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Toma que te dou: O sol ainda não nasce para todos!

Imaginei-me a ir outra vez ao Palácio da Ponta Vermelha onde o Presidente Armando Guebuza me esperava sentado numa cadeira de madeira de pau-preto recheada de almofadas de seda. Fiquei espantado com o facto de ele estar a fumar cachimbo com tabaco perfumado, porque o que se sabe, e isso foi noticiado em todo o mundo, é que o nosso chefe de Estado abdicou desse acto agressivo aos pulmões, aos dentes e aos lábios.

Mas também me lembrei de um ditado segundo o qual “só um estúpido é que não muda de ideia”. A segurança do Presidente está reforçada. As armas brilham em todo o perímetro dos cobiçados e perigosos aposentos. Os guardas, bem alimentados e vestidos com uniforme a cheirar sempre a novo, movem-se. Uns discretamente, outros de forma por demais óbvia. Mas cada vez que se investem milhões de dólares do nosso suor para proteger o chefe máximo da Nação, Guebuza parece ter cada vez mais medo.

E essa reacção pode estar traduzida no regresso ao cachimbo. Levantou-se quando cheguei e estendeu-me cordialmente a mão que segurei com vigor, ao mesmo tempo que me curvo em respeito ao Chefe de Estado, respondendo à saudação, num ambiente tenso. Compreensivelmente tenso porque Guebuza está, absolutamente, na corda bamba. Estamos frente a frente e eu, gozando da minha liberdade de cidadania, disse ao Presidente aquilo que penso.

– Senhor Presidente, o sol neste país ainda não nasce para todos, ou melhor, só desponta para um punhado de pessoas, e aqueles que continuam no escuro estão a coleccionar feridas! Guebuza sorriu. Gaguejou. Levou o cachimbo – apagado – à boca. P- Sabe, estou com uma vontade tremenda de fumar mas não o posso fazer em respeito de ti.

– Fique à vontade senhor Presidente, estamos ao ar livre.

– Não, não posso. Fui educado a respeitar os outros.

– Muito obrigado, senhor Presidente. Senti-me lisonjeado pela elevada consideração, mas o que eu queria é que o Chefe de Estado comentasse o que lhe dizia, o sol ainda não nasce para todos em Moçambique, ou melhor, só nasce para um punhado de pessoas. Examinei o arsenal disponível para defender o representante máximo da Nação, puxei igualmente pela minha imaginação e vi um búnquer e vários sistemas electrónicos da mais alta tecnologia, que podem ser accionados em caso de o rio mudar de direcção.

E a conclusão a que cheguei é a de que tudo aquilo não era nada. Tudo aquilo era falso. Porque o rio, quando se enfurece, não há nada que o segure. Mas eu estou aqui com o Presidente de todos os moçambicanos. Frente a frente. Quero transmitir-lhe palavras. Dizer-lhe o que penso, como cidadão. Não levo nenhum feixe de azagaias. Nem pólvora. Nem farpas. Apenas trago nas mãos o sangue das nossas feridas para dizer, senhor Presidente, o sol ainda não nasce para todos em Moçambique, ou seja, apenas nasce para um punhado de pessoas!

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