Este texto é inspirado na música, retirado da mixtape «Contra- Cultura», do rapper Valete que tem um título homónimo. Pode-se, este texto, considerar como sendo a extensão da música de Valete, pois se a dor é igual para os humanos não importa o lugar onde a mesma pode ser despejada. Eu quero despir a dor que sinto que vem por meio da ofensa que é construída pelos meus conterrâneos que têm o poder de criar a «indústria do nada».
A ideia que advém do conceito da «indústria do nada» resumese à falácia de que a nossa sociedade produz personalidades, artistas, mormente músicos, usando técnicas de busca de talentos que assentam num concurso público, mas que na verdade já se sabe quem é o vencedor, porque a busca de talentos funciona por afinidades e não por talento e trabalho. Muitos, os adolescentes na sua maioria,vêem-se atraídos pela «indústria do nada», porque esta promete holofotes, ovação, luzes da ribalta e, sobretudo, a fama mesmo que seja instantânea.
A «indústria do nada» é a maior invenção de todos os tempos. Ela cria tudo e acaba fazendo tudo. É fascinante a «indústria do nada» pois concebe actores de sucesso que mal sabem representar. Cria cantores de sucesso que mal sabem cantar. Até cria bailarinos de sucesso que não sabem definir o conceito de coreografia.
Talvez a nossa selecção de futebol inspira-se na «indústria do nada» porque não consegue ter um resultado que satisfaça a propalada auto-estima que tanto falamos na nossa «Pérola do Índico», isto porquealguns resultados do Moçambola não se fazem dentro das quatro linhas, mas na secretaria. Em Moçambique existe um império que está a crescer que se baseia na «indústria do nada». Os canais televisivos, a imprensa escrita e radiofónica que de tanto ser cor-de-rosa, vermelha e amarela se dedica a cem porcento a publicitar a «indústria do nada».
Talvez, desculpem-me se estou a exagerar, a nossa lavra artística estipula-se na «indústria do nada», porque todos os dias ouve-se dizer que os «mangolés» estão a fazer, a cada fim-de-semana, uma festa no nosso quintal. É incrível como chegámos a esse ponto. Porque já não tenho mais argumentos para explicar a «indústria do nada», vou deixar alguns protótipos que ilustram, pertencem, alimentam ou perpetuam a «indústria do nada». Aspecto básico: não fruímosde editoras verosímeis de Música em Moçambique, pois desde que a última «abrasou» ficámos órfãos no campo editorial.
Por exemplo, a dona da canção “Ta Doce” diz que sempre quis tocar guitarra, mas não pode porque tem medo de estragar e partir as unhas. Que lorpice: gaba-se de ter medo de partir unhas de postiço. Há uma cantora que nunca conheceu Fany Pfumo, em pessoa, e intitula-se «Diva da Marrabenta». Já ouvi dizer que existe um «príncipe da Timbila». Há uma «Rainha do Raga». Existem «Reis da Pandza». Temos um cantor que usa fatos italianos e sapatos franceses e vangloria-se de ser amigo Presidente da República (não sabemos se ainda é).
Temos um músico que saiu à rua para fazer um grande «nkhuvu» porque acredita que revitalizou a Marrabenta cantando esse género musical em língua portuguesa (como se esse estilo tivesse morrido em algum momento). Temos um ‘rapper’ que canta em inglês, mas ninguém o entende. Temos um copista que se vangloria de ser o melhor de Moçambique, mas que só tem uma obra. Conhecemos um apresentador que atrai os telespectadores falando mal dos criadores e chama isso «bifes».
Temos em Moçambique autênticas cópias de Rihana, Jay-Z. Ou seja, os nossos artistas ostentam mais títulos que trabalhos que dignifiquem esses títulos. Sentimo-nos orgulhosos quando as nossas músicas são confundidas com as músicas de Angola. A nossa «indústria do nada» merece aplausos. Palmas para a «indústria do nada». Viva a «indústria do nada». Viva, viva, viva a «indústria do nada». Até os comentadores ou analistas, (já não sei qual é o termo certo), só dizem «nada» quando estão na televisão. Será que existe um curso nas faculdades moçambicanas que forma «analistas»?
Moçambique já foi o «país da Mulher M`siro» expondo a beleza feminina inspirada na mulher Macua. O «país da capulana». Até aqui nada mau. Mas depois Moçambique ficou conhecido como sendo o «país da Marrabenta». Actualmente, Moçambique é o «país do Pandza». Ou seja, um país que é catalogado partindo de elementos que advêm da «indústria do nada» tem limitações sérias para criar referências. Na velocidade em que nos encontramos não falta muito para que Moçambique passe a chamar-se o «país das três-cem».
Eu não quero alongar-me, pois este é um assunto que um dia vai fazer com que o TPI (Tribunal Penal Internacional) nos condene por estarmos a maltratar o nosso país com tantas coisas vazias por causa de uma «indústria do nada» que só nos rouba a ideia de sermos moçambicanos genuínos.