro do diabo na génese de intempéries para o seu próprio povo? Que valor, que ética caracteriza um governo que quando toca o alarme do fim da sua lua-de-mel empenha-se no endividamento que antes de insustentável, é escondido, profano e de necessidade vazia?

É Ético falar da agricultura como “base da nossa economia” enquanto biliões de dólares são gastos em negócios cuja única vantagem é o clientelismo de quem os encabeça, com lesão clara de toda nata de um país? Estaria aquele artigo 103 da Constituição da Republica de Moçambique obsoleto e carecendo de uma actualização?

Qual é o enquadramento ético quando seres da mesma prole sustentam pactos com diabos para manter um conflito armado, que no final do dia só mata o pacato e pobre individuo, que de cidadão nada tem (se preferir-se a definição da antiga PM Luísa Diogo, há poucos cidadãos em Moçambique). Afinal quanto vale uma Guerra? E qual é o custo da paz? Obviamente, cada um sente o sabor ao seu paladar. A política tornou-se apetecível no período hodierno porque é uma actividade que se labuta sem observância de ética alguma, ou ao mínimo com uma ética “extraterresticamente” mutante, a qual pode-se inovar, reinventar, diga-se por mais apetecível pareça, e ainda mais, ganhar-se milhares de meticais a cada pôr-do-sol.

Pode-se falar de ética, quando um economista na sua plena integridade mental chama sobre si os “conhecimento económicos”, e em um órgão de informação, diga-se de carácter público, afirmar que a actual inflação (subida de preços) não tem a ver com o fardo financeiro que homens adultos (alguns idosos) com uma batuta egoísta voluntariamente decidiram “namorar”. Pode-se?

Recentemente a comunicação social foi invadida por notícias desabonatórias de uso de armas brancas em uma escola muito bem localizada na capital, e o concluo consumo de drogas ilícitas psicoactivas dos escolares (2), e como é previsível, uma série de debates que questionam a moral dos escolares dominaram as manchetes, as conversas nos cafés e “chapas-cem”, com argumentos ricos em palavras, porém pobres em conteúdos e objectivos na tentativa de explicar as anomalias da mocidade, no entanto, ninguém estranhou que esta mocidade vive nesta sociedade de valores improvisados, onde o anormal domina, o ilícito é vendido, a impunidade é um vício… Uma disfunção orgânica leva a falência de todo sistema e dai para todo organismo, é uma matemática simples. A ética desvaneceu… Os crimes vêem de todas as idades, confunde-se com momentos apocalípticos, manchetes como “…Casal espanca filho até à morte em Manica (por ter roubado 300 meticais)…”(3) ou “…Jovem mata os pais para aproveitar-se de 10 mil meticais”(4) amiúdes invadem os ecrãs das famílias moçambicanas.

A crise financeira é apenas o iceberg de tantos desajustamentos que essa sociedade enferma: honestidade, longanimidade, sinceridade, educação e claro a ética.

É um sinal de colapso social quando a mentira sobrepõe-se ao valor da sinceridade. Não é mentira daquelas feita a “cabra-cegas” pelos menores da primária, mas sim aquela feita por gente graúda, como o caso de ministro de economia quando disse “a crise financeira não vai se reflectir no bolso do cidadão”, numa altura em que o metical já estava depreciado em mais de 80% num ano. Isto é, em que os preços de produtos básicos registavam uma subida de mais de 80%. Importante referir, o ministro da economia é dos mais “respeitados” economistas do país, apenas ele é que não se respeita, quando falta com a verdade.

Não pode existir uma sociedade atípica. Mesmo as “comunidades” dominadas pelos narcotraficantes há valores, normas e o mais importante espírito de prestação de contas. Uma nação jamais terá jovens promissores se o legatário é um saco de mentiras, promessas, violência, intolerância. Não se pode cultivar feijão e colher-se trigo, nem comer couve e arrotar lasanha. São matemáticas simples. Se os valores éticos são adulterados, o adultério estará em todas as esferas. “Aprenda com os mais velhos…” diz o ditado, se os nossos mais velhos de velho só têm o cabelo branco, claro, os mais novos de novo se terão as mutações de desajustamentos de comportamentos.

Por Artur Capitão

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