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SELO: Uma infância adulta na e pela guerra? – Por Wilson Nicaquela

Não pretendo gozar a ninguém com a minha velhice que, por circunstâncias da vida até, acabou chegando mais cedo “precoce”. Quero justificar o porquê da minha preocupação com esta guerra que nunca irá existir para alguns moçambicanos obcecados pelo “AUTISMO”.

Eu nasci e cresci em ITOCULO, no distrito de Monapo, nas imediações de um dos vários Centros de Reeducação criados na época, a vida naquela zona não era facilitada.

Qual é o problema com isso???

A Sede desse Posto Administrativo, foi transferida, donde funcionava para o bairro da “Ofensiva Militar” uma unidade residencial criada pelo saudoso chefe e carismático líder da zona #Domingos_Muchara, devido a constantes ataques da Renamo, que até chegou de destruir a EP1 e o edifício do Governo de Itoculo.

Até aqui estava tudo bem. Aliás, aparentemente estava-se na zona mais segura de todo Posto Administrativo de ITOCULO, pois, no Centro havia todo tipo de material bélico inclusive B11, montado numa das montanhas envolta ao complexo prisional. Nós crianças da época fazíamos referência sincreticamente das armas pesadas, eu não sei porque ainda me lembro….. Qual segurança? Nossa ilusão….. A desilusão apareceu numa madrugada de agosto de 1991, cuja data a infância me arrancou.

Os “Bandidos armados” daquele tempo, os chamados Homens armados, forças residuais ou segurança pessoal de DHLKM, ou sei lá….. Planejaram um assalto, e tomaram o Centro, fizeram vítimas mortais que só os militares sobreviventes sabem dizer do número……, era o fim de uma segurança generalizada da zona e início de uma vulnerabilidade que duraria até meados de Setembro de 1992.

O trauma não parou aqui, eu e tantos outros meninos daquele tempo não fizermos exames da 1a Classe, porque os professores da Escola Primária de Murruto: #Severino_Nikapaza (Nipuatika), #João_Baptista_Papel #Silvestre_Mona #Maurício_Kazuba (os dois últimos, Deus que os tenha) e tantos outros de todo Posto tiveram que abandonar a procura de segurança na Vila Sede do Distrito, onde aparentemente havia um exército bem equipado, gerido pelo Grupo Entreposto.

Lembro-me dos que viveram naquele tempo em Monapo, que esse exército era comandado pelo Português Capitão Queimado que, depois, viria a criar o grupo ALFA SEGURANÇA (actual G4S).

A Vila estava aparentemente segura, sim, porque era frequente a invasão da CIM, CCM, SAMO e Sede do Distrito.

Eu não ouvi falar. Esses episódios, contribuíram no meu atraso em termos de formação académica, de meus irmãos e outros conterrâneos. Para fazer a 6a e 7a classes, tive que vir a MONAPO – RIO, que só teve EP2 em 1995 na chamada escola do Prédio.

Para viajar de Itoculo a Monapo, devíamos aguardar os sábados, para aproveitar os tractores das Unidades de Produção, vulgo (UP’s), com enormes riscos como se passa hoje no troço CAIA- SAVE.

Àquele que não viveu esses episódios, quando eu reclamo da guerra, coloca-me no sensacionalismo. Azar dele. Eu dormi no mato, aliás tive duas irmãs que nasceram nos esconderijos. Mas quando falamos para  uma delas que tu irritavas em pleno esconderijo, tal como muitos ilustres nas media e redes sociais ignora.

Quando a coisa passou, foi difícil reconciliar as pessoas. Os que estavam na base de Mariri (Itoculo ) deviam vir fazer compras nas lojas de Naclue, posto administrativo de Netia, geridas pelo GRUPO GULAMO,… inicialmente foi um pesadelo.

Mas não tardou, a Rádio Moçambique, por sinal, a única estação vigente pelo menos na Província de Nampula, passou a promover a reconciliação, através de canções e uma delas, lembrei -me num comentário que fiz há dias no Mural de um amigo no Facebook, dizia: “a Frelimo lutou e a Renamo lutou, os dois partidos agora, são partidos amantes da paz…..” de autoria dos Norte Jazz (?), Rena (?) Ou o malogrado Rei Costa (?) Já, nem a minha memória, nem a dos meus irmãos certifica o verdadeiro autor….

Todos ou quase todos, percebemos, que éramos inimigos de ocasião. Os daqui passaram a ir comprar peneiras e galinhas lá, sem restrições e os de lá, continuaram a comprar sal, vestuários, Óleo MONAPO ou OKI, aqui.

Mas para quem não viveu o cenário descrito e vê a partir da STV em MOPEIA, acham ser filme do “Comando Salva filha” e os jornalistas parecem os encenadores.

ATÉ A PRÓXIMA

Por Wilson Nicaquela

Psicólogo escolar e mestrando em Educação em Ciências de Saúde, Universidade Lúrio (UniLúrio), Campus de Marrere, Nampula-Moçambique.

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