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SELO: Este País não é para Velhos – Por Ricardo Santos

Um pouco por todo o Moçambique erguem-se, desafiantes, obras de grande engenharia com dinheiro emprestado pelos outros. Mas só depois da inauguração é que se começa a fazer os cálculos do quanto eu ou você, cidadão trabalhador e contribuinte, vão ter de pagar uma vida inteira, ou muito para além dela. Desengonçam-se, os habituais explicadores de serviço, pagos com dez ou quinze salários de professores ou enfermeiros, para nos convencer da pertinência de algo, em que nem eles próprios acreditam. Tudo isto é espectáculo. Atingiu-se a velhice intelectual. E como tal, estamos agora expostos aos mesmos males e perigos que pessoas daquela faixa etária devem evitar quando se cruzam com más companhias.

Fizeram uma ponte a sul para fomentar o turismo que até já lá estava. Mas agora descobrem que não têm hotéis com estrelas suficientes para enfiar os novos hóspedes que ainda sonham receber na Riviera Maputense. Os grandes magnatas do petróleo e gás, consultores pagos ao minuto ou mesmo até empreendedores-cogumelos de curriculum e opulência, no mínimo, questionáveis, se a equidade e justiça fiscais fossem uma realidade em Moçambique. Os únicos, afinal, que pagam portagem sem olharem a carteira. E para não destoar, porque a unidade nacional é o desígnio mais dito e redito, fizeram um aeroporto principesco mais a norte, para receberem, se calhar, os turistas do sul, quando estes se cansarem de ver as mesmas praias. Sempre os mesmos. E sempre, a mesma, arte de servir.

E ainda bem que não se lembraram de fazer coisas a mais a centro, para além do que já fizeram por ali, porque senão é que seriam elas. Se calhar, assustaram-se com os ventos cortantes do cume da Gorongosa e decidiram, por enquanto, adiar o peregrino plano. Já que, neste país, tudo, menos o nosso voto, é sempre secreto. É formatado por ordens superiores. Vindas de um além, que não está no céu, mas com os pés bem-postos na terra.

Enfim, os nossos visionários decidiram fazer do nosso desenvolvimento, uma réplica da série Westworld e agora estão aos papéis com a factura que lhes caiu nas mãos. E quando se esperava que a idade fosse boa conselheira para localizar a bússola no meio da tormenta, eis que temos que aturar tiques da primeira idade em corpo errado. O pior é que nos querem contaminar com a doença.

Quando eu penso, com os meus botões, olhando para as praias, culinária, história, arqueologia e natureza quase primitiva da costa norte de Moçambique, não consigo perceber por que anda tanta gente histérica a falar de um “elefante branco” em Nacala. E de oportunistas abordagens Pê-Pê-Pê…que sempre nos soaram como duvidosas Quê-Quê-Quê?!…

E aquela tese peregrina de que o aumento da oferta em voos domésticos, licenciando mais companhias aéreas, ia viabilizar Nacala? Não lembra o diabo.

Como que a provar o velho adágio de que Deus dá nozes a quem não tem dentes, nenhuma mente brilhante nos apareceu para alertar que o majestoso aeroporto de Nacala pode – e deveria – ser um hub de companhias low-cost, que fazem a vanguarda das soluções de mobilidade turística que se situam no grande triângulo do Índico que une Maurícias, Seychelles e Maldivas. E se a isto acrescermos conexões marítimas seguras para os principais lodges que já existem no litoral norte de Moçambique, então estaremos perto da perfeita confluência de interesses que pode beneficiar as províncias, mas igualmente, as autarquias da região norte. Sabia o prezado leitor que Nacala e Pemba distam apenas 179 km em linha recta? Muito menos do que Maputo e Xai-Xai em idêntica situação. Isso não impediu que se inventasse um outro aeroporto internacional no pátio das traseiras de Mavalane, também, para servir aves raras e primadonas de além-mar!

O não compromisso com a ciência e com a verdade está a atingir proporções alarmantes na tomada de decisão sobre o desenvolvimento e prosperidade de Moçambique. Prefere-se, por exemplo, apostar em estradas descartáveis, para que os magnatas do petróleo e gás, consultores pagos ao minuto ou mesmo até empreendedores-cogumelos se possam deslocar de quando em vez até às suas coutadas, sem ficar com dores de coluna. Não vá agora tomar uma Aspirina índia. Era só o que faltava. Tem de ser bem ariana, como a original. O Boss manda. E financia. Semper Fi.

Nuarro Lodge. Belmoz Marine, passe a publicidade, e muitos outros locais aprazíveis e com turismo de qualidade, pontilham o norte e bem poderiam começar a fazer a diferença na vida de suas gentes, se houvesse intelecto rejuvenescido na tomada de decisão. Que falta de ambição! Quando o Botswana e a Namíbia, conseguem desviar milhares de visitantes vindos do hemisfério norte, cansados de hotéis de cinco estrelas, festivais de música de vanguarda ou conferências internacionais quid-pro-quod no país da bandeira tricolor; certamente observaram que este segmento quer algo mais terra à terra. Castiço. Não é por acaso, que vários membros da realeza europeia nos visitam regularmente, no Bazaruto, pelas mesmas razões. Os explicadores de serviço, que têm bem desenvolvido o espírito bota abaixo, ainda se vão enfileirar agora, em bico de pés, para dizer que a comparação da orla marítima de Nampula com a Namíbia e Botswana é irrealista porque não têm mar…

Mas faço-lhes a vontade. Visite-se Mombassa, no Quénia, e observe-se como o aeroporto local passou a ser um hub low-cost regional e internacional para as magníficas praias e resorts de Malindi. E como a simples presença da indústria turística até começou a influenciar o tipo de construção que já se desenvolvia na zona, alertar para questões ambientais e de desenvolvimento humano. Mas nada, que se iguale aos monstros de betão de 5 estrelas, cercados por arame farpado e cães de guarda com dentes afiados, que alguns dizem ser a solução milagrosa para pagar as dívidas da ponte construída pelos camaradas de Xi Jinping.

Por isso, quando certos discursos, mal-humorados e impotentes, me invadem a TV, na hora nobre, para me acusarem de ser “Velho do Restelo”, não tenho como não devolver o galhardete, ainda por cima, porque a idade é prova mais do que evidente da minha razão. Querem-me convencer que Nacala e Ponta D’Ouro têm futuro, porque os manuais assim o dizem. O Clube de Amigos faz o ruído. E a Brigada dos Reumáticos, homologa, para que estejamos já à rentabilizar um espaço com comeretes e beberetes, enquanto não se oficializa por ali mais um trinta e um da geopolítica com cheirinho a petróleo.

Porque se não forem ideias frescas, arrojadas…numa palavra, jovens, a chamar a atenção aos nossos governantes, ainda que as estatísticas patronais lhes ceguem, então fica difícil perceber de que país se está a falar. Se daquela terra, onde se proclama que a saúde, educação e até a rede eléctrica estão já presentes na centena e meia de distritos que compõem a Nação, ou da sombra do cajueiro, da ervanária e duas ou três lâmpadas acesas na casa do camarada secretário do vilarejo, que fazem as estatísticas que tanto aborrecem os representantes do Povo.

Definitivamente, este país não é mais para velhos. E nem para jovens que já nasceram velhos. Ou que pensam como velhos.

Este país tem de rejuvenescer social e politicamente. Para que não se premeie a intriga, a incompetência e a ignorância no lugar do mérito. De nada vale falar de patriotismo. Ou de comportamentos desviantes dos corruptores, se o exemplo não vier de quem fizer estas proclamações. Todo o Moçambicano deve perceber que perante os estrangeiros que nos visitam ou que connosco negoceiam é um “Embaixador sem Passaporte Diplomático”. E que por mais influência, regalias, dinheiro e oportunidades de ascensão social que desses contactos possam resultar; são os valores, a honestidade e a integridade que fazem o país.

E se isso lhe for tão difícil entender, então, pegue na trouxa e desapareça para sempre daqui. Porque este país já não lhe pertence. Famba!

Por Ricardo Santos

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