Morreu, aos 61 anos de idade, no dia 10 de Novembro do ano em curso, o matemático holandês Paulus Gerdes, na sequência de uma operação da próstata feita num hospital da África do Sul. Em vida, depois de longos anos ligado ao ensino superior público como reitor do então Instituto Superior Pedagógico (ISP) e na função de director da Faculdade de Matemática da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), Gerdes ocupava o posto de controlo de qualidade numa universidade privada de Maputo – ISTEG.
Depois da independência de Moçambique, em 1975, a mudança entusiástica do regime para o comunismo atraiu cooperantes de alguns países ocidentais (professores, médicos, etc.) e Gerdes veio nessa esteira. Foi o seu marxismo convicto que o trouxe para estas bandas, tendo sido acolhido de braços abertos, como tantos outros.
Após as suas “missões”, uns partiam com o sentimento de dever cumprido, a ideia de terem colocado as suas pedras nas fundações na nova nação. Outros preferiram ficar por razões diversas e dentre estes houve quem abraçou a nacionalidade moçambicana cinco anos depois de ter chegado a Moçambique.
Holandês de origem, Gerdes foi dos poucos “cooperantes” daquela nacionalidade (como os Draismas) que optaram definitivamente por se moçambicanizar. Eventualmente, no seu caso, por causa da sua linha de investigação: viver onde reside o material empírico do seu trabalho. Gerdes vinha cultivando uma vertente epistemológica da matemática, denominada etnomatemática, um cruzamento entre a matemática e a antropologia cul- tural.
Paulus Gerdes desempenhou os cargos de director da Faculdade de Educação (1983-1987) e da Faculdade de Matemática (1987-1989) da Universidade Eduardo Mondlane, e de Reitor da Universidade Pedagógica (1989-1996). Em 2006, foi presidente da Comissão Instaladora da Universidade do Lúrio, a terceira instituição pública de ensino superior de Moçambique, com sede em Nampula.
Entre as suas funções a nível internacional constam as de presidente da Comissão Internacional para a História da Matemática em África (desde 1986) e a de presidente da Associação Internacional para a Ciência e Diversidade Cultural (2000-2004). Em 2000 sucedeu o brasileiro Ubiratan D’Ambrósio como presidente do Grupo Internacional de Estudo da Etno-matemática, tendo recebido vários prémios.
Como etno-matemático, Paulus publicou vários livros não apenas centrados na produção cultural dos povos moçambicanos, particularmente dos Macuas, como também de Angola. Um dos seus livros mais notáveis, de acordo com especialistas, chama-se “Otthava: Fazer Cestos e Geometria na Cultura Makhuwa do Nordeste de Moçambique”.
O livro fala sobre práticas na cultura macua que evidenciam considerações geométricas susceptíveis de uma exploração matemática e educacional. As práticas provêm da esfera cultural de ‘otthava’ – tecer, entretecer, entrecruzar e entrançar – ou seja, cestaria e esteiraria. Constituem temas de análise a fabricação de funis, de chapéus, de armadilhas de pesca, de recipientes, de peneiras, de chocalhos de dança, de carteiras, de tranças decoradas, de cestos, de nós e de esteiras circulares.