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Iapala: a empobrecida vila rica

Iapala: a empobrecida vila rica

Aquele que, em tempos idos, era um ponto estratégico de escoamento de produtos agrícolas da alta Zambézia para toda a região norte do país, presentemente o Posto Administrativo de Iapala, o “mova” da economia do distrito de Ribáuè, província de Nampula, é um exemplo acabado da falta de vontade política.

Depois da independência, nada foi construído e o pouco que ficou deixou-se degradar. Lembranças do tempo em que era uma vila ferroviária, onde a população tinha acesso a água potável, cuidados médicos e facilidade de comercialização de cereais povoam o imaginário dos habitantes da pobre vila rica de Iapala.

 

O Posto Administrativo de Iapala constitui uma potência no campo de agricultura a nível do distrito de Ribáuè, na província de Nampula. Com uma população estimada em 87528 habitantes, distribuída por cinco localidades, a maior parte dela (cerca de dois terços) dedica-se à actividade agrícola, até porque o solo oferece condições para tal, e não só. Também se verifica a aposta noutras actividades adicionais, embora não tenham impacto na economia local, como é o caso do comércio informal.

 

Os sete milhões de meticais alocados pelo Governo para incrementar o comércio e a agricultura ainda não começaram a surtir os efeitos desejados, além de se registar o crónico problema de reembolso tardio ou ausência total do valor. A produção agrícola ainda é insuficiente e a nova aposta da população tem sido o comércio informal.

Na campanha agrícola passada 2010/2011, o Posto produziu mais milho e mandioca, aliás, esta última cultura já é uma produção de rotina, embora não seja praticada de forma industrializada. Porém, o governo local está a criar condições para melhorar a produção da mandioca e já há uma empresa que poderá dedicar-se à sua exploração para fazer farinha para biscoitos. Além disso, na mesma campanha produziu-se ervilha e também se registou uma crescente produção da cultura de tabaco.

Iapala tem uma tradição na produção de culturas de rendimento como o tabaco cujo quilograma custa 60 meticais. Há cada vez um número maior da população que se dedica à comercialização, e também ao cultivo de culturas de rendimento, com efeito, a vida dos habitantes tem vindo a registar uma melhoria, esse facto constata-se nos tipos de habitação que vão sendo erguidas.

Porém, os agricultores continuam a queixar-se da falta de mercado para o seu produto, uma vez que o escoamento ainda é débil. Para minimizar a situação, na campanha passada os governos do posto e distrital fizeram atrair alguns parceiros como, por exemplo, a Agro-corredor que comprou o milho e outros produtos.

Além do problema de escoamento, os camponeses da vila sede de Iapala queixam-se de estar a passar por momentos difíceis no que respeita à comercialização do tabaco, principal fonte de rendimento das famílias. Conta-se que as coisas eram melhores no passado quando a empresa João Ferreira dos Santos (JFS) era o principal comprador do produto.

Porém, a situação piorou com a entrada de uma nova companhia no mercado. Presentemente, fala-se de retrocesso, uma vez que o actual comprador paga tardiamente. No ano em curso, não se conseguiu fornecer a tempo e hora os insumos aos agricultores, deixando-os entregues à sua própria sorte. Sentindo-se prejudicados, na presente campanha eles vão apostar na produção de milho e ervilha.

Para este ano, os desafios do governo do Posto Administrativo de Iapala são, nomeadamente, o aumento das áreas de produção para a campanha agrícola 2011/2012, o fornecimento da mandioca à fábrica de cerveja, além da aposta nas novas culturas como a soja, o gergelim e o algodão.

Uma vila abandonada à sua própria sorte

“Iapala já não é a mesma”, diz João Omar, um dos mais antigos moradores da vila, e acrescenta: “Antigamente era uma importante vila ferroviária no que respeita ao escoamento de mercadorias, servia de ligação entre as províncias de Zambézia, Nampula e Niassa, ou seja, era um entroncamento importante e dispunha de uma camionagem automóvel de transporte de cereais e passageiros”.

Porém, actualmente Iapala é apenas um posto abandonado à sua própria sorte que se debate com dificuldades a todos os níveis. A população queixa-se de falta de água potável, acesso à saúde, dificuldades na comercialização, afirmando que tem havido oportunismo por parte dos compradores, além das vias de acesso que se encontram todas degradadas. Já começa a assistir-se à reabilitação de duas das principais estradas que dão acesso à vila sede, que irá permitir uma melhor circulação de pessoas e bens.

“A vila sede poderia desenvolver mais, até porque tem condições para isso, mas o governo do posto não está preocupado em melhorar e, como resultado, ela caminha de pior para péssimo. A vila perdeu a postura. É triste”, lamenta Omar que reside naquele ponto do país desde 1966.

Mas, diga-se, circular pelas vias de acesso daquele posto é um verdadeiro martírio pois não existe uma estrada sequer asfaltada, ou melhor, em boas condições de transitabilidade. O maior dilema é das ambulâncias que têm de fazer malabarismos durante o seu percurso para transportar doentes de um ponto para o outro.

Além disso, a vila não obedece a uma estrutura urbana, e ainda não existe um plano de ordenamento eficaz dos bairros, razão pela qual se assiste a um número crescente de construção anárquica de moradias.

Apesar de já contar com energia eléctrica da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) naquele posto, que é considerado o celeiro do distrito de Ribáuè, continua-se a assistir à degradação das infra- -estruturas que outrora serviram como locais de comércio, lazer e de empresas. “Iapala era bastante desenvolvida, há mais de 60 anos servia para escoar mercadorias. Os Caminhos-de-Ferro eram a força motriz da economia, mas o que vemos hoje é lamentável: nada foi construído e o pouco que ficou estamos a deixar degradar-se”, comenta Rui dos Santos, morador há mais de 30 anos.

Além da problemática comunicação via terrestre, a rede de telefonia móvel ainda é deficitária, mas a grande preocupação dos residentes é a falta de sinal de televisão pública. O comércio formal é quase inexistente.

Das seis lojas que funcionavam antes da independência apenas duas é que se dedicam a essa actividade. E a economia é assegurada pelo negócio informal. Não existe sequer uma instituição bancária. Os moradores têm de se deslocar à cidade de Nampula (a cinco horas de comboio) para depositarem o seu dinheiro.

Acesso a água potável

O acesso a água potável é uma das principais preocupações da população de Iapala. O Posto Administrativo conta com um sistema de abastecimento de água pertencente à empresa Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM), que fornecia o precioso líquido aos moradores antigamente. Mas, em lugar de se fazer um reaproveitamento do sistema, o governo local aposta na abertura de furos, o que é mais oneroso.

Apesar de a cada ano subir o fornecimento de água, a população continua a caminhar longas distâncias para obter o preciso líquido. No ano passado, o posto contou com uma média de 30 furos, além de alguns reabilitados e, neste ano, esperar-se abrir mais 43 novos em alguns locais que já foram identificados. “Isto poderá ser executado em 50 porcento ou no seu total, dependerá do nosso orçamento”, disse Somar, chefe do Posto Administrativo de Iapala.

Criminalidade

Num posto com dois terços da população do distrito, a questão da criminalidade é quase inexistente. Os casos mais comuns estão relacionados com a violência doméstica nas comunidades. No ano passado, registaram-se apenas quatro situações.

Saúde

A nível do Posto Administrativo, Iapala conta com três centros de saúde. Apesar disso, ainda assiste-se a casos de pessoas que têm de percorrer uma média de 20 a 30 quilómetros até uma unidade sanitária.

Para se resolver o problema, neste momento está em construção um centro com capacidade para responder à crescente procura de cuidados médicos. Mas a grande dificuldade continua a ser tirar os doentes da sua habitação, devido ao estado degradado das vias de acesso.

A málaria, as doenças diarreicas e o HIV/SIDA têm sido as principais causas de internamento nas unidades sanitárias daquele posto.

Em média, por mês 27 pessoas são internadas. Ao contrário do ano passado, este centros de saúde dispõem de uma quantidade considerável de medicamentos. Porém, há vários meses os mesmos não têm recebido visitas de médicos. Os casos mais graves são transferidos para a sede do distrito e, devido às péssimas condições da estrada, há registo de mães que dão à luz no interior de uma ambulância.

No Centro de Saúde de Iapala-Monapo, segundo o enfermeiro-chefe, o desafio é melhorar o atendimento e aumentar o serviço como, por exemplo, a extracção de dentes.

Por dia, em média, a unidade sanitária atende 150 crianças e tem dificuldades em responder à afluência de doentes, uma vez que o número de profissionais ainda é insignificante. O quadro de pessoal é constituído por 25 trabalhadores, e uma única enfermeira é responsável por diversos serviços.

Na senda do melhoramento de atendimento, aquele centro de saúde está a construir a primeira “casa mãe espera” de modo a assegurar que os partos sejam realizados naquela unidade sanitária. Por mês, em média, o Posto Administrativo regista mais de 100 nascimentos.

Educação

A nível do Posto Administrativo, a Educação, sobretudo o ensino secundário, ainda continua a ser privilégio de poucos. A única escola secundária que existe lecciona até a 10ª classe, obrigando os alunos que queiram dar continuidade aos estudos a deslocarem-se à sede do distrito. Devido à falta de dinheiro para custear os estudos, muitos acabam por desistir.

À semelhança do que se verificou em todas as escolas públicas a nível do país, no ano passado a Escola Secundária de Iapala também registou um número considerável de reprovações. Dos 367 alunos submetidos a exame da primeira época, apenas 90 foram aprovados, e na segunda atingiram a fasquia de 50 porcento.

A escola que funciona desde 2008, tendo iniciado com apenas quatro salas de aulas, 308 alunos e sem energia eléctrica, é a única e principal instituição de ensino naquele ponto do país. Presentemente, graças às doações feitas por pais e encarregados de educação dos alunos, conta com 11 salas.

Segundo o director da escola, Vicente Januário, os problemas de superlotação das salas, falta de professores e de material escolar são algumas das causas que contribuem para o número crescente de reprovações. A título de exemplo, no ano passado havia professores com mais de 15 horas acima do que estava estipulado.

A distância entre a escola e a casa do aluno é outro factor importante. Os alunos têm de percorrer pelo menos 10 quilómetros para poderem assistir às aulas, e este facto tem contribuído sobremaneira para os casos de desistência. No ano passado, 313 estudantes, dos quais 125 raparigas, desistiram.

Neste momento, a escola conta com 1900 alunos distribuídos em dois regimes, nomeadamente diurno e nocturno, para 30 turmas, e o rácio é de 60 a 65 alunos por cada turma.

A escolarização da rapariga está mais acentuada, perfazendo aproximadamente 40 porcento do número total dos estudantes. Os casamentos prematuros e gravidezes indesejadas estão na origem da desistência das raparigas. Só no ano passado, até ao segundo semestre, registaram-se pelo menos 18 casos.

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