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Política intromete-se na comunicação social em Manica

Os ouvintes da Rádio Comunitária Macequece, que opera no distrito de Manica, província com o mesmo nome, desde 2005, ficaram três dias privados de informação devido à intromissão política do edil daquele ponto do país, Moguene Materisso Candieiro, na gestão interna daquela estação emissora. A emissão, interrompida por volta das 15 horas da sexta-feira passada, foi retomada esta segunda-feira, à mesma hora, depois de uma forte intervenção do Fórum Nacional de Rádios Comunitárias (FORCOM).

Moguene Candieiro mobilizou para as instalações da Rádio Comunitária Macequece as polícias Municipal e de Protecção e ordenou que elas gradeassem as portas e ficassem de permanência para impedir qualquer tentativa de entrada de alguém, incluindo dos próprios gestores.

O presidente do Município de Manica alegou que estava a satisfazer o desejo da maioria dos líderes comunitários e dos membros fundadores da Rádio Comunitária Macequece, que não concordam com os critérios de gestão.

O edil, sem especificar a que critérios se referia, ora contestados, qualificou ainda os voluntários da mesma Rádio de crianças que estão sempre em “guerrinhas”, o que se repercute na ausência de teor educativo nos programas que compõem a grelha informativa.

Ademais, a rádio teria sido encerrada, segundo o autarca, porque não existe comunicação entre ela e o governo local, para além de que o Comité de Gestão eleito unanimemente no dia 26 de Maio deste ano não é reconhecido.

Entretanto, perante a situação, diga-se, que coarctava o direito à informação aos cidadãos e gozo das liberdades de imprensa e de expressão por aquela estação comunitária, o FORCOM dirigiu-se ao terreno para averiguar o caso. A primeira situação com que deparou foi uma mensagem segundo a qual “a Frelimo é que fez, a Frelimo é que faz”, proferida por um líder comunitário do bairro 4º Congresso, Manuel Tomo, por sinal um dos mandatários de Candieiro.

Agastada com os pronunciamentos, a equipa do FORCOM tentou colher a reacção do secretário distrital do Partido Frelimo em Manica, David Franklim, para confirmar se as palavras enunciadas por Manuel Tomo traduziam ou não o sentimento e a posição do partido face ao encerramento daquela Rádio ou eram simplesmente de quem as emitiu.

Durante os contactos, a administradora do Distrito de Manica, Filomena Meigos Manhiça, ao ser confrontada com o sucedido, disse não estar a par do assunto, pelo que não podia pronunciar-se. Porém, o comandante distrital da Polícia da República de Moçambique, Anito Machava, confirmou ao FORCOM ter recebido ordens de Moguene Candieiro para enviar às instalações Rádio Comunitária Macequece uma força policial a fim de conter uma suposta manifestação que perigava a ordem no local.

O comandante fê-lo sem hesitação, mas deslocou-se ao terreno para se inteirar da informação que acabava de receber. Mas, para o seu espanto, nenhuma manifestação havia senão a vigilância que os seus homens exerciam nas instalações de um órgão de comunicação social.

Segundo o FORCOM, há dois meses quatro jornalistas da emissora em alusão foram detidos em situações não esclarecidas. O facto deu-se um dia antes do decurso de uma assembleia-geral convocada pelo ex-presidente da mesa da assembleia-geral, Simão Tomás Soares.

Este “é uma pessoa próxima e amiga do presidente do município e da antiga coordenadora da Rádio afastada por actos de corrupção e má governação”. Este aspecto, associado à alegada falta de comunicação entre a rádio e o governo local e a outras justificações dadas por Moguene Candieiro, transparece uma disputa de interesses, com tráfico de influências à mistura, na gestão daquele empreendimento de comunicação.

Para o Fórum, o enceramento da Rádio Comunitária de Macequece constituiu um atentado ao direito à informação e, por conseguinte, ao direito do cidadão de se informar e ser informado por todos os meios legais.

Esbarra com os princípios da liberdade de expressão, norma internacional e incondicional de Direitos Humanos e com a Liberdade de Imprensa e de Expressão consagrados na Constituição da República, no seu artigo 48º.

Por isso, apela para que “toda a pessoa ou entidade, incluindo o Estado, o Governo e os partidos políticos, se abstenham da prática de actos ou omissões que impeçam o exercício do Direito à Informação e da Liberdade de Imprensa e de Expressão. O direito de acesso à informação é um elemento incontornável para a garantia da consolidação da Paz e da Democracia”.

Reacção dos ouvintes

Alguns ouvintes da Rádio Comunitária Macequece consideram que o fecho daquela estação emissora, por ordem do presidente do Conselho Municipal de Manica, é político e descabido de fundamentos.

Os residentes dos bairros de Vumba, Manhati, Chinhamapere, incluindo os vendedores do Mercado Central daquela cidade, estão agastados com o facto e contra a decisão política tomada por aquele dirigente. Acusam-no de uso abusivo de poder e exigem dele uma explicação.

Eles queixam-se também de estar a pagar taxas de radiodifusão sem no entanto beneficiarem plenamente dos respectivos serviços, pois os sinais de rádio e televisão, incluindo o das públicas TVM e Rádio Moçambique, chegam com má qualidade.

Aqueles cidadãos, de acordo com a Rádio Catandica, referem que Moguene Candieiro está a privar o povo de acesso à informação numa situação em que ele e outros ligados ao poder usufruem até de antenas parabólicas para se informar.

A relutância de Moguene Candieiro

A Rádio Comunitária Macequece só retomou as emissões depois de uma forte intervenção do FORCOM, que manteve um encontro com um Conselho de local, no qual Moguene Candieiro tomou parte, e com alguns líderes comunitários e secretários de células.

No encontro, o edil de Manica tentou, sem sucesso, manter a rádio fora do ar por mais dias, alegando que um novo Comité de Gestão devia ser criado em substituição do actual que supostamente não reúne competências para liderar os destinos de uma estação emissora que trabalha em prol da comunidade.

Historial da Rádio Comunitária Macequece

A Rádio Comunitária Macequece, propriedade da Associação Comunitária Macequece de Manica (ACOMAM), foi fundada em 2005, no âmbito do Projecto Nacional de Desenvolvimento dos Media, coordenado pelo PNUD e implementado pela UNESCO, com fundos doados pela comunidade internacional.

Ela faz parte de oito estacões do mesmo género criadas entre 2000 e 2005, nas províncias de Maputo, Inhambane, Sofala, Manica, Zambézia e Niassa, nomeadamente: as rádios comunitárias Voz Coop, da UGC; Rádio ARCO, da Associação ARCO de Homoine; a Rádio Dondo, da Associação do Dondo; Rádio GESOM, em Chimoio; Rádio Monte Thumbine, em Milange, e as rádios comunitárias de Cuamba e Metangula, ambas da província do Niassa.

No término do tempo de vida do projecto, em 2006, o PNUD passou os títulos de propriedade às associações gestoras destas estações de rádio, sob a chancela do Governo, representado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação.

Dentro do mesmo projecto, este grupo de rádios comunitárias associou-se a outras estacões igualmente geridas por associações cívicas e organizações religiosas, denominada Fórum Nacional das Rádios Comunitárias (FORCOM), para constituírem uma plataforma de diálogo, coordenação e cooperação entre si.

Por sua vez, o Fórum afirma-se como um espaço de coordenação e de defesa dos direitos legítimos das rádios associadas, à luz da Constituição da República de Moçambique e das demais legislação relevante.

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