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EDITORIAL: O que diria samora de tudo isto?

Começaram no passado dia 3 de Fevereiro – vem bem a propósito, uma vez que ele foi um dos nossos heróis nacionais – as comemorações oficiais do ano de Samora Machel, decretado pelo Governo da República, no ano em que se completam 25 anos do seu desaparecimento. Na cidade de Xai- Xai, capital da província de Gaza, foi inaugurada uma estátua, iniciando-se assim um ciclo que terminará quando todas as capitais de província se acharem dotadas de um monumento semelhante.

Olhando para os rostos dos antigos camaradas de luta de Samora Machel vi neles espelhado tudo menos a imagem do primeiro Presidente de Moçambique independente. Os velhos camaradas aburguesaram-se, estão barrigudos, flácidos, vestem bons fatos e ainda melhores gravatas – que diferença para a austera balalaica dos anos ´7’ e ´8’! –, deslocam-se em carros último modelo que estacionam quase dentro dos edifícios porque são demasiado importantes para andarem a pé, vivem em luxuosas mansões construídas de raiz ou herdadas do APIE que registaram em seu nome por meia dúzia de dólares, possuem ainda outras que arrendam a preços especulativos de quatro e cinco mil dólares a estrangeiros que não se atrevem a pedir-lhes factura porque “não fica bem”, enquanto o Estado é mensalmente lesado em milhares de meticais de imposto. Nada lhes importa desde que a ‘coisa’ pingue.

E que diria Samora disto tudo?

Coisa boa, certamente não seria. Salvo raríssimas excepções, hoje todo o way of life dos seus camaradas de armas lhe repugnaria.

Repugnava-lhe o luxo e a ostentação, sobretudo num país cujo desiderato nacional é combater a pobreza absoluta; repugnava-lhe a especulação – ‘a nossa luta é contra os especuladores’, dizia continuamente –; o laxismo muito em voga nos dias de hoje; o deixa-andar; a corrupção – em alguns casos, para dar o exemplo, foi mesmo longe demais –; o clientelismo; o lambotismo – chegava mesmo a odiar aqueles que só pela sua posição de mais alto dignitário da nação diziam-lhe sempre SIM a tudo para lhe agradar.

Hoje, os camaradas combatem, quotidianamente, tudo aquilo que Samora defendia. Nunca a prática diária esteve tão longe das exaltações dos discursos ofi ciais.

Hoje, o Homem Novo moçambicano idealizado por Samora está velho e cansado. De ser transportado indignamente como gado no chapa. De dormir numa barraca que alaga com as primeiras chuvas. De ir para a cama mais cedo para enganar o estômago. De trabalhar todo o mês e não ganhar sequer 100 dólares. De morrer no hospital porque falta tudo. De ter uma vida indigna e de à sua volta ver uma desigualdade também ela indigna.

Por tudo isto, hoje, os camaradas queriam tudo menos que Samora tivesse o destino de Lázaro quando Cristo disse: ‘Levanta-te e caminha’.

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