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Os interesses de Jacob Zuma no projecto da barragem de Mphanda Nkuwa

Presidente sul-africano diz que os media não deveriam ter publicado agressão do moçambicano

O Presidente sul-africano, Jacob Zuma, é acusado de ter agido em benefício próprio ao apoiar a construção da barragem de Mphanda Nkuwa, uma vez que o projecto irá favorecer o seu filho, Saad Zuma, que deverá entrar no negócio como “testa de ferro”.

É que, de acordo com uma correspondência a que o @Verdade e o AmaBhungane, o Centro de Jornalismo do Mail & Guardian, uma publicação sul-africana, tiveram acesso, Jacob Zuma não só sabia do papel de seu filho no projecto, como também se reuniu com representantes do mesmo, apesar da aparente violação de ética em casos desta natureza.

Ele também teria discutido com o seu homólogo moçambicano, Armando Guebuza, e deixou os outros (parceiros e intervenientes) com a impressão de que iria ajudar no avanço do projecto directamente, como sugere a correspondência. Na África do Sul, o Código de Ética Executivo é explícito sobre conflitos de interesses: “Os membros do Executivo não devem expor-se a qualquer situação que envolva o risco de um conflito entre as suas responsabilidades oficiais e os seus interesses privados”.

A primeira reunião terá supostamente sido realizada na residência oficial de Zuma, em Pretória, em Outubro de 2010. De acordo com uma fonte próxima, Saady Zuma levou Celso Correia, presidente do conselho de administração do grupo Insitec, parceiro privado moçambicano do projecto, para conhecer o seu pai. A fonte afirmou ainda que Correia queria assegurar-se de que Jacob Zuma, com quem ele falara por telefone, e Saady eram realmente quem este dizia ser: pai e filho.

Celso Correia, de 35 anos de idade, é um dos empresários mais bem-sucedidos de Moçambique, onde se acredita ser um protegido de Armando Guebuza. Especula-se que o Presidente da República tenha uma participação oculta na Insitec, realizada nominalmente por Correia. Na reunião de Pretória, que teria durado menos de uma hora, a nossa fonte disse que Zuma garantiu a Correia que o seu filho era “um indivíduo sóbrio”. Correia, afirmou a fonte, saiu com uma “impressão inequívoca” de que o Presidente Jacob Zuma aprovou o envolvimento do Saady no projecto.

Sobre os encontros

Ao @Verdade e ao AmaBhungane, quando questionado sobre o facto, Celso Correia disse que “nós não usámos qualquer Zuma no desenvolvimento de qualquer coisa. Infelizmente, o projecto não avançou nos últimos cinco anos porque não conseguimos vender a energia. Eu não conheço nenhum Zuma e nós nunca usámos lobbies”. Apesar de Celso Correia negar que se tenha encontrado que Saady, tudo indica que a reunião foi útil pois este último conheceu, em Fevereiro de 2011, Brian Dames, o presidente da Eskon, na região de Stellenbosch, enquanto decorria um jogo de “golfe presidencial”. Depois disso, ele enviou um e-mail a Dames no qual diz num dos trechos que “quando nos conhecemos, eu disse-lhe que era uma parte da equipa do projecto Mphanda Nkuwa Hidroeléctrica, Dam”.

Posteriormente, ele (Saady) organizou uma série de reuniões que foram realizadas entre a Eskom e representantes do projecto Mphanda Nkuwa desde 2008 e manteve encontros com Dames. No princípio, o chefe executivo da Eskom parece não ter gostado da abordagem e da proposta do filho de Zuma, o que lhe fez recusá-las. Entretanto, a Eskom disse, na semana antepassada, que embora Dames não se lembre de ter conhecido Saady, entretanto, admite ter recebido um email seu, que depois encaminhou a um departamento competente. A Eskon disse ainda que também consultou o diário de Dames, e não foram encontrados elementos que o ligassem a Saady. “A Eskom lida com o Governo moçambicano, através da empresa Electricidade de Moçambique e outras com interesse no projecto (Mphanda Nkuwa) e não com indivíduos”, disse.

Falta de progresso

Em Março de 2011, de acordo com a correspondência, Saady disse que o seu pai “estava a receber telefonemas de Mr G (Guebuza) sobre a falta de progressos neste assunto (projecto Mphanda Nkuwa)”. Se as insinuações sobre a participação oculta de Armando Guebuza na Insitec são verdadeiras, então os dois chefes de Estado estavam interessados em aliar-se para, juntos, fazerem parte de um projecto da dimensão do Mphanda Nkuwa. E que Jacob Zuma far-se-ia representar pelo filo, Saddy. Em Agosto de 2011, Saady terá trocado mensagens acerca do projecto Mphanda Nkuwa com o então ministro da Energia da África do Sul, Dipuo Peters. Numa delas o dirigente dizia: “Olá Saady, nota que eu ainda estou à espera das informações sobre a visita do [???] Mphanda Nkuwa e de mais desenvolvimentos. Obrigado. Dipuo”.

Uma fonte disse que o então ministro da Energia Dipuo Peters terá visitado a casa de Saady Zuma para esclarecer sobre a posição política do Governo. Um porta-voz de Peters confirmou que ele havia conhecido Saady, mas que isso era uma coisa normal uma vez que tal “aconteceu no âmbito das suas responsabilidades oficiais como um ministro de Estado”. “O ministro Peters conhece e interage com diversas partes interessadas. Refiro-me a indivíduos e a organizações”. Em Dezembro de 2011, uma segunda reunião entre Jacob Zuma e Celso Correia teve lugar em Maputo, durante uma visita de Estado a Moçambique, como sugere a correspondência, porém, Saady não esteve presente.

A confirmação do encontro

Milva Santos, uma empreendedora moçambicana, cuja família acomodou Jacob Zuma em Maputo, entre os meados da década 1970 e 1980, quando esteve exilado como membro sénior do Congresso Nacional Africano (ANC), e que trata o chefe do Estado sul-africano por tio, revelou os detalhes da reunião realizada durante a tal visita de Estado. “Eu consegui organizar uma reunião para Celso Correia e o meu tio (Jacob Zuma) e tudo correu bem. O meu tio fez a necessária pressão para que as coisas andassem e tudo está a correr a uma velocidade incrível agora…”, disse.

E, ao que tudo indica, estão a correr a uma velocidade incrível pois um porta-voz da Eskom confirmou ao @Verdade e ao AmaBhungane que, “depois de uma reunião binacional entre África do Sul e Moçambique, em Dezembro de 2011, as autoridades da Eskom conheceram os representantes do Mphanda Nkuwa no início de 2012 para discutir os detalhes do projecto…”.

Entretanto, Milva Santos terá solicitado a reunião alegadamente como membro da Insitec. No relato da visita de Estado que Zuma efectuou ao país, ela também afirmou ter “colocado frente a frente Celso Correia, o chefe executivo da Eskom [Dames] e as suas respectivas equipas”. A Eskom confirmou o encontro, mas disse que foi “realizado informalmente durante uma pequena pausa na agenda formal, ou seja, não fazia parte do compromisso bilateral”.

Relação entre Zuma e Milva Santos

Quando contactou a Insitec, Milva Santos terá dito que tem laços de familiaridade com Jacob Zuma, que é grato à sua mãe por lhe ter acomodado durante os anos em que esteve em Moçambique na era do Apartheid. Zuma participou no casamento de Milva Santos, em Maputo, há alguns anos como convidado de honra. Na página LinkedIn no perfil de Milva Santos refere-se que ela tem formação em Marketing e Relações Públicas, com passagem pela SABMiller Moçambique, Hotel Polana e Coca-Cola, em Moçambique. Após o contacto com o @Verdade e o AmaBhugane, Milva Santos exigiu que as questões que lhe seriam feitas fossem enviadas por escrito. Porém, apesar de isso ter sido cumprido, ela não as respondeu.

Problemas técnicos

Funcionários da Eskom têm mantido discussões com os seus homólogos de Mphanda Nkuwa desde o início de 2012, mas nenhum acordo de energia foi assinado ainda, apesar do papel de Saady, que recebeu o apoio do pai, Jacob Zuma. Há muitas razões possíveis para o atraso, sendo alguns técnicos, financeiros e alguns políticos. A Eskom agora diz ter resolvidas 80% a 90% das questões técnicas, especialmente as que dizem respeito a uma linha de transmissão de 1.500 quilómetros de comprimento que precisa de ser construída.

A Eskom está empenhada em minimizar a sua exposição ao risco financeiro, o que significa que quer pagar pela electricidade em randes, moeda sul-africana. A firma também não pretende assumir nenhuma responsabilidade por falhas de transmissão, por isso insiste em comprar a energia na fronteira sul-africana e não directamente na barragem de Mphanda Nkuwa. Enquanto isso, correm rumores de que o Governo moçambicano terá perdido os parceiros deste consórcio, particularmente com os brasileiros, e está a pensar em substituí- -los por uma empresa chinesa.

Os brasileiros já gastaram dezenas de milhões de dólares em estudos de viabilidade do projecto, o que dizer que qualquer mudança significaria mais atrasos. Apesar disso, Celso Correia garantiu que a sua empresa manterá uma participação em qualquer consórcio que vier a ser constituído, embora tenha procurado minimizar o tamanho de um jogo futuro.

A situação permanece indefinida, mas é possível que Saady Zuma ainda possa sair beneficiado caso o projecto da hidroeléctrica avance. A Eskon, companhia estatal de energia da África do Sul, ainda não celebrou o acordo definitivo no consórcio de energia para a viabilização da barragem de Mphanda Nkuva, que será construída a jusante de Cahora Bassa.

As delegações sul-africana e moçambicana encontraram-se pela primeira vez em 2010, quando Jacob Zuma envolveu o seu filho Saady Zuma visando pressionar os decisores sul-africano em beneficio próprio.

Os detalhes para este lobby continuam revestidos de algum mistério e os elementos em torno da aproximação de Saady Zuma ao consórcio com a Mphanda Nkuwa não são totalmente conhecidos. Saady é o irmão mais velho dos gémeos irmãos Duduzani e Duduzile, que nasceram em Moçambique durante os anos em que Jacob Zuma esteve exilado.

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