Elton e Adérito são vencedores: começaram do nada e hoje são donos de uma carpintaria. Sem meios, colocaram a fé na aprendizagem do ofício de carpinteiro para, desse modo, construírem o sonho da independência e autonomia financeira. Próximo passo: dar emprego…
A história destes dois jovens começa em 2005, quando Elton chegou à cidade de Maputo, ido da província de Inhambane, sua terra natal, à procura de melhores condições de vida. A primeira coisa que fez foi arranjar algo que lhe pudesse manter ocupado.
Foi nesse contexto que se disponibilizou a aprender carpintaria com um vizinho, a quem trata por mestre Bernardo.
Enquanto Elton aprendia a arte de produzir artigos de mobília, o amigo, Adérito, não “dormia”. Ele vendia plásticos no terminal interprovincial da “Junta”.
Foi aí que ele (o Adérito) começou a ver quão importante era desenvolver uma actividade que envolvesse a criatividade, o talento e a arte, afinal o negócio de plásticos não era rentável.
Por isso, decidiu montar uma banca de venda de rebuçados numa das ruas da sua zona, nas proximidades da sua casa. No princípio, tudo corria bem mas, devido à falta de tempo, as coisas começaram a mudar.
Passados alguns meses, o negócio ruiu. “Por ser estudante do ensino técnico, não tinha muito tempo para controlar a banca. Os oportunistas aproveitaram-se disso para subtraírem os produtos, e foi assim que não consegui seguir em frente”.
Esta sequência de infortúnios fez com que Adérito se visse na obrigação de se entregar a uma profissão, diga-se, a sério.
“Percebi que devia fazer algo que me desse segurança. Devia aprender a fazer algo que um dia me desse o pão. Então consegui um emprego numa carpintaria de um vizinho. Era ajudante”, conta.
Durante um ano, Adérito foi aprendendo o “abc” da carpintaria com o mestre Mugabe, seu vizinho. Porém, sem motivos, ele foi expulso e passou a trabalhar na carpintaria do senhor Bernardo, que, coincidentemente, era o mestre de Elton.
Um encontro histórico
Com a sua integração na carpintaria onde Elton trabalhava, a visão de ambos começou a ser mais ampla. Unidos pelos sonhos, nada mais pretendiam senão desenhar o que há muito desejavam: profissionalizare-se na área em que estavam.
“Estávamos certos de que aquele era o caminho para o nosso sucesso. Sentíamos que já sabíamos fazer algo e, acima de tudo, bem”, contam.
Embora estivessem empregados, sentiam que havia necessidade de se libertarem do seu mestre e serem autónomos. Tinham a certeza de que juntos podiam ir mais longe. O segredo para tal era apreender todo o conhecimento que lhes era transmitido.
“Começámos a aprender com afinco porque sabíamos que só daquela forma poderíamos realizar os nossos sonhos”. Depois de um par de anos, já sabiam fazer muitos objectos com a madeira, tais como cadeiras, janelas, portas e bancos, ou seja, já tratavam, diga-se, a madeira por tu.
Da insatisfação à separação
Os teóricos dos Recursos Humanos recomendam o pagamento de uma remuneração condigna aos funcionários como (uma das) forma(s) de os estimular.
Ou por outra, o trabalhador estimulado está em condições de produzir e empenha-se cada vez mais. Mas não foi o que o mestre destes dois jovens fez. Este, vezes sem conta, ficava com o dinheiro alegadamente porque estava a expandir a sua actividade.
“Os meses iam passando e ele não cumpria as promessas que fazia. Havia falta de lealdade porque nós fazíamos a nossa parte mas ninguém nos pagava”, contam.
Nos finais do ano passado, ao perceberem que não era possível aguentar com a demanda, decidiram deixar a oficina onde tinham aprendido a lidar com a madeira. Assim, juntaram o dinheiro que haviam acumulado ao longo dos anos com o objectivo de construírem uma carpintaria na casa de Adérito.
Um projecto rentável
Na verdade, nem eles acreditavam no sucesso do projecto que tinham abraçado e o maior obstáculo era fazer nome num mercado que já tinha “donos”.
“Começámos a contactar algumas pessoas com quem já tínhamos relações há anos, quando ainda estávamos na carpintaria do mestre Bernardo. Foram essas que, acreditando no nosso trabalho, decidiram dar um voto de confiança”.
Para além desta estratégia, eles privilegiaram o contacto directo com os clientes, ou seja, passaram a solicitar os seus clientes de forma mais directa, o que lhes permitia discutir o preço e dessa forma proporcionar um ambiente salutar de negócios.
“Nós já tínhamos a noção de como fazer e marcar os preços e foi mais fácil atrair a clientela. Os preços de referência eram os do nosso antigo posto de trabalho e fazíamos reduções simbólicas, apesar de fazerem muita diferença”.
Questionados sobre como é que os clientes tiveram conhecimento de que eles estavam a trabalhar sozinhos, os nossos interlocutores disseram que isso foi evidenciado pela sua ausência na antiga carpintaria.
“Os clientes já nos conheciam e até sabiam que éramos nós quem fazia as coisas. Eles vieram à nossa procura. Sentiram a nossa falta. Mas é preciso confessar que nós também fomos atrás deles para lhes mostrar o quanto tínhamos evoluído”.
O desafio enfrentado pela dupla despertava apreensão nos que ouviam falar deles e do seu trabalho. Isso também foi essencial para o alcance do sucesso. “Parecia inconcebível para muita gente que nós tivéssemos largado uma carpintaria de renome para investir num pequeno projecto. Até certo ponto isso foi bom porque a curiosidade que isso provocava era um chamariz para esse tipo de pessoas”.
Clientes à altura
Pouco tempo decorreu até aparecer alguém que acreditasse neles. Um senhor estofador viu e reconheceu o talento deles e passou, no ano passado, a colaborar com eles na produção de molduras para sofás.
Embora se declinem a revelar os montantes envolvidos na parceria com o referido indivíduo, eles avançam que se trata de dinheiro suficiente para continuar a apostar na profissão que escolheram.
“Chegamos a ganhar pouco mais de três mil meticais por cada trabalho, o que para nós é satisfatório tendo em conta o nosso objectivo que é de alcançar o sucesso de forma gradual”.
De Janeiro a esta parte, o pensamento destes empreendedores mostra-lhes que é necessário pautar por um postura mais empresarial, isto porque o número de clientes que aparecem a apresentar trabalhos de maior responsabilidade não deixa de crescer.
A título de exemplo, no princípio deste mês foi-lhes feita uma proposta para passarem a fabricar, em grandes quantidades, molduras para cadeiras e caixilhos”
“Queremos empregar jovens”
Para dar corpo à sua visão empresarial, ambos estão cientes da necessidade que o crescimento da sua actividade lhes impõe, daí que pretendam recrutar dois ajudantes para fazer face à demanda de encomendas.
“Temos sido muito concorridos e achamos que esse nível de crescimento precisa de ser acompanhado. Contudo, pensamos em recrutar mais dois jovens, de preferência, ambiciosos e sonhadores ao nosso nível para que possamos responder à altura dos anseios dos nossos clientes”.
Qual é o segredo?
Embora com bases diferentes para sustentar o mesmo argumento, Elton e Adérito são unânimes em afirmar que o segredo para o sucesso é a fé.
Por um lado, Adérito afirma que a confiança que depositou em si mesmo foi fundamental para alcançar o nível em que hoje estão. “Temos de acreditar em nós mesmos.
É importante que confiemos em nós mesmos para que possamos realizar os nossos sonhos e fazer as coisas acontecerem”, diz Adérito.
Por seu turno, o seu parceiro, Elton, diz que a questão da fé deve ir para além do esforço físico. Acredita que é em Deus se que busca a força para crer que os seus sonhos têm tudo para resultarem.
“Os planos do Homem podem falhar se este não tiver fé numa força superior e com capacidade para fazê-los acontecer. Para mim, esse alguém chama-se Deus e é nele que eu deposito a minha fé para que as minhas coisas andem”, conclui.