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SELO: Piada onde não há motivo para tal – Por Raúl Barata

Em Moçambique faz-se piada para tudo que é acontecimento. Seja mau ou bom o acontecimento, há sempre uma piada em volta. Este fenómeno tem uma explicação que no meu ponto de vista é clara, a incapacidade de separar o certo do errado, que pode estar associada a educação de certos moçambicanos.

Educação é um princípio básico para resolução de alguns, senão de todos os problemas de uma sociedade. Ter conhecimento do certo e do errado ou ainda do positivo e do negativo e saber discerni-los também adquire-se através da educação.

Parece-me que cá, a educação ainda não chegou ao nível de colocar os moçambicanos a distinguir à todos os níveis estas duas palavras opostas.

Nos últimos dias tem se noticiado sobre vários casos de violência doméstica em que parceiros, homens e mulheres recorrem a violência física atirando óleo de cozinha quente para o corpo dos seus companheiros, como forma de se vingar e resolver algum problema conjugal presumivelmente causado pela vítima.

É um acto hediondo, não há dúvidas sobre isso, qualquer que seja o problema, existem formas mais tolerantes e pacíficas de resolver. No entanto, o mais cruel é a maneira como certos moçambicanos reagem a estas notícias, sempre num jeito de piada, que em condições de sanidade mental não devem acontecer. Fazem-se vídeos ou fotos sobre esta triste realidade que nos assola, com os famosos “memes” engraçados que navegam nas nuvens das viciantes redes sociais como se de piada se tratasse. No final das contas, de piada não existe nada.

Penso eu que, por um lado é uma forma de se contestar tal atitude com um pingo de piada no meio, por outro, há que dizer que é a forma mais errada e ridícula de o fazer, se esse for o caso, pois não tem nada de engraçado em transformar uma situação de tragédia em um show de comédia barata, por mais cómicos ou optimistas que possamos ser.

O que mais preocupa nisto tudo é o facto de tais piadas poderem incentivar mais actos do género. Quanto mais piadas em volta da situação, mais casos de violência doméstica se verificam. Os vídeos e fotos circulam tão rápido e para um grande número de pessoas nos vários dispositivos móveis onde são multiplicadamente partilhados e o cenário torna-se num autêntico espectáculo, passando a ser visto como normal a partilha de tal conteúdo. Para os potenciais agressores que também têm acesso a este material, passam a olhar a partilha e a violência em si como um fenómeno aceite perante a sociedade, porque a sua difusão é tão alta e o público consente.

Ninguém (tirando os diversos debates televisivos) aparece a fazer uma crítica directa aos actos de violência doméstica senão através de um episódio de comédia.

A violência doméstica nos seus diversos tipos, pode estar associada aos problemas sociais do país, mas a tolerância e o diálogo sempre devem ser expressados em primeiro lugar e acima de tudo. Os debates televisivos contribuem com o que podem, apelando à coexistência pacífica até certo ponto, donde não podem avançar mais. Fazem a sua parte, restando a outra fazer a dela.

No entanto, o verdadeiro debate sobre o combate à violência doméstica deve se concentrar na vida social quotidiana das possíveis famílias que podem se envolver nestes casos. As lideranças comunitárias, os chefes dos quarteirões, bairros e sobretudo as famílias têm um papel preponderante na identificação dos primeiros sinais para minimizar os casos. É importante perceber que a violência é uma consequência de um ou mais actos antecedentes e é sobre estes que nos devemos concentrar. A violência é por isso uma reacção e não uma acção.

A violência doméstica é um problema sério e é com seriedade que se deve encarar. Para as piadas e as comédias, existem temas mais hilariantes, pois o espancamento e as mutilações não fazem parte deles. Por Raúl Barata

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